OPINIÃO

Os candidatos a deputado e a lei em quantidade

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Nas campanhas eleitorais para deputado estadual, para deputado federal e até para senador é dito que se o candidato for eleito ele irá propor projeto de lei “disso”, projeto de lei “daquilo” e assim por diante. Chegou-se ao ponto de, em uma das campanhas para deputado estadual, um candidato indicar uma meta: se eleito, apresentará 40 projetos de lei por ano, 160 por mandato.

 

Mas a expectativa de que o candidato proponha muitas leis também aparece, por vezes, no julgamento do eleitor. Na sua análise, sobre os candidatos, surgem questões como: quantos projetos de lei o candidato “A” disse que vai propor? E o candidato “B”? E até mesmo a avaliação de desempenho de um parlamentar é feita sob essa ótica. Se o parlamentar “C” propôs 50 projetos de lei, ele trabalhou muito mais do que o parlamentar “D” que propôs três projetos de lei.

 

Nesse ponto, é preciso que nos revisemos, e as eleições nos oferece esta oportunidade. Se olharmos para a realidade brasileira, veremos que o Brasil produz muitas leis, em grande parte desnecessárias. Segundo a Casa Civil da Presidência da República, a estimativa é de que tenhamos 181 mil leis em vigor. É uma estimativa, não uma afirmação, pois não há como se ter certeza do número de leis em vigor. Em pesquisa feita pelo Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação, apurou-se que, de 1988 até 2016, o Brasil produziu, em média, 535 novas leis por dia. Não se pode, então, esquecer o histórico texto de Montesquieu, em O Espírito das Leis, onde o autor, lá no século XVIII, já alertava: as leis inúteis enfraquecem as leis necessárias.

 

Será interessante se uma das propostas, dentre as candidaturas disputantes a uma das vagas, em uma das casas legislativas, apresentar o propósito de combater o excesso de leis que chegam até nós. Assim, em vez de a prometer “mais leis”, o candidato promete “revisar as leis que já existem e eliminar as que não se justificam para o cidadão”, se comprometendo em trabalhar para realizar uma espécie de despoluição normativa.

 

A oportunidade do debate permite discutir: é mais significativo para a sociedade ter um parlamentar que proponha poucos e bons projetos de lei e que fique atento a todos os demais projetos de lei que estão na casa legislativa e à qualidade das leis em vigor? Ou ter outro parlamentar que proponha muitos e muitos projetos de lei, e não se interesse por examinar, estudar, avaliar a pertinência e o interesse, para o cidadão, dos demais projetos de lei em tramitação?

 

Diante dessas questões, talvez nos surja, então, a ideia de que o candidato a um cargo parlamentar deva ter uma boa escolaridade, de preferência, curso superior. É preciso lembrar que escolarização não deve ser confundida com educação política. O fato de um parlamentar “não saber” sobre um projeto de lei que tramita na casa legislativa,não é um problema. Quando, contudo, o parlamentar “não quer saber” do projeto de lei, esse é um grave problema.

 

Independente de escolaridade, têm parlamentares que querem saber e têm parlamentares que não querem saber sobre os projetos e sobre as leis. Há parlamentares com curso superior e que se desconectam da tarefa de bem legislar e há parlamentares com curso superior que permanecem atentos a todos os impactos que nova lei pode gerar no cidadão. Também há parlamentares com ensino fundamental incompleto que se desligam da responsabilidade de bem legislar e há parlamentares com ensino fundamental que estão atentos e desenvolvem um belo aprendizado legislativo.



É importante, por isso, que também façamos a escolha de quem irá nos representar, em um parlamento, a partir do comprometimento que ele demonstra ter com a produção de lei com qualidade e que ele esteja disposto a educar-se politicamente e a buscar subsídios para a formação do seu conhecimento legislativo, a fim de nos afirmar como cidadão, evitando que leis inúteis e demagógicas sejam colocadas diante de nós.

 

André Leandro Barbi de Souza
Advogado, Professor Especialista em Direito Político, Autor e Diretor do IGAM

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