Enquanto houver espaço, corpo, tempo para dizer não...eu canto – cantava Antonio Carlos Gomes Belchior Fontenelle Fernandes que, sem dúvida era um homem livre tal qual imaginava e estimulava Niestzche. Belchior, Apenas Um Rapaz Latino-Americano (Jotabê Medeiros) é uma linda homenagem, assim como a de Rolando Boldrin (Willian Corrêa e Ricardo Taira), amigo íntimo de Plinio Marcos, todos tão próximos de minhas memórias. Aprecio biografias e ganhei de presente de Rosana Fernandes as de Churchill e de David Bowie aguardando o tempo para serem devoradas.
Por enquanto leio Jorge Salton e releio Jango (Jorge Ferreira), fascinante trabalhista, como José Vecchio, Brizola, Alberto Pasqualini, Salgado Filho e, é claro, Getúlio. Industrialização, nacionalismo e benefícios sociais aos trabalhadores eram os ingredientes da matriz getulista, populista ou não. Jango merece lugar melhor na nossa história oficial. Também leio Paris Ocupada (Dan Franck) que discorre sobre a ocupação de Paris pelos nazistas sob o ponto de vista dos artistas. A gente se sente lá, demorará muito tempo para os franceses esqueçam o que viveram. É uma barra, aqui os alemães ficaram noventa minutos no Mineirão e levaremos trezentos anos para deletar.
O excelente advogado Catarino Ferreira conta-me que acabou de ler Sapiens, de Yuval Harari e eu fiquei com uma doce inveja, afinal ainda estou nos capítulos iniciais. Mas, assisti algumas entrevistas do autor e praticamente sei o resto do livro. Ficou-me uma espécie de deja vù porque me remete a John Gray (Cachorros de Palha), a Richard Dawkins (A Magia da Realidade), a Heidegger, a Niesztche e a Sartre solidários na negação de uma forma superior criadora de tudo. Na prudente humildade de conhecimentos em relação a esses monstros famosos discordo, discretamente, dessa corrente de pensamento. Se a denominação Deus for muito densa para ser digerida, esqueça-a, assim como a palavra Criador. Mas, pensemos diferente enquanto olhamos para a chuva, para as estrelas, para crianças em seus inocentes sorrisos, para o cão que nos abana o rabo, para as pessoas que amamos e consideremos que há uma energia que move as coisas todas e que somos extremamente limitados para compreender o universo mesmo que não entendamos nem o nosso próprio organismo. Os brasilianos aceitam todas as correntes, senão vejamos: políticos desonestos, policiais corrompidos, professores que não ensinam, alunos que não estudam, profissionais que cobram por fora, cotas de todo tipo para furar a fila e entrar na universidade, massacre da música popular brasileira, jornalistas e historiadores comprometidos com ideologias, fraudes em obras públicas. Tudo isso convenientemente parece acontecer fora de nossos lares.
Às vezes, a gente pensa em desistir dessa comédia humana, cheguei até a considerar não torcer mais para o Grêmio. Mas, há a paixão, a energia, aquela que os intelectuais negam, aquela que nos impele a gritar e a abraçar os amigos mesmo nas coisas mais simples.