OPINIÃO

Ação pasteurizada, mas divertida

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A NETFLIX disponibilizou na última semana uma de suas principais apostas para o primeiro semestre, o longa de ação “Operação Fronteira”, filme com grife à frente das câmeras e um ótimo diretor na condução. O grupo de protagonistas tem Ben Affleck, o ator de teatro Oscar Isaac (que se tornou popular nos novos filmes da franquia Star Wars), o chileno-norte-americano Pedro Pascal (que alcançou a fama em “Narcos”) e Charlie Hunnan, protagonista da cultuada “Sons of Anarchy” e de “A Cidade Perdida de Z”, além de Garrett Hedlund e Adria Arjona. O filme conta a história de um grupo de amigos ex-integrantes de uma unidade de forças especiais que se reúne para realizar um roubo em uma região de fronteira escassamente povoada onde se encontra um grande narcotraficante.

“Operação Fronteira” traz um pouco do que de melhor e de pior é possível encontrar em um filme de ação padrão USA ambientado na América Latina. De lamentável a confusão geográfica típica de quem mora acima da linha do Equador: o filme se passa na tríplice fronteira do Brasil com outros dois países, nunca identificados. Apesar de a ação se passar na floresta amazônica em solo brasileiro, todos os nativos falam espanhol, e o que nos resta é poder ver Bem Affleck enchendo a cara numa conversa de bar bebendo uma lata de Brahma. Mas o pouco interesse em fidelizar geograficamente a história só mantém a tradição dos norte-americanos de pouco se importarem com a geografia do resto do mundo. Em 1979, em “007 contra o Foguete da Morte” tivemos a proeza de ver James Bond virando uma esquina perto do Corcovado e, poucos instantes depois, se ver nas Cataratas do Iguaçú. Aqui, logo após cruzarem a fronteira e pegarem um helicóptero, os protagonistas pouco tempo depois estão cruzando por sobre a cordilheira dos Antes e enxergando o Oceano Pacífico.

Tudo, no entanto, pode ser perdoado se o filme se justifica. E ele em parte faz isso: é divertido, envolvente, mas que não desenvolve o antagonismo com tanto cuidado quanto estabelece as relações do núcleo central. A primeira metade do filme é superior, principalmente em relação ao terço final, quando a trama desemboca em ação e perseguição e não consegue desenvolver isso de forma tão afiada quanto ensaiava. É fácil se identificar com os personagens, com suas relações e abraçar a cumplicidade, graças ao elenco. Uma pena que os antagonistas – todos os tipo de antagonistas que existam no filme - surjam de forma tão fraca. Me incomoda a sensação de que o grande inimigo enfrentado acaba sendo a geografia, ainda que aqui exista uma compensação: as dificuldades só surgem por conta da ganância dos protagonistas, uma linha de narração do filme que está entre as coisas boas. Mas ainda há uma série de pontos que poderiam ser melhor trabalhados - e com menos pressa ou superficialidade - desde uma sequência dos personagens em um vilarejo nas montanhas até o clímax final em que os inimigos são mal contextualizados e justificados (será que, após fazer tudo o que fizeram, os barões das drogas a quem  pertence o dinheiro deixaria a rota de fuga do grupo sendo guardada por um grupo de adolescentes?) 

Ainda assim, só o fato de querer reencontrar os personagens para um prosseguimento que o filme prepara 20 minutos antes de encerrar mostra o quanto há de potencial.

Se realmente a Netflix investir na ideia, que mantenha J.C.Chandor, diretor cuja obra como um todo eu admiro (seu melhor filme se chama “O Dia antes do Fim” e este é, disparado, o mais fraco da carreira. Só espero que garantam que todas as pontas do roteiro recebam a merecida atenção. Já para quem não se apega a detalhes, pode ser uma boa pedida para o fim de semana.

PS: Em tempo, no texto da semana passada, por duas vezes, saiu “Capitão Marvel” em vez de “Capitã Marvel”. Que fique o registro, principalmente num tempo em que nerds furiosos fazem campanha de boicote imbecil ao filme da Marvel por um suposto conteúdo feminista

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