As doações de órgãos sólidos, em Passo Fundo, diminuíram no último ano. Os indicadores vão no sentido oposto às médias nacionais de doadores de órgãos, que apresentaram um tímido crescimento no decorrer de 2018.
Em todo o país, houve a elevação em 0,6% na taxa de notificação de potenciais doadores, e em 2,2% no índice de efetivação das doações, de acordo com o Registro Brasileiro de Transplantes (RBT). As taxas, no entanto, ficaram 5,5% abaixo da estimativa prevista pela Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO).
Em Passo Fundo, foram captados 53 órgãos, em 2018, no Hospital São Vicente de Paulo (HSVP); 32 a menos que no anterior quando as doações chegaram a 85. Para a médica e coordenadora do Comissão Intra-Hospitalar de Doação de Órgãos e Tecidos da Unidade Hospitalar (Cidot), Lina Rosa Dal Moro Maito, essa redução é atribuída à negativa das famíliar para a remoção dos órgãos. “As pessoas confundem morte encefálica com estado vegetativo. A morte encefálica já é morte, e nós não removemos nenhum órgão sem o consentimento da família, mesmo que o paciente, em vida, tenha manifestado o desejo de ser doador”, explica.
Em ambos os anos, as córneas foram as partes do organismo humano mais doadas. Lina lembra, porém, que cada órgão possui um tempo específico para ser removido e transplantado no receptor. “A maior demanda que temos é por rins e fígados, que podem ser divididos e doados com o paciente ainda em vida. Já o coração e o pulmão possuem um critério mais rígido porque têm uma deteriorazação mais rápida, e cuja doação é feita pela família após ser constatada a morte encefálica”, explica.
A lista de espera segue critérios estaduais, de acordo com a Central de Transplantes do Rio Grande do Sul. “É importante salientar que os médicos que realizam a cirurgia não são os mesmos que participam da captação e procura por algum órgão. É fundamental, também, que a família esteja ciente do desejo do paciente em doar”, destaca.
“A gente perde o chão quando descobre que tem uma doença crônica”
Há 10 anos, foi esse o pensamento do aposentado Jorge Santos ao descobrir ser portador de Hepatite C. A doença hepática, tratada com medicamentos antivirais e, até então, sem possibilidade de erradicação do vírus, o colocou na fila de espera por um transplante do órgão. Do diagnóstico à cirurgia, foram 2 anos de viagens para exames e consultas de rotina na conexão Passo Fundo – Carazinho, cidade onde residia.
O tratamento médico convencional, porém, foi composto por métodos alternativos incluídos pelo paciente, na tentativa de cura. “Tomava chás e até recorri à espiritualidade. Eu achei que ia morrer. Tive hemorragia e o médico informou que eu não tinha muito mais tempo”, relembra. O sopro de vida foi dado após 5 meses de espera na fila por um fígado saudável. O telefonema que partiu do Hospital São Vicente de Paulo (HSVP) informando sobre a compatibilidade com um órgão de um doador de Porto Alegre foi celebrado pelo aposentado. “A cirurgia durou de 6 a 7h e eu fiquei com aquela esperança e apreensão se ia ou não dar certo, se o meu organismo não rejeitaria”, conta.
Essa vivência sobre cada etapa necessária para a realização de um transplante alterou a rotina de cuidados mantida por Santos e o impulsionou a iniciar, há 7 anos, um projeto autônomo voltado à sensibilização em prol da doação de órgãos e tecidos. “A doação de órgãos deve ser uma conversa franca de amor e respeito. A família deve estar ciente porque todos têm o direito de viver”, enfatiza.
Para ele, o maior obstáculo para que as mais de 30 mil pessoas que, atualmente, esperam por um transplante consigam chegar à ala cirúrgica continua sendo a desinformação. “As famílias não são permissivas para a retirada dos órgãos de pacientes com morte encefálica porque não há um diálogo. Agora, eu busco percorrer os lugares contando a minha experiência para incentivar as doações”, relata.