Três dias após o incêndio no Museu Nacional, o governo federal está tomando medidas para tentar reerguer o prédio e o patrimônio histórico. A proposta ainda é fazer uma campanha internacional para a doação e aquisição de acervos para a reconstituição do Museu. Ainda assim, o país lamenta o ocorrido com a herança cultural resguardada no local.
Foi anunciado nesta terça-feira (04) a publicação de uma medida provisória com a Lei dos Fundos Patrimoniais, onde a meta é repassar recursos a museus sem restrições orçamentárias. A partir da MP, um fundo específico para o Museu Nacional deve ser criado para receber recursos destinados à reconstrução. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) deve repassar R$25 milhões para financiar projetos executivos de segurança e prevenção de incêndios, assim como a modernização de museus, arquivos e instituições. Também será anunciada a criação de um cômite formado pelos ministérios da Educação, Cultura, Relações Exteriores, Casa Civil e bancos públicos para coordenar o processo de reconstrução do Museu.
A proposta está prevista em quatro etapas. A primeira será dedicada à realização de intervenções emergênciais de um toldo, escoramento de paredes, levantamento da estrutura, inventário do acervo e separação do que é possível encontrar nos escombros. Depois da conclusão da perícia, será implementado o projeto executivo, e a reconstrução, através da lei federal de incentivo à cultura, Lei Rouanet. A quarta etapa é a de recomposição do acervo, e pode ocorrer em paralelo com a obra de construção.
O que os estudiosos dizem
"Os fundos documentais, museais, geológicos, arqueológicos, paleontológicos, e de outras materialidades, pertencentes ao acervo do Museu Nacional são de valor inestimável. Trata-se de um patrimônio coletivo do país que se perdeu no fatídico incêndio de 02 de setembro, em sua maior parte composto de peças únicas. A perda não se dá em números, mas em prejuízos para a memória, história, produção de conhecimento e formação de profissionais, estudantes e visitantes de nossa e de futuras gerações" comenta a coordenadora do Arquivo Histórico Regional de Passo Fundo, Gizele Zanotto.
Pela estimativa de funcionários, menos de 10% do acervo do Museu Nacional foi recuperado do incêndio. O número dá esperanças mas ainda é extremamente baixo. A informação pode ter sido preservada em parte por fotografias, descrições e outros mecanismos utilizados por pesquisadores. Mas muitas das peças são únicas e raras, como no caso dos fósseis, documentos e múmias, e as reconstituições de fato são impossíveis. Gizele conta que é necessário difundir a importância de acervos como este. "Há que se expandir de fato a informação da importância e necessidade de acervos sob guarda de instituições de cultura para a história e memória do país. É absolutamente triste e indignante ver que as mobilizações e a sensibilização só ocorrem através de tragédias como a que estamos acompanhando", disse.
Arquivo Histórico Regional de Passo Fundo
O Arquivo Reginal do município possui documentos relativos aos poderes legislativos, executivo e judiciário da cidade e da região, periódicos dos princípios da imprensa de Passo Fundo, bem como coleções de jornais circulantes ainda hoje, revistas ilustradas do início do século XX, documentos de compra e venda de terras, fotografias, livros, acervos de entidades, além de uma infinidade de outros materiais que isolados ou em conjuntos, compõe o maior acervo sobre a história e memória do norte do Rio Grande do Sul.
A maior parte dos fundos documentais que integram o acervo vem de doações de indivíduos ou entidades. "São pessoas preocupadas com a preservação de registros de nosso passado e presente, vendo-os como essencial para compreensão do viver no norte do estado. São doações altruístas que pautam-se na valorização desse patrimônio", pontua Gizele.
Locais de acervo
O foco das atenções no momento é o cuidado contra incêncios, o que é de fato difícil e necessário em espaços de memória que guardam acervos. Porém, o fogo não é apenas um dos agentes de perigo que cotidianamente acompanham os Museus. Certamente que a vistoria, o acompanhamento de bombeiros e a instalação de extintores auxilia, todavia, há ainda que se pensar que acervos são alvos do próprio tempo.
A degradação dos materiais e documentos se dá pela ação do tempo, da umidade, de insetos, de mal acondicionamento, de manuseio, da infraestrutura, de inundações e outros perigos. Para muitas pessoas, os locais de acervo são meros depósitos, e não riquezas. Gizele comenta que " dar conta de toda essa profusão de problemas de modo preventivo é o ideal, mas também, no cenário do país, é custoso. Assim, a luta é cotidiana pela melhoria dos acervos de todos os espaços de guarda e precisamos, para tanto, de apoio constante. O cenário atual nos instiga a pensar sobre a fragilidade de nossa memória e história, que seja este pesar o motivador de sensibilização e ações pró-patrimônios coletivos".