Uma das obras mais conhecidas de Robert Louis Stevenson (1850-1894), o habilidoso contador de histórias e grande mestre da literatura universal que se destacou por retratar, como poucos, a dualidade da natureza humana, é o romance o “Strange Case of Dr. Jekyll and Mr. Hyde” (O estranho caso do Dr Jekyll e do Sr. Hyde), de 1886, que, em algumas edições brasileiras e nas versões cinematográficas, recebeu o sugestivo título de “O médico e o monstro”. Pois, foi travestindo-se de Robert Louis Stevenson, que a equipe da redação de O NACIONAL, na edição do último final de semana (21 e 22 de abril de 2018), ao manter o espelho da página 4 do dia anterior (20 de abril de 2018) e trocar conteúdo, mas não a assinatura do colunista, conseguiu, tal qual a poção que transformava o Dr. Henry Jekyll no abominável Sr. Edward Hyde, transmutar o Dr. Jorge Anunciação no Sr. Gilberto Cunha.
A coluna que NÃO escrevi e cujo engano foi desfeito na edição de O NACIONAL da última terça-feira (24/04/2018), se chamava “Viracopos”. Na primeira percepção, ao me deparar, na manhã e sábado, com o equívoco de diagramação, foi de que não havia dúvida que aquele texto tinha o traço inconfundível da lavra do Dr. Jorge Anunciação e não do Sr. Gilberto Cunha. Qualquer leitor, facilmente, perceberia isso. Mas, não foi o que aconteceu. Recebi, pessoalmente, por e-mail e pelo WhatsApp, mensagens de congratulações e críticas também, pela aludida coluna. Coisas como: “finalmente aprendeu a escrever um texto inteligível”, “texto corajoso e arrojado e que efetivamente contribui para a aldeia”, “tu sabes que receberás pedradas dos teus amigos burgueses da sociedade passo-fundense”, “todos deveriam ler para tomar consciência que a cidade não está querendo progredir”, “belíssimo texto. Tomara Deus que tenha reflexos nessa sociedade retrógrada de Passo Fundo”, “após ler sua coluna de hoje no Jornal O Nacional, gostaria de parabenizá-lo pelo excelente comentário que nos trouxe a memória da história de Passo Fundo”, e por aí afora, além do elogio e incentivo à leitura do texto, no domingo pela manhã, no programa Cotações e Mercado, pela rádio Uirapuru.
Nesse ponto eu me ponho a parafrasear Lupicínio Rodrigues: “Eu agradeço estas homenagens que vocês me fazem/Pelas bobagens e coisas bonitas que dizem que eu fiz/Receber os presentes, isto eu não tenho coragem/Vão entregá-los a quem de direito deve ser feliz”. Nesse caso, é o que faço agora, direcionando-os ao Dr. Jorge Anunciação.
Entre o Dr. Anunciação e o Sr. Cunha, há coisas comuns e diferenças perceptíveis. Anunciação e Cunha regulam na idade (ao redor de 60 anos). Ambos não são de Passo Fundo e escolheram essa cidade para viver, constituir família e, talvez, morrer. O Dr. Anunciação nasceu em Cruz Alta e veio para cá criança, trazido pelos pais. O Sr. Cunha, natural de Porto Alegre, chegou aqui adulto, em 1989, motivado por um edital de emprego, e nunca mais saiu. O Dr. Anunciação queria ser engenheiro florestal pela UFSM e virou médico pela UPF. O Sr. Cunha queria ser físico nuclear e virou engenheiro-agrônomo pela UFRGS. O Dr. Anunciação, assumidamente, professa a filosofia da doutrina Espirita. O Sr. Cunha, apesar de ter optado por Darwin na disputa com o Criador, mantem-se respeitoso para com os costumes e rituais da Igreja Católica. O Dr. Anunciação, acima de tudo, em sua coluna, é um teclador de emoções e cronista da memória afetiva local, e o Sr. Cunha, na dele, um analista racional de ideias de outros. Todavia, há indícios que compartilham as mesmas preferências literária, não sendo raras citações dos mesmos autores e títulos de livros.
Por fim, cabe dizer que a obra de Stevenson tem sido levada às telas dos cinemas, sem observar que, idealmente, os dois personagens seriam mais bem representados se usados atores distintos, para que, no final, sobrevenha a surpresa da descoberta que o Dr. Jekyll é o Sr. Hyde. Nesse caso, a equipe de ONACIONAL inovou, ao revelar que, na coluna Viracopos, o Sr. Cunha, da edição de sábado (21 e 22 de abril de 2018), era o Dr. Anunciação.