OPINIÃO

O dia depois do amanhã

Por
· 3 min de leitura
Você prefere ouvir essa matéria?
A- A+

A impressão de que o Brasil encontra-se em um labirinto parece cada dia mais materializado. A única certeza para o cidadão, o empreendedor, o empresário, a dona de casa e as instituições como um todo é a de que a única certeza existente é de que existirá o outro dia. O Brasil encontra-se em seu labirinto: ao não resolver a crise política, não será possível encontrar um novo projeto para a economia e um projeto de nação.  O controle da inflação à custa de uma brutal recessão, não garante a retomada da confiança por si só. Nossas feridas estão expostas, somente mais democracia e serenidade serão capazes de cicatrizar por dentro nosso sistema. De acordo com o Cientista Político Carlos Melo, a crise não é conjuntural, ela abraça ao sistema por múltiplos fatores estruturais e se manifesta por um processo de cumplicidades entre partidos e agentes que, incapazes de resolvê-la, batalham pela conciliação. Mas, à doença crônica é possível que não haja remédio, no curto prazo. O corpo médico à disposição é limitado, o diagnóstico e a terapia prescritos são inúteis. Sobre o doente, se pratica medicina paliativa como se fosse terminal; na verdade, ministra-se um tratamento negligente.

A Nova Matriz Econômica de Dilma propiciou uma volta aos anos setenta, ao imaginar que tudo pudesse ser feito unicamente pelas mãos do Estado e à parte de transformações das instituições políticas; não investiu em reformas e, pior, abusou-se até o esgotamento de mecanismos como o crédito e incentivos fiscais de toda ordem. Retrocedemos a agenda dos noventa, retomar o controle da agenda macroeconômica, ou seja, diminuir o tamanho do estado. Será necessário fazer o ajuste fiscal, por meio de reformas, que possibilitem algo maior do que zerar o débito e o crédito. O que percebe-se hoje que a atual agenda de reformas e necessárias fere de morte a zona de conforto dos interesses de toda a ordem.

O ''país da meia-entrada'' é a expressão que o economista Marcos Lisboa encontrou para descrever um sistema de enorme poder e privilégios corporativos. Desde, pelo menos 1936, se sabe  com Sérgio Buarque de Holanda da presença e da força dos ''interesses particularistas''. Corporações que levam o maior valor da renda nacional, praticamente arrendando para si o Estado. São diversos grupos que ficam com ''a parte do leão''; sejam eles empresários, sindicatos de empregados públicos, privados e patronais e até grupos específicos como juízes, promotores, fiscais, parlamentares, médicos, professores, estudantes… Todos os que conseguem arrancar uma lasquinha dos recursos públicos, com supostos direitos que inexistem  por que a escassez é a lei da natureza  para grupos sociais que vivem sem qualquer proteção.

Para Celso de Melo, esse ''país da meia-entrada'' entrou em crise, sobretudo, por conta das transformações demográficas — mas também pelas próprias limitações de crescimento e expansão do modelo econômico. Resolver seu colapso demandaria ação de um sistema político eficaz, com visão de Estado e de longo prazo, pouco ou quase nada voltada para interesses particulares e fisiológicos.

As restrições existem e arcamos com o custo das escolhas fáceis, porém incompetentes. As medidas que anunciavam proteger o crescimento ecoam as que prometeram proteger a indústria nacional. O resultado tem sido o inverso do prometido. O nacional desenvolvimentismo se defronta com uma recessão prolongada. A indústria, beneficiada (leia-se as campeãs nacionais, JBS, OI, LBR...) por diversas medidas de proteção e incentivos que há muito demandava, definha.

Para um país que vivencia a escassez de insumos básicos, como energia e água, o custo social do populismo que nega as restrições não deve surpreender. O ajuste é inevitável. Pode ser realizado de forma transparente, respeitados os procedimentos legislativos, com escolhas difíceis sobre os benefícios a serem mantidos e os que devem ser revistos, ou imposto pela escassez de crescimento e de renda. Esperamos, ao menos, que antes de uma crise ainda mais aguda (Lisboa, Almeida e Pessoa).O fato é que para termos o dia depois de amanhã, teremos que viver o hoje e superar todas as verdades que são reveladas todos os dias, nossas escolhas não serão fáceis, porém, serão  necessárias.

Gostou? Compartilhe