OPINIÃO

Advocacia-Geral da Ciência

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A Associação Americana para o Avanço da Ciência (AAAS), que é responsável pela publicação da prestimosa revista Science, criou, recentemente, um website (www.forceforscience.org) com o intuito de demonstrar, para os agentes políticos e para o público em geral, a força e o papel ciência na sociedade contemporânea. Uma espécie de Advocacia-Geral da Ciência, com suas prerrogativas inerentes, para a defesa incondicional das boas práticas científicas. A propósito de iniciar as discussões, alguns questionamentos postos pelos editores da Science - Por que a ciência é importante para você? Como ela afeta a sua vida, a sua carreira e o seu dia a dia na comunidade? Por que você entende que o governo tem de investir recursos públicos em pesquisa científica? Qual a mensagem sobre ciência que você gostaria de enviar para os formuladores de politicas públicas - suscitaram respostas de entusiastas das mais variadas matizes científicas, algumas até desmesuradamente apaixonadas, cujos excertos podem ser lidos na edição da Science de 12 de maio de 2017 (v.356, n.6338, p.590-592).

O resultado do trabalho científico e tecnológico, com um mínimo de atenção, pode ser visto por todos os lados no nosso dia a dia. Exemplos não faltam, no celular e seus aplicativos que usamos à exaustão; nos meios de transporte que nos levam a lugares e em tempos outrora inimagináveis (inclusive à Lua); nos alimentos, processados industrialmente ou in natura, que comemos; nos medicamentos que tratam dos nossos males etc. Mas, não obstante essa percepção de utilidade da ciência, não raro, institutos cientifico são fechados, os fundos de financiamento de pesquisa são reduzidos, bolsas de incentivo à formação de novos cientistas são cortadas, programas pesquisa descontinuados etc. e a comunidade cientifica, especialmente na esfera pública, cada vez mais, é forçada a justificar a importância do seu trabalho à sociedade.

Entre as respostas dadas aos questionamentos postos pelos editores da Science, cabe destacar algumas posições que, apesar de óbvias, nos pareceram interessantes. No que toca à sustentabilidade e conservação ambiental, por exemplo, ninguém pode ignorar que o apregoado colapso dos ecossistemas, associado à mudança do clima e à perda de biodiversidade, pode ser tão devastador quanto uma guerra nuclear. E, nesse aspecto, apesar do sectarismo dos discursos contrários, a atuação da comunidade cientifica tem sido fundamental para assegurar a exploração sustentável dos recursos do ambiente e o bem-estar das pessoas no longo prazo.

Na saúde, o papel da ciência tem sido reconhecido como cada vez mais relevante. Morria-se, antes dos antibióticos, por causas que hoje soam inacreditáveis. A evolução nas drogas, nos equipamentos hospitalares, na tecnologia de exames, em procedimentos médicos, etc. são decorrentes de pesados investimentos, privados e públicos, em pesquisa básica. Somente o desenvolvimento científico e tecnológico é que pode fazer com que se tornem raras, dependendo das circunstâncias, frases tão tristes de ouvir/dizer como essas: “lamento, nada pode ser feito!” ou suas variantes do tipo “sinto muito, não há mais o que fazer!”. Sim, mesmo que não se disponha de soluções para todos os males, são muitas as soluções hoje disponíveis que, outrora, não existiam; mas, independente disso, nos institutos de ciência e tecnologia aplicadas à saúde, novas soluções continuam sendo buscadas.

Os benefícios econômicos e sociais auferidos por desdobramentos derivados de pesquisas básicas são imensuráveis. Quem imaginaria a priori (para justificar a importância da pesquisa) que de um projeto de astronomia, estudando galáxias distantes, poderia resultar aplicações úteis na calibração de sistemas GPS ou em técnicas cirúrgicas a laser? O impacto de uma pesquisa não precisa ser imediato para que ela possa ser considerada relevante. Tudo que nos revelar como funciona o mundo pode ser importante filosoficamente ou, um dia, tecnologicamente. 

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