OPINIÃO

Fraternidade e superação da violência I

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O tempo litúrgico da Quaresma inicia-se com um solene e grave convite: “Convertei-vos e crede no Evangelho” (Mc 1,15). Esta admoestação vem acompanhada com a imposição das cinzas na cabeça que simbolizam a nossa finitude humana. Desde 1964, o tempo quaresmal, no Brasil, vem enriquecido com a Campanha da Fraternidade que tem, neste ano, o tema: “Fraternidade e superação da violência” e o lema: “Vós sois todos irmãos” (Mt 23,8).

 

As estatísticas da violência apresentam números assustadores, porém elas só mostram aquelas situações extremas de mortes, guerras, agressões físicas com lesões e acidentes. É como se fosse um iceberg, isto é, um grande bloco de gelo que flutua no mar gelado, mas só se enxerga a parte que está fora da água. O que está submerso na água é muito maior. A Campanha da Fraternidade também considera violência todas estas atitudes, palavras que não vão acabar nas delegacias, não ficam visíveis, não entram nas estatísticas, mas existem e causam muito sofrimento.

 

A motivação da escolha deste tema é a triste constatação de que somos violentos e vivemos numa sociedade violenta. A Campanha da Fraternidade não quer simplesmente ficar falando de violência, apresentar mais estatísticas, procurar culpados. As informações que temos e os meios que divulgam a violência já são suficientes para nos sensibilizar para o grave problema. O sofrimento das vítimas grita por compaixão e atenção. Os agressores também necessitam de misericórdia e conversão.

 

Por isso, foi escolhido como objetivo geral da Campanha da Fraternidade de 2018: “Construir a fraternidade, promovendo a cultura da paz, da reconciliação e da justiça, à luz da Palavra de Deus, como caminho de superação da violência”.

 

“Construir fraternidade” é o reconhecimento de que a mudança exige planejamento, investimento e muito trabalho. Posso constatar que a minha casa está caindo, está cheia de goteiras, rachaduras, está inadequada e desconfortável. Posso ficar somente na constatação, mesmo tendo recursos financeiros para investir, mão de obra qualificada e um sonho de casa melhor. Se não começar a construir, vou permanecer constatando, reclamando e vivendo no perigo. Assim também, temos um projeto de uma sociedade fraterna, temos recursos humanos e financeiros para fazer algo muito melhor do que temos. Por isso, é urgente começar.

 

“Promovendo a cultura da paz, da reconciliação e da justiça, à luz da Palavra de Deus” indica que a mudança necessita ser fundamentada para ser durável. Gestos isolados são importantes, mas não suficientes. Leis adequadas, programas governamentais, ações pastorais precisam ter a sua luz de inspiração que é a Palavra de Deus. Jesus lembrou que somente a casa construída sobre a rocha, isto é, aquela com bom fundamento suporta as tempestades. Em outras palavras, não são quaisquer ações que vão mudar triste quadro da violência. É preciso rever os métodos atuais usados para resolver o problema. A promoção de uma cultura de paz, de reconciliação, de justiça social deve ocupar mais espaço do que falas e ações de repressão e condenação.

 

Na celebração eucarística o sacerdote reza: “Senhor Jesus Cristo, dissestes aos vossos apóstolos: Eu vos deixo a paz, eu vos dou a minha paz. Não olheis os nossos pecados, mas a fé que anima a vossa Igreja; dai-lhe, segundo o vosso desejo, a paz e a unidade”. A assembleia responde com um solene “Amém”, confirmando e aceitando a paz doada por Cristo. A seguir, o sacerdote repete a saudação do Cristo ressuscitado: “A paz do Senhor esteja sempre convosco” e a assembleia responde: “O amor de Cristo nos uniu”. Se em todas as missas se faz este rito é porque todos os fiéis necessitam da paz, se reconhecem como agentes de violência; como também, se comprometem em construir, propagar e se tornar agentes da paz de Cristo.

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