Nas ruas de chão batido da Fragata, o bairro popular de Pelotas, RS, o menino, que produzia verduras e entregava leite nas casas, para ajudar na renda familiar, ouvia com atenção o conselho do pai: “meu filho, se queres ser alguém e ter utilidade na vida, estuda!” Aquela criança, cujo padrão de inteligência destoava das demais e que já sabia ler antes de entrar na escola, seguiu à risca a orientação paterna. Vanderlei da Rosa Caetano ingressou no Colégio Agrícola Visconde da Graça (CaVG). Trabalhou na Associação Sulina de Crédito e Assistência Rural – ASCAR e, em 1963, entrou no curso de Agronomia da Universidade Rural do Sul (atual UFPel). Entre 1967 e 1973, trabalhou como pesquisador do Instituto de Pesquisa e Experimentação Agropecuária do Sul. Obteve o titulo de doutor em Agronomia-Virologia pela Universidade de São Paulo, em 1972. Passou pela empresa Eli Lilly do Brasil Ltda., entre 1973 e 1975. E, desde 1975, trabalha como pesquisador da Embrapa, no Centro de Pesquisa Agropecuária de Clima Temperado, em Pelotas.
Ao longo de uma carreira que ultrapassa 50 anos de dedicação à pesquisa cientifica, o Dr. Vanderlei da Rosa Caetano fez coisas relevantes e, seguindo o vaticínio do pai, conseguiu ser útil na vida. Em 2018, são completados 50 anos do diagnóstico do vírus do nanismo amarelo da cevada e 40 do vírus do mosaico comum em trigo no Brasil. Duas façanhas notáveis do Menino da Fragata!
Nas diferentes regiões do mundo, onde são cultivados cereais de inverno, entre as doenças originadas por vírus, merece destaque, pelos prejuízos econômicos advindos, o chamado “nanismo amarelo”, cujo agente causal é o Barley yellow dwarf virus (BYDV), que, no nosso meio, é chamado de Vírus do Nanismo Amarelo da Cevada (VNAC). O agente causal da “amarelidão dos trigais”, cujo primeiro registro no sul do Brasil data de 1929, foi descrito pelo Dr. Caetano, em trabalho que publicou em 1968 (Revista da Sociedade Brasileira de Fitopatologia. v.2, p.53-66, 1968).
Os estudos realizados pelo Dr. Caetano são um marco da pesquisa científica com estes vírus no Brasil, contemplando espécies vegetais hospedeiras, estudos de transmissão por espécies de afídeos vetores (pulgões), caracterização de estirpes do vírus, sintomatologia, epidemiologia, importância econômica e avaliação da reação de genótipos de trigo ao BYDV. Cabe destacar ainda, que, junto com o seu irmão, Dr. Veslei da Rosa Caetano, também pesquisador da Embrapa, foram realizados estudos sobre a flutuação das populações de afídeos vetores. Dessas avaliações prévias da reação de plantas ao BYDV, selecionaram-se genótipos que serviram de fonte de resistência (tolerância) para os diversos programas de melhoramento genético de trigo no Brasil.
Outra importante virose de trigo no Brasil - o mosaico comum do trigo, que é internacionalmente conhecida como Soil-borne Wheat Mosaic Disease (SBWM) - foi diagnosticada pelo Dr. Caetano, no final dos anos 1970. Uma série de estudos e observações culminou no trabalho seminal publicado em 1978 (Fitopatologia brasileira, v.3, n. 1, p.39 – 46,1978).
Na área de melhoramento genético de trigo no Brasil, o Dr. Caetano, além da identificação de fontes de resistência (tolerância) a viroses, também tem se preocupado com a aplicação do enfoque sistêmico, que envolve o princípio da coevolução entre sistemas de produção e genética, na criação de germoplasma desse cereal. Buscou um novo padrão de planta, com porte baixo, espigas grandes, folhas eretas, colmos cheios, stay-green (manutenção de folhas verdes em estádios avançados de maturação) e resistência a múltiplas doenças, que tem servido de plataforma genética para a criação de algumas cultivares de trigo da Embrapa.
Vanderlei da Rosa Caetano é um cientista que, apesar das contribuições relevantes que produziu, prima pela humildade. A ele, em nome da comunidade científica que atua em pesquisa de trigo no Brasil, rendemos os nossos respeitos! (o colunista reconhece a colaboração do Dr. Douglas Lau para a produção desse texto.)