Com editais atrasados, defasagem de servidores e riscos de diminuição no orçamento, o Censo Demográfico 2020 é a principal preocupação de agentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). De um lado, os técnicos tocam as questões operacionais. Do outro, sentem-se de mãos amarradas diante do clima de incerteza que paira sobre o órgão. “A gente faz a parte técnica e aguarda a decisão da central do governo em função dessa redução dos recursos previstos”, resume o coordenador da agência de Passo Fundo, Jorge Bilhar.
No início do mês, a possibilidade de redução do orçamento da pesquisa em 25% foi noticiada pela mídia. A previsão inicial do instituto era de gastar R$ 3,4 milhões. A maior parcela é para a contratação de recenseadores, aquelas pessoas que fazem o trabalho de coleta de dados nas casas dos brasileiros. Porém, a postura do governo de Jair Bolsonaro é de redução de gastos. Durante o ato de posse da atual presidente do IBGE, Susana Cordeiro Guerra, em fevereiro, o ministro da Economia, Paulo Guedes, sugeriu que o instituto venda algum dos prédios que tem no Rio de Janeiro e ocupe o dinheiro na pesquisa. A partir das declarações, parte da comunidade se mobilizou em prol do censo. Uma campanha denominada “em Defesa do Censo” foi lançada na internet e tem adesão de figuras famosas, como o médico Drauzio Varella.
Enquanto a sociedade civil se organiza, o IBGE dá continuidade aos trabalhos da pesquisa. Nesta semana, um treinamento sobre cartografia e sistema informatizado que será utilizado no georreferenciamento do censo está sendo realizado, em Porto Alegre. Um técnico da agência de Passo Fundo ficará na capital até quinta-feira. Porém, outras atividades ficam suspensas. Neste mês, deveria ser feita também a visita aos prefeitos e autoridades. O objetivo era detalhar o funcionamento da pesquisa. “Isso foi transferido em função da questão orçamentária. Não adianta eu ir lá e falar com o prefeito e com as autoridades se eu não tenho parâmetro nenhum para dizer o que será feito no censo”, aponta Bilhar.
Além disso, o coordenador alerta que os editais, tanto para contratação dos funcionários temporários quanto para compra de equipamentos, já deveriam estar em andamento. “Um censo demográfico, uma megaoperação como essa, há uma urgência muito grande com o tempo. Precisamos avisar as pessoas para que elas se inscrevam e possam trabalhar no censo”, exemplifica. Em Passo Fundo, Bilhar estima que sejam necessárias em torno de 300 pessoas.
Para agravar a situação, a demanda por aposentadoria, de servidores de carreira do IBGE aumentou muito nos últimos anos. A agência de Passo Fundo, que tinha oito funcionários, hoje tem quatro. A previsão é que mais um se aposente ainda neste ano. Bilhar também tem tempo de serviço suficiente para sair. Trabalha no instituto há 39 anos. A última vez em que houve concurso público foi há quatro anos. O alívio vem de funcionários temporários, que podem ficar até três anos. Com esses contratados, a agência de Passo Fundo conta com 13 pessoas na equipe.
Diante das dificuldades, o IBGE estuda outras formas de realizar a pesquisa. Entre as alternativas, está a redução do questionário ou a diminuição no número de contratados para a coleta de dados. “Nós estamos prontos para fazer o censo de qualquer jeito, seja o plano A, B, C ou D. A gente quer desempenhar o melhor trabalho possível, mas precisamos de condições de trabalho”, diz Bilhar.
Campanha
Diante das informações envolvendo o orçamento do censo, uma campanha foi lançada em defesa da pesquisa. Há algumas semanas, o médico Drauzio Varella se manifestou pela causa. Em um vídeo, ele fala da importância dos dados para a área da saúde. Varella explica que as informações do censo servem de base para cálculos do governo como, por exemplo, o número de vacinas que serão encaminhadas para cada município ou a quantidade de medicamento que deve ser comprada em licitações.
Conforme Bilhar, a importância do censo vai além. Os municípios utilizam dados do IBGE para seus projetos e ações. Políticas públicas são desenvolvidas a partir das informações colhidas pelo órgão. Pesquisas científicas e investimentos também tomam como base o instituto. “O censo é de suma importância. Se não sair de acordo com o previsto, não é o IBGE quem vai perder, é o cidadão” sentencia Bilhar.