Veríssimo pergunta-se, às vezes – poesia numa hora dessas? Exatamente, seria hora de falar de músicas e poesias? Vejam, os quadrilheiros tomaram conta do país e roubam de tudo inclusive nossas esperanças. Tipo A Revolução dos Bichos todos parecem exatamente iguais e enquanto eles lavam a égua nós lavamos as mãos. Entre tantas perdas os sessentões de minha geração vão perdendo suas referências pessoais e do mundo da arte.
Nos anos 1970 vimos de tudo Geraldo Azevedo, Fagner, Belchior, Zé Ramalho, Guilherme Arantes, Raul, Tavito, Zé Rodrix, Kleiton e Kledir, Boca Livre...Tivemos o subgênero do samba, o samba-jóia, de Benito e a MPB veio dar espaço para os irmãos Isolda e Milton Carlos. Isolda, entre outras canções, entregou a Roberto a linda Outra Vez e nunca mais, nem nós e nossos ex-amores, fomos os mesmos. Milton morreu acidentado aos 22 em outubro de 1976 e eu o conheci pelas ondas do rádio da Bandeirantes no programa do Hélio, O Poder da Mensagem. Também, no mesmo programa, descobri Morris Albert e Luís Melodia através da música que dá título a essa crônica. Quando Melodia fez a composição estava apenas com 23 anos e eu achei arte pura, música não dançante ou comercial, música para poucos. Fafá cantava nessa época sobre uma casa com quintal no pé do morro onde passava o bonde da lapinha e um disco voador. Contava que não se sentia só porque tinha um vizinho que era um bêbado velhinho que acreditava no destino – ele mora em cima do arvoredo, ele tem muitos brinquedos, ele sempre foi menino. Eram coisas que tocavam o coração de tantos. Vejam, havia poesia, havia um ar nostálgico que não significava saudade e sim a percepção de que algo de encantador das nossas almas havia ficado para trás.
Porque é assim que acontece à medida que vamos ficando taludos. Vamos perdendo a inocência e o que se apresenta nada tem a ver com o que sonhávamos como projetos de mundo e convivência.
Melodia cantava isso, uma linda canção sem esperança e no caso dele era uma desesperança em resgatar um relacionamento. O mundo era lindo mas, não para Melodia porque faltava o principal. Isolda falava disso que a saudade era a única maneira de se sentir perto de si a pessoa amada, outra vez. Moacyr Franco cantara a mesma coisa dez anos antes em que descrevia as lembranças do primeiro olhar, primeiro beijo e culminava com a observação...o dia está tão lindo, que pena.
Milton, Melodia, Belchior, Raul vão deixando órfãos mas, somos de uma geração que conheceu a arte e por isso jamais perderemos a esperança de que há um mundo melhor escondido em meio às folhagens, entre os trovões e rajadas de vento mesmo que esse mundo só exista nos nossos eternos corações de estudantes.