Caminho a passos lentos do Shopping Higienópolis (onde fui à Livraria da Vila) até a Igreja dos Pecadores (quem não é?), quase um ritual sempre que venho a São Paulo e percebo que a Rua Veiga Filho se transforma subitamente em Jaguaribe; há pelo menos, um semáforo que as intermedia. Na viagem de Passo Fundo a São Paulo, que adoro fazer de ônibus, percebo que na fronteira entre Santa Catarina e Paraná, na altura da cidade de Irani não há qualquer acidente geográfico que estabeleça a demarcação entre Santa Catarina e Paraná. Quem demarcou isso? Baseado em quê? Trivialidades minhas? Talvez, mas se pensarmos nas questões da hora, como ideologia de gêneros, por exemplo, poderíamos perguntar sobre a função do professor na sala de aula. Sem me aprofundar muito, minha subjetiva missão de cronista é deixar nos valentes leitores a curiosidade da indagação sobre o tema discorrido, sem ofendê-lo com minhas conclusões que, além de pessoais, podem ser altamente infundadas. A melhor coisa a um escritor é deixar para o leitor a pergunta: será? Qual é a demarcação da função de quem ensina? Submeter os alunos as suas subjetividades ou estimulá-los à busca?
Acho que ao entrar numa sala de aula o professor deve se despir das camisetas de times, de lenços brancos-colorados, de opções religiosas, de ideologias políticas e de temas conflituosos como a precocidade-identidade-sexualidade. Deve, por honestidade, oferecer aos alunos bibliografias isentas porque o aluno não é ignorante, ele sabe e deve ler e deve criar seu juízo. Não devemos usar espaços públicos ou privados de salas de aula para massacrar os mais jovens com nossas deliberações de cunho pessoal. É a minha opinião, altamente discutível, mas é minha e de mais ninguém. E, além disso, as opiniões variam de acordo com o progredir da vida e suas intercorrências. Dizem que somente idiotas não mudam de opinião. Dentro da sala de aula o aluno o é, assim como o professor; fora da sala, cada qual vai ser o que escolher ser.
Em leitura dinâmica nessa sexta-feira, leio a sóbria entrevista concedida de Hamilton Mourão à Folha; ideias claras e ponderadas para acalmar julgamentos precipitados; sugiro que leias, se puderes para tirar tuas conclusões. A Veja, página 41, exibe um comentário de Steve McQueen (não psicografado daquele excelente ator de minha geração), diretor de cinema (negro) inglês, ganhador do Oscar em 2014 por 12 Anos de Escravidão, comentando visita ao Brasil: “é um dos lugares mais racistas que já visitei”. O Brasil é um país estranho, mas é nossa casa e podemos mudá-lo. Se não somos parte da solução, somos parte do problema, como dizem.
Estadão, Caderno 2, C3, desta sexta: Love Is Here to Stay celebra Gershwin. Trata de um álbum elogiadíssimo da pianista-cantora Diana Krall e Tony Benett (92 anos) em homenagem ao que se considera como o mais revisitado songbook do mundo, George Gershwin, falecido em 1937. Benett traz a minha memória os locutores maravilhosos da Rádio Planalto de Passo Fundo (década de 1970) como Guaracy Teixeira, Walter Filho, José Ernani e, por razões sentimentais, já que somos amigos e fomos colegas de faculdade, OJ – Oliveira Júnior. Voz macia, melodiosa, voz que queria ter, tipo Tony Benett, tipo Perry Como, tipo Ipácio Carolino. Ouvir Tony Benett faz bem à alma, assim como ouvir atentamente aos nossos grandes radialistas. Saudades.
Ah, caso queiras saber, comprei três livros na Vila: Viver bem é a melhor vingança (Calvin Tomkins), Você Foi Enganado (Chico Otávio & Cristina Tradáguila) – sobre mentiras, exageros e contradições dos últimos presidentes do Brasil e História em Discursos (Marco Antônio Villa).