OPINIÃO

Missão, desiderato ou outra coisa qualquer

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Há alguns anos solicitei a Marcelo, amigo e companheiro da Casa de Oração André Luís, uma pausa para remodelar meus temas livres. Entendia que estava sendo repetitivo e enfadonho e que necessitava recarregar. E assim permaneci três meses. Certa manhã na UPF uma funcionária sem saber (acho eu) que eu era espírita e que fazia temas livre abordou-me com a seguinte pergunta: não está esquecendo de nada? Negaceei, embora tenha compreendido de pronto o motivo da indagação - esquecendo do quê? O senhor sabe do que estou falando, estou falando da sua missão, completou.

E então ela relatou que numa manhã fora a segunda pessoa a entrar no prédio da Medicina, lá estava apenas o segurança. Tudo tranquilo, disse o mesmo, somente um professor está com seus alunos numa sala de aula. Estranho, disse ela, aula a essa hora? E, curiosa, foi até o segundo piso e parou, então, em uma sala repleta de alunos de jalecos e gravatas, como antigamente e um professor que nunca vira antes. O professor chamou-a e disse que estava repetindo uma aula porque dos cinquenta alunos somente um não havia entendido a matéria e que todos, sem exceção, deveriam entendê-la. Era importante que entendessem, era vital. Desceu então, minha amiga, até o hall de entrada e comentou com o segurança sobre o professor desconhecido. Que professor? Perguntou-lhe o colega. Estamos só você e eu aqui a esta hora, arrematou.

Veja, doutor Jorge, aquelas palavras que o senhor achou enfadonha e maçante? Numa de suas palestras havia um garoto de 16 anos com ideias suicidas e que fora levado pela mãe em desespero para ouvir o senhor. Depois de escutá-lo, o garoto mudou de vida e agora é outra pessoa. Sabe, doutor, a gente é instrumento e se a nossa energia influenciar uma em cem pessoas está muito bom. Volta, doutor, para seu destino porque tem gente precisando do senhor. Voltei e nunca mais deixei de ir porque finalmente havia entendido a matéria do professor desconhecido.

Nessa quinta, voltei também, em pensamento, a Alegrete, como na primeira quarta de março de 1975, para visitar o túmulo e a família de José Carlos Vaucher Rodrigues. Chegamos no trem das onze e fomos lanchar ouvindo Stand by Me, com Lennon. Depois, enveredamos pela Avenida Getúlio Vargas até o cemitério para viver a dor da perda, a da não-vida, a do não-sorriso. Mais tarde, conhecer os outros familiares do Dr Iseu Rodrigues e, em obsequioso silêncio, acompanhar a dor dos pais pela perda precoce do grande Zé, nosso Zé Capacete (em homenagem ao cabelo black-power que usava). Na volta, escrevi uma crônica ao amigo falecido e que foi publicada no Jornal A Tarde. Falava sobre tristeza, alfazemas e lírios, falava sobre o silêncio e sobre que a vida, às vezes, é o que nunca deveria ser – uma bosta.

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