O sentimento paralisante que afeta o setor produtivo da nação reflete o aspecto sombrio do desemprego, endividamento doméstico, medo coletivo e carência de perspectiva. Falamos aqui de reduções drásticas da renda familiar, mas precisamos contabilizar o somatório de aflições com a falta de moradia e saneamento, ou a ameaça a uma aposentadoria esperada pela maioria trabalhadora pobre. O desequilíbrio mental aparece com maior incidência na meia idade e principalmente na velhice que surpreende as pessoas, pois até pouco tempo não era comum envelhecer. O próprio estado patrimonialista reforça a versão de que a longevidade (do pobre) é ônus da modernidade e progresso da medicina. O velho de hoje se vê indigitado como problema social, quando tem pouca renda. O antagonismo do que se diz e decanta nos discursos fictícios torna-se o choque brutal. A previdência e assistência médica são interpretados como grave custo para a gestão. Na idade de descansar, o idoso sabe que repousa a cabeça sobre o que pode ser o travesseiro de sufoco. Não bastasse, escancara-se a ausência de afeto (como virtude) que chega às raias da crueldade, onde jovens parentes sugam dos mais velhos seus recursos financeiros. Falta o respeito cultural e afetivo. Falta virtude familiar.
Falta luz
Seria muito citar causas do que apressa, nos últimos anos, a deprimente falta de perspectiva para o modesto trabalhador. A esperança de dias melhores não é apenas na redução do crescimento econômico de 1,46% para 1,24% como prevê o Banco Central. Ao som das caçarolas ruidosas do alto dos edifícios, os desempregados das fábricas sonharam de novo e foram vender marmitas, mas isso já saturou. A roda da economia não anda só com o supérfluo. Depende da multidão que sobrevive no dia-a-dia do trabalho remunerado. O novo governo instalado já sabia que teria problema imenso, e se apresentou prometendo nova luz. Ainda não surgiu o sinal luminoso. Mesmo que lentamente, o paquidérmico aparato dos três poderes já não pode demorar tanto. É preciso que se cumpra a missão, como diz o poeta Jorge de Lima, em O Acendedor de Lampiões: (...) “Tanta gente também nos outros insinua/ Crenças, religião, amor, felicidade.../ Como esse acendedor de lampiões de rua.”
Relações
As relações humanas, especialmente no campo político, chegam a algum lugar somente através do entendimento, com a palavra. A difusão de valores e a esperança de renovação acontecem com boa comunicação entre forças de representação. Neste campo o presidente Bolsonaro empobrece fragorosamente as relações. Seu palavreado confunde. Confusa a relação entre poderes. Nosso povo já sabe o quanto será difícil, mas a concentração responsável, mesmo com filho incomodando, é exigência do cargo.
Os atiradores
Sem minimizar o furor insano do tráfico de drogas e o averno prisional brasileiro, está faltando o necessário rigor contra as milícias que dominam os grandes centros do país. Quando tais milicianos estão impregnando ativamente a polícia, tudo fica mais absurdo. A escalada da violência com envolvimento de infiltrados oficiais é extremamente prejudicial ao estado de direito. É o crime organizado que executa protegendo interesses escusos da organização com a estrutura do estado. Eles avançam estendendo a escalada de corrupção aos foros de todas as instituições e poderes.
Avançam e matam
Por isso é preciso severidade máxima nas investigações de chacinas, desde o fuzilamento praticado pelo policiamento do Exército nas mortes do músico negro Evaldo dos Santos Rosa e o catador de lixo Luciano Macedo, ou no cruel assassinato do morador de rua Sebastião Lopes, praticada por empresário colecionador de armas. Também é sintomático o extermínio de onze pessoas em Belém, o crime dentro no antro criminoso. O terrível episódio da morte de Marielle, que morreu na defesa dos direitos humanos, é crime miliciano. Essa força criminosa ofende diretamente o cidadão e o estado de direito.