Não fosse a avalanche de suspeitas que pairam sobre o presidente da República Michel Temer, que jorram abundantes após a delação da JBS, os brasileiros estariam assimilando certa aura ao condutor da nação. Seus rituais sugeriam sabedoria republicana que o fariam, aos poucos, merecedor de crédito para ser tolerado. Ao se defender de acusação por envolvimento em propina, prevaricação ou obstrução ao processo judicial, questionou a validade da gravação feita pelo empresário Joesley Batista, em conversa velada. Expôs publicamente sua atitude alegando espantosa ingenuidade na conversa e a qualidade técnica das gravações. Ao mesmo tempo disse que não deu crédito aos fatos mencionados em relação à obstrução. Contrapõe acusações no campo da ampla defesa com sua habilidade de jurista. Em seguida vitupera contra pressão exercida pelo grupo JBS. E faz sua assertiva em tom de denúncia. Acusa o evento da gravação do tenebroso diálogo a manobra para obtenção de lucro com manipulação no mercado de ações e oscilação no dólar. Foi veemente e convicto, citando circunstâncias que mandou investigar. Com isso, cria situação estranhável diante do flerte que mantinha com o mesmo executivo criticado. A intimidade do presidente com Joesley vinha franqueando vezes de curiango (ave de hábitos noturnos). Temer qualifica como mero borboleteio. O autor da gravação adentrava com facilidade na porteira do Jaburu, na calada da noite. Nada contra a noite, mas a circunstância revela intimidade de tratativas. Teria o presidente, em plena efervescência das investigações da Lava Jato, com os segredos de Cunha ainda candentes, - o direito de ingenuidade em conversa de tão grave teor?
Gravação em perícia
A gravação autorizada que mostra elementos da acusação de conluio contendo a voz de Temer, sem dúvida, apresenta imperfeições técnicas. A fricção do microfone escondido interfere, e o bolso interno do casaco impede a boa captação. Além disso, o perito particular contratado pela defesa de Temer, Ricardo Molina, parece lépido em parecer destinado à desqualificação da gravação, por conta de edição da fita original. A peça, no entanto, é gravação real, e será submetida a perícia. O chefe da Perícia da PF em Curitiba, Fábio Salvador, diz que o incidente da perícia particular é “humilhação”. O STF aguarda resultado da perícia oficial, mas até Michel Temer admite autenticidade de trechos importantes. Dificilmente desmorona o contexto de prova, já que a fita em avaliação é fato real complementar.
Diretas
O desfecho dos episódios em torno da permanência ou não do presidente Temer no cargo antecipa o debate sucessório. Várias hipóteses, inclusive a continuidade do atual governo. Em caso de renúncia ou deposição, a Constituição prevê eleição indireta. Aí reside um grande problema que afeta a legitimidade do parlamento. Isso também é gravíssimo, já que os expoentes do legislativo também são acusados em grande número. A modificação constitucional para eleição direta não é simples. O movimento “Diretas, já” tem simpatia popular. Há quem tema o voto popular que pode surpreender qualquer dos grupos hegemônicos. Medo do povo prova a necessidade deste aval democrático. Afinal, tantos erros dos comandos da plutocracia permitem pensar que o voto direto ainda é o melhor.
Retoques:
- Está demais o envolvimento de ministros e assessores no atual governo, inclusive os mais próximos.
- É muita maçã podre no centro do poder. Não tem graça nenhuma a devolução da mala com mais de 400 mil dólares. O deputado Rocha Loures ainda deve explicar a falta de 35 mil.
- Diplomado pela UPF e tendo atuado em nossa comarca, o promotor Fabiano Dalazen assume a coordenação do Ministério Público do Estado. Desde os bancos acadêmicos revelou liderança e competência.
- Inglês com música é aula fabulosa na TV Cultura, todos os dias, com a cantora e apresentadora Amanda Costa e a professora Marisa Leite Barros.