OPINIÃO

O que (talvez) nunca saberemos

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Sir Martin Rees, o Astrônomo Real da Grã-Bretanha, foi o conferencista do ciclo 2010 das famosas Palestras Reith da BBC de Londres. As falas dos cinco encontros, realizados em diferentes locais do Reino Unido e todos transmitidos ao vivo pela Rádio BBC, após revistas e ampliadas, foram reunidas por Rees, em 2011, no livro “From Here to Infinity – Scientific Horizons”, que, em 2017, ganhou edição, em Língua Portuguesa, com o título de “Para o Infinito - Horizontes da Ciência”. Nessas palestras, Martin Rees tratou dos grandes temas afetos à ciência contemporânea, buscando, por meio de linguagem não técnica e imagens simples, levar luzes para além dos muros da comunidade científica.

 

No terceiro encontro da série das Palestras Reith 2010, realizado na sede da Royal Society, a principal academia científica do Reino Unido, na época, presidida pelo próprio Martin Rees, diante de um publico formado, majoritariamente, por cientistas, o Astrônomo Real da Grã-Bretanha tratou, de forma mais especulativa do que afirmativa, do futuro da ciência, dando ênfase a coisas que, talvez (essa palavra eu adicionei por conta e risco), nunca saberemos.

 

Admite-se, sim, que tudo começou a 14 bilhões de anos, com o nosso Big Bang. E mais: chamamos de Universo o domínio observável pelos nossos melhores telescópios que se estende, por ora, não mais além de 10 bilhões de anos-luz.  Mas, especulativamente, esse domínio, apesar da vastidão, não poderia ser apenas uma parte infinitesimal da totalidade?  Quem poderia afiançar que, quando estamos no meio de um oceano, o mais provável é que a água acabe depois da linha do horizonte que enxergamos? O nosso Big Bang teria sido o único? 

 

A nossa limitação de percepção reside no fato de sermos seres tridimensionais. Imagine uma formiga andando sobre a face superior de uma folha de papel, vivendo num mundo bidimensional. Ela jamais teria consciência de uma folha similar paralela a sua. Então, sendo nós prisioneiros das três dimensões, por que não seria possível também não termos consciência da existência de outro universo completo (com espaço tridimensional como o nosso, inclusive) a menos de um milímetro de distância de nós, porém pertencente a uma quarta dimensão espacial?

 

Os grandes desafios a ciência contemporânea estão no quantum e no cosmos. Ou, se preferirem, no muito pequeno e no muito grande. Mas, estejamos cientes disso, as incertezas do conhecimento nesses extremos, na maioria dos casos, são irrelevantes para a prática cientifica, quer sejam essas afetas aos domínios da engenharia ou da biologia aplicadas. Inclusive, há quem diga que o reducionismo extremo é verdadeiro apenas num certo sentido, mas raramente é verdadeiro num sentido útil. As incertezas da física subatômica, por ora, são irrelevantes para os biólogos e para os ambientalistas, por exemplo. E não obstante a teoria quântica constitui a base de boa parte da tecnologia moderna. Estando presente, por exemplo, quando tiramos uma fotografia digital, navegamos na Internet ou usamos um leitor de DVD ou de códigos de barra a base de laser.

 

A grande indagação diz respeito a nós mesmos e como responderemos a questões que sequer formulamos.  Afinal, está em construção uma era pós-humana? Essas criaturas, que nos sucederão evolutivamente (ou involutivamente), serão assentadas sobre uma base orgânica ou em plataforma de silício ou não passarão de máquinas inteligentes? De uma coisa estejamos certos, daqui a seis bilhões de anos, quando acabar o combustível do Sol, não seremos nós que estaremos por aqui para testemunhar o fim do planeta Terra.

 

Martin Rees destacou que um dos mais notáveis conferencistas das Palestras Reith foi Peter Medawar, que falou, em 1959, sobre “O Futuro do Homem”. Medawar encerrou a suas conferencias com uma reflexão que até hoje nos instiga: “Os sinos que dobram pela Humanidade são – a maior parte deles, seja como for – como os badalos das vacas alpinas: estão aos nossos pescoços e se não produzem um som alegre e harmonioso é forçosamente por NOSSA culpa”. 

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