Os acidentes com animais silvestres são mais comuns do que se imagina. Somente no ano passado o Grupo de Estudos de Animais Silvestres (Geas), vinculado ao curso de Medicina Veterinária da Universidade de Passo Fundo (UPF), registrou quase 300 atendimentos. Aves, mamíferos e répteis estão entre as vítimas mais frequentes. A interação com humanos e a urbanização estão entre as principais causas, seja por agressões e atropelamentos, ou até mesmo colisões de aves com edifícios e residências com fachadas de vidro. O cuidado com a fauna é uma responsabilidade de toda a sociedade.
Dos atendimentos realizados no último ano, vários casos de fraturas em aves por colisão em vidros, de prédios e casas, répteis como serpentes que vêm para a área urbana devido à presença de ratos, mamíferos atacados por cães, atropelamentos entre outros. A coordenadora do Geas, professora Michelli Ataide explica que os casos mais graves geralmente são por atropelamentos que causam muitos traumas, fraturas e deixam muitas sequelas nos animais. “Recebemos no final do ano um macaco que foi encontrado em uma lavoura de soja perto de Pontão que estava machucado e verificamos que era um ferimento por facão, ou seja, interação direta com o homem. Foi um caso bem grave e precisou de transfusão sanguínea e hoje ele mora no Primaves. Também recebemos um cervídeo machucado e quando verificamos era um ferimento por projétil, provavelmente de uma caça ilegal”, exemplifica.
Atendimentos
Os animais que chegam até o Geas, seja por pessoas da comunidade ou órgãos ambientais, são atendidos no Hospital Veterinário da UPF. Eles passam por triagem para compreensão do quadro e depois são encaminhados para internação e cirurgia, conforme a necessidade. Após o tratamento, os animais podem ser devolvidos para a natureza ou encaminhados para abrigos. A professora explica que cada situação dependerá das condições que o animal apresenta após a recuperação. “Aves são soltas quando estiverem voando, caçando e comendo sozinhas. Mamíferos também precisam ter independência de humano. Os que não têm condição de soltura são destinados, através dos órgãos ambientais, Sema ou Ibama, para abrigos”, explica. No caso dos animais que são devolvidos à natureza há ainda o cuidado de levá-los até o local de origem para que não haja interferência genética entre as espécies.
Resgates de animais
As pessoas que se depararem com um animal silvestre devem estar atentas a algumas situações antes de intervir ou mesmo de mexer nele. A primeira orientação é observar se o animal está ferido ou não. Se estiver, é necessário intervir. A primeira orientação é entrar em contato com os órgãos públicos para verificar a possibilidade de resgate. Esse contato pode ser feito com Secretarias Municipais de Meio Ambiente, Patrulha Ambiental da Brigada Militar, Corpo de Bombeiros, bem como com os diferentes órgãos de segurança. Se nenhum deles puder atender a ocorrência, o próprio cidadão pode fazer o resgate, desde que tome alguns cuidados.
Quando o encaminhamento for feito para o Hospital Veterinário da UPF é necessário informar o Hospital e a equipe do Geas de que o animal será levado para lá. Isso porque em caso de ser parada em uma fiscalização policial a pessoa pode comprovar que está fazendo um bem socioambiental e não cometendo um crime ambiental, uma vez que o transporte de animais silvestres é crime. Nestes casos os próprios policiais podem verificar com o Hospital a informação e liberar o transporte.
Quando encontrar um filhote e houver a suspeita de que ele esteja órfão o primeiro passo também é entrar em contato com Secretaria Estadual de Meio Ambiente, Ibama ou Geas. Nesse atendimento a pessoa será informada sobre o que deve observar antes de qualquer intervenção. “Já me ligaram para informar que acharam um cervo filhote abandonado. Pedi para não tocar porque é normal a mãe fazer uma toca no chão e ir procurar comida enquanto o filhote fica ali. Passei a instrução para observar e se em seis horas a mãe não voltasse o filhote estaria órfão. Ao final a mãe voltou, se não poderia ter sido mais um filhote retirado da natureza sem necessidade”, explica.
Paciente recente
O Geas foi criado em 2012 e reabilitou, neste período, mais de 2 mil animais. Um dos mais recentes foi uma coruja Suindara (Tyto furcata), conhecida popularmente como coruja-de-igreja. Ela chegou ao Hospital encaminhada da cidade de Casca por um cidadão que a encontrou debilitada e necessitando de cuidados médicos. O diagnóstico foi de Traumatismo Cranioencefálico e também uma lesão em seu olho direito. Ela foi tratada e se recuperou dos ferimentos, porém ainda não se alimenta sozinha a equipe do Geas-UPF fará a estimulação da alimentação específica pela noite.
Esta espécie de coruja é amplamente distribuída na América, podendo viver em habitats abertos e semiabertos, exceto nas regiões densamente florestadas da região amazônica. Durante o dia pode ser observada dormindo ou construindo seus ninhos em torres de igrejas, edifícios e sótão de casas. É mais ativa no crepúsculo e durante a noite, caçando seu alimento, que é composto basicamente por roedores e invertebrados, porém de forma mais rara pode caçar morcegos, anfíbios, répteis além de outras aves.
Assim como ela, corujas de várias espécies são atendidas pelo Geas, muitas por colisões em prédios, muros e atropelamentos. Elas estão entre as aves mais úteis do mundo, no que se refere à economia do homem, pois se alimentam de roedores, principalmente nas proximidades de habitações humanas.
O Hospital Veterinário da UPF também presta serviços à comunidade no atendimento de animais silvestres com tutores. O Geas já recebe animais como bicho preguiça, serpentes e aranhas traficadas pelos Correios que foram interceptadas em Passo Fundo, entre outras espécies.