Há 50 anos, 1968, eu tinha 11 onze anos e curtia Roberto Carlos (Quando, Ciúme, Você Não Serve Pra Mim...), Roberto Rivelino, Os Incríveis...nem pensava em namoradas. O mundo fervia em agitações com focos locais, com alguma interface, movidos por jovens estudantes, universitários ou não. Os jovens dos Estados Unidos se rebelavam à guerra do Vietnã, ao assassinatos de Martin Luther King e Bob Kennedy. Surgia o movimento hippie, psicodélico e cabeludo que, infelizmente, sucumbiu ao lisérgico. Ronald Reagan, governador da Califórnia, dizia que eles se vestiam como Tarzan, tinham os cabelos da Jane e fediam como a macaca Chita.Cada vez. Na Primavera de Praga, os tchecos tentavam exorcizar as garras do stalinismo; na França, a greve dos trabalhadores por aumento de salários somadas ao descontentamento estudantil frente a uma política de condicionar vagas universitárias ao mercado de trabalho fez surgir conflitos entre polícia e estudantes que saíram da periférica Nanterre e desabrocharam à Sorbonne. No Brasil havia, por um lado, o florescimento do teatro moderno, do Cinema Novo, da Bossa Nova, da Tropicália e, por outro lado, a política de censura imposta pelo governo militar que permitiu exageros que culminaram como assassinato do estudante Luis Edson no restaurante de quinta categoria Calabouço, no aterro do Flamengo; a partir daí, com os ânimos acirrados, a polícia baixou o cassete nos atores da peça Roda Viva (de Chico Buarque) quando, na verdade, o objetivo era acabar com a encenação de outra peça, no mesmo teatro, em que um ator defecava em um capacete da polícia. O caldeirão efervescente global aliado à morte de Che Guevara (abandonado a própria sorte por Fidel, conforme narrativa de Flávio Tavares em As Três Mortes de Che Guevara) gerou grupos de subversivos da luta urbana como a Aliança Libertadora Nacional (ALN) de Carlos Marighella e grupos de apoio rural como os de Carlos Lamarca e os do Triângulo Mineiro e Araguaia lançaram o país no AI 5. A repressão veio forte até os anos de 1973-74.
Há 50 anos os estudantes queriam liberdade de tudo o possível, queriam romper as amarras de seus pais que presos ao mercado de trabalho eram condicionados a ouvir e a não emitir opiniões. A onda era atingir o subjetivismo, o exercício do eu, ideia da liberação do desejo sexual. A linha de pensamento de que a tecnologia, ou seja, o conhecimento servia ao poder e não para estabelecer paz mundial gerava ações de rebeldia os jovens que tudo o que almejavam era poetizar a vida.
Passados 50 anos os jovens recrudesceram e voltaram ao mercado de trabalho, o individualismo fez submergir a visão crítica e a utopia foi pro saco; quedaram ao poder das mídias e ao modelo capitalista-consumista. Estamos atrelados aos modelos partidários e ao acúmulo de poder.
Antes éramos nós (os bons) contra eles (os maus). Agora é eu, eu, eu, eu (fragmentados e desunidos) e eles, agregados e solidários numa festa em que colaboramos com tributos. Acabada a greve dos caminhoneiros a conta passará a todos. Queremos segurança, educação e saúde; queremos políticos comprometidos com ideia de pátria. Queremos um futuro, todos diziam que a gente era o país do futuro. Se há futuro, ele deve ser construído em comunidade e não por esparsos lamentos em rede social. Mas, a turma está aí, cada um por si. Martin Luther tinha um sonho, em 1968. The dream is over?