OPINIÃO

O homem que queria saber o que é ser verdadeiro

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Imagino que, independentemente da área do conhecimento e da instituição de ensino, qualquer pessoa que tenha passado por um curso universitário, nos últimos 50 anos, tenha ouvido falar em Thomas Samuel Kuhn. E, mais ainda, se passou por um programa de pós-graduação, mestrado ou doutorado, mesmo que minimamente e, talvez, por obrigação, um dia, manuseou a obra “A Estrutura das Revoluções Científicas”. Esse livro, originalmente publicado em 1962, catapultou Thomas S. Kuhn ao grupo dos mais importantes historiadores, filósofos e epistemologistas da ciência mundial de todos os tempos.


Entender a gênese de uma obra, aparentemente simples e ao mesmo tempo muito complexa, como é o caso de “A Estrutura das Revoluções Científicas”, pode ser facilitada quando essa nos é contada pelo próprio autor. Pois isso, para o nosso deleite, é o que fez Kuhn na laudatória entrevista que concedeu a Aristides Baltas, Kostas Gavroglu e Vassiliki Kindi, durante três dias, de 19 a 21 de outubro de 1995, em Atenas, quando foi agraciado com o título de doutor honoris causa pelo Departamento de Filosofia e História da Ciência da Universidade de Atenas. Essa entrevista, que é uma espécie de autobiografia intelectual de Kuhn, sob o título “Um debate com Thomas S. Kuhn”, pode ser encontrada número especial de Neusis: Journal for the History and Philosophy of Science and Technology (1997) ou no livro editado por James Conant e John Haugeland, “The Road since Structure”, de 2010, que, traduzido para o português, sob o título “O caminho desde A estrutura”, foi publicado, no Brasil, pela Editora Unesp, em 2017.
Thomas S. Kuhn (1922 – 1996) nasceu em Cincinnati, Ohio, EUA, e começou a sua educação (que é diferente de começar a ir para a escola, segundo ele) em escolas ditas progressistas, que davam menos ênfase às matérias e mais à independência do espirito, capacitando os estudantes para serem intelectualmente independentes. Depois, seguindo a tradição familiar, estudou em Harvard, onde gradou-se em Física (1943) e recebeu os títulos de mestre (1946) e de doutor (1949). Após ter concluído o doutorado, a convite de James Conant, o brilhante presidente da Universidade Harvard, passou a dar aula sobre história da ciência para não cientistas (alunos das ciências humana), tendo, em razão disso, se visto obrigado a estudar com mais profundidade alguns casos fora da área da sua especialidade, passando, desde então, a gestar a sua obra magna, que viria à luz somente em 1962. Em 1956 deixou Harvard e foi lecionar história da ciência na Universidade da Califórnia, em Berkeley, onde, em 1961, acabaria efetivado como professor permanente, no departamento de História e não no de Filosofia, como ele esperava. Publicou, em 1962, depois de certa relutância, “A Estrutura das Revoluções Científicas”, que ganhou repercussão muito além da Filosofia, que era o público que originalmente ele imaginava atingir. Em 1964 foi para a Universidade de Princeton e, em 1971, passou a lecionar no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), onde permaneceu até encerrar sua carreira acadêmica. Os últimos 20 anos de vida de Kuhn, por intermédio de conferências e ensaios, foram dedicados a reavaliar e a revisar a sua obra magna e alguns dos seus conceitos fundamentais; cujo livro que ele estava preparando, infelizmente, não conseguiu acabar antes de morrer vitimado por um câncer de pulmão.


O grande legado de Thomas S. Kunh foi ter deixado bem claro o entendimento de ciência como empreendimento social e que, diferentemente do que pregava Karl Popper, outro gigante do pensamento filosófico, as teorias posteriores não englobam as anteriores, uma vez que o avanço científico efetivo não é gradual e cumulativo, mas sim que se dá, quando a ciência normal entra em crise, pela substituição radical de paradigmas.


Eis o homem que insistia em dizer “eu quero saber o que é a verdade, mas não no sentido de saber o que é verdadeiro e sim do que é ser verdadeiro”. Revisitar Thomas S. Kuhn, é a nossa sugestão.

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