“Tamojunto comerciário”. Com o bordão, comum entre os pares, o presidente do sindicato que representa a categoria em Passo Fundo, Tarciel da Silva, finalizou a assembleia mais polêmica de todas que já havia realizado até então. Em seis anos à frente da entidade, foi a primeira vez que sofreu acusações e ameaças por conta de uma convenção coletiva. O motivo: entre os assuntos da pauta da reunião, estava a proposta da rede catarinense Havan e a polêmica do trabalho aos feriados. Uma semana depois de aprovadas as propostas, o comerciário falou sobre como foi o período de negociação, as acusações e a união da categoria.
Todo ano, a entidade negocia, com a classe patronal, sete convenções coletivas, só em Passo Fundo. Com os acordos firmados em outros municípios da região, o número chega a 12. “Nesses anos sempre foi tudo tranquilo. Ninguém nunca se importou se os comerciários trabalhavam 12 horas, se trabalhavam em feriados, domingos, se tinha aumento de salário ou não. A população só quer ser bem atendida. Agora, nesse último período, um empresário e baita marqueteiro vendeu a imagem da sua marca para Passo Fundo de graça”, resume o representante.
Com o anúncio da vinda da empresa ainda em fevereiro, o assunto rapidamente gerou debates nas redes sociais. Nas publicações que noticiavam as negociações com a empresa, os comentários eram majoritariamente contrários ao Sindicato e ao presidente. Em alguns casos, pessoas alegavam que a entidade seria culpada caso a empresa não instalasse uma filial em Passo Fundo.
“Foi afirmado em vários momentos que se a empresa não viesse, a culpa seria do sindicato. Eu fui o alvo. Eu fui atacado pessoalmente. Mas eu fiquei muito tranquilo porque é uma decisão da categoria, eles que mandam. Se em outros locais a diretoria detém o poder e toma as decisões, aqui no sindicato não funciona assim. Quem manda aqui são os trabalhadores. Aumento de salário, calendário de folga, é tudo por assembleia. Eu sou só o representante”, esclarece Silva.
Além das críticas nas redes sociais, as declarações de alguns vereadores indignaram a categoria. Entre os fatos que mais desagradaram, o presidente cita a moção de repúdio e o anúncio de que a Havan iria para Erechim ou Coxilha, o que, à época, reascendeu a discussão. “Os vereadores fizeram um papel muito aquém do que é do cargo deles. A maioria dos vereadores quis um pedacinho dessa publicidade em cima da criação do emprego, mas o que ficou pior foi é que os vereadores viram que não compete a eles essa questão. Durante várias sessões, essa era a discussão”.
Ao passo que o caso da empresa avançava nos debates, outra pauta, considerada urgente pela categoria, ficava de lado. Conforme Silva, só neste ano, 58 mulheres comerciárias precisaram pedir demissão por não ter com quem deixar os filhos. Na tarde de quinta-feira (19), quando a reportagem foi à sede do sindicato para entrevistar o presidente, Andreza Ferreira Ribeiro, de 22 anos, encaminhava os papéis da rescisão trabalhista.
Era o seu último dia como funcionária de uma loja de doces. Mãe de dois guris, um de cinco anos e outro de três meses, ela não encontrou vaga em creche próxima de sua residência. “Hoje eu só consegui encaminhar os papéis porque meu marido conseguiu uma folga. Vamos comprometer parte da renda da família por isso”, explicou Andreza.
“Eles (vereadores) deveriam se preocupar com essas questões. Eles podem resolver o problema de centenas de mulheres que a exemplo da Andreza, tem de abrir mão da estabilidade. A gente tem problema de emprego nessa cidade, as mulheres têm de abrir da estabilidade porque não têm onde deixar o filho na creche”, alerta Tarciel, em crítica à interferência dos parlamentares na negociação sindical.
Apesar da pressão, o que fez o sindicato não baixar a guarda, de acordo com o presidente, foi o apoio da categoria. Desse período surgiu o bordão “tamojunto”. “Os comerciários diziam: deixa que eles falem, porque nós que estamos mandando aqui, não sou eu que mando, são eles. A categoria começou a me proteger e meio que virou uma marca do Tarciel. Eu saia na rua e as pessoas gritavam do outro lado da rua “e aí, tamojunto”. E não só dos comerciários, trabalhadores de outras categorias também”.
Depois de aprovado o piso e as condições de trabalho aos domingos, o representante relembra a proposta inicial e compara com a atual. Na primeira negociação, o piso oferecido era de R$ 1.310,00. “Todo mundo falava que era um baita salário e que o sindicato era ruim porque não deixava a empresa vir. Nós dizíamos: estamos negociando e nós queremos que não só essa empresa, mas várias venham para cá. Para todos esses que nos acusaram, se nós chegássemos agora e falássemos: a proposta é R$ 1.450 que estamos fechando. E se nós tivéssemos fechado em R$ 1.310, como a maioria da população queria? Quem aqui estava errado?”, questiona.