Os comentários durante o percurso de retorno marcavam o caráter odisseico da viagem de estudos de 2018 da Escola St. Patrick, de Passo Fundo: os viajantes que voltavam para casa estavam “irreconhecíveis”. Os “pequenos Odisseus” passaram por uma grande metamorfose nos três dias que costuraram o roteiro de viagem todo enlaçado – pelos vestígios arqueológicos, pelas trilhas da geologia, pelo olhar desvelador da biologia, pelo empenho encorajado do esforço físico de cada um dos estudantes de 7o, 8o e 9o anos que desbravou o litoral catarinense com olhos de pesquisador e pernas de trilheiro!
O roteiro foi inovador para estes viajantes: não necessariamente inovador no que diz respeito ao destino, mas ao que aprenderam a olhar nestes lugares já muitas vezes visitados e muito pouco olhados. Vestígios arqueológicos desde a praia da Pinheira, em Palhoça, até Armação, na ilha de Santa Catarina, e Ilha do Campeche – muitas vezes vestígios pisoteados pelos turistas em veraneio, muito pouco conhecidos pelos próprios moradores: oficinas líticas e inscrições feitas em forma de gravura nas pedras que contam um pouco da história destes homens de Sambaquis que viveram há mais de 6.000 anos em território brasileiro. As inscrições contam e, ao mesmo tempo, escondem a história: um dos desafios dos estudantes era, justamente, o de criar hipóteses para o significado daqueles símbolos que, gravados nas rochas, olham para o mundo há tanto tempo que se tornaram misteriosos aos olhos do observador contemporâneo.
Um dos difíceis desafios que a Filosofia propõe para as viagens é o de aprender a ver: quantos significados nos circundam e não somos capazes de ver até que alguém nos abra um mundo de interpretações? Entrar em contato com o diferente, com o mais desconhecido possível, nos ensina a ver coisas inimagináveis: viajar – atividade indispensável em uma escola que se preocupa com a formação de seus estudantes. Ter aula de geografia dentro do Parque da Serra do Tabuleiro e de biologia diante dos tanques das tartarugas do Projeto Tamar, procurar um espacinho para passar entre os galhos e pedras, subir e descer trilhas, subir e descer das embarcações, acordar e ir em busca do nascer do Sol e finalizar o dia com cinco professores dando aula simultaneamente, inclusive a longa distância - com a ajuda da tecnologia – falando sobre as aprendizagens do dia, visando ensinar os estudantes a se localizar no mapa e no mundo ao mesmo tempo! E como trilhar estes roteiros inovadores e desconhecidos?
Pernas para que te quero?!!
Os estudantes tiveram treinamento prévio de caminhadas ao ar livre, estudando os diferentes desafios para cada tipo de terreno, planejando as roupas e materiais para a duração dos trekkings e de cada tipo de clima. Quem diria que ir à praia no inverno seria interessante? Se saímos da escola sem certezas sobre os resultados da viagem, pelo menos uma coisa estava garantida: o quanto estávamos abrigados do frio – senão nas mãos e braços dados dos companheiros de viagem, que ajudavam a cada desafio das trilhas – com nossos cachecóis viajantes, feitos por cada um dos alunos, num manejo de agulhas de tricô ao longo de dois meses de tessitura. Irreconhecíveis (de tanto conhecimento), mas aquecidos!