OPINIÃO

Superboy

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Os meus primeiros treze anos (1957-70) foram vividos em Cruz Alta, infância-adolescência, de milhares de recordações. Entre tantas, ocorreu-me a leitura dos gibis da Disney, onde eu tinha medo do Mancha Negra e os super-heróis da EBAL (Editora Brasil-América Limitada), que tinha laços publicitários com a editora argentina Editorial Abril de César Civita, irmão de Victor que viria criar em 1950 a Editora Abril, em São Paulo. A EBAL era tudo de bom desde que em 1947 havia lançado Superman, tinha tiragem de até 150 mil exemplares e 40 títulos mensais. A gente lia de tudo, Tarzan, Cavaleiro Negro, Buffalo Bill, Kit Carson, Buck Jones, Roy Rogers, Mandrake, O Príncipe Valente, Batman, Zorro... Meu preferido era O Fantasma e seus mistérios “o espírito que anda”.
Depois surgiriam Thor, O Capitão América, O Homem de Ferro, O Incrível Hulk, Namor, o Príncipe Submarino, todos da Marvel Comics e lançados no Brasil em 1967 com grande campanha publicitária. Meus irmãos e eu ganhamos camisetas com as estampas dos novos heróis; a minha era do Homem de Ferro, meu irmão Renato tinha Capitão América, Binho tinha Thor, enfim é o que a lembrança me traz.


Em dado momento surgiu a edição de Superboy e ficamos confusos porque havia dois, Superman-Superboy que pareciam ser diferentes. Não sabíamos que um era a infância do outro. Alguém de meus mentirosos amigos revelou que tinha um exemplar em que os dois se enfrentavam. Quem vencera? O dissimulado amigo não contava. Estabeleceu-se a celeuma. Afinal, quem venceria esse confronto? O Superman ou Superboy? O homem ou o menino?


Numa lembrança de gibis de há mais de cinquenta anos podemos abordar a questão da luta que travamos entre os homens que somos e os garotos que deixamos de ser. Em alguns momentos de nossas vidas o garoto se manifesta: num grito de gol, numa festa entre antigos parceiros, ao ouvir músicas dos nossos tempos. Nesses instantes sublimes e inocentes brota o melhor de nossas essências, quase o contrário da pele cascuda do homem feito, repleta de cicatrizes, marcas de lutas ferozes, de vitórias e derrotas, de alegrias e tristezas, de encantos e desencantos que moldaram o que somos. E o que somos? Sisudos, críticos, amargos; perdemos o brilho dos olhos, o preto dos cabelos, a cadência das artériase, muitas vezes, o gosto pela vida. É a vida e a rigidez que nos é imposta. Às vezes, maciamente, o Superboy que nos habita se manifesta e somos felizes novamente porque protegidos pela capa-armadura da inocência nos permitimos ficar extasiados com pouca coisa.


É, quero dizer que também tenho um gibi secreto de Superman em que Joe Shuster e Jerry Siegel (seus criadores) contam o encontro beligerante entre ele e Superboy. Nele é narrado que Superboy vence; vence pela pureza, pela inocência, pelo encantamento. A criança que nos habita deveria ser libertada mais frequentemente porque, pelo menos, em alguns instantes,ficamos mais próximos da imagem do Criador.

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