Sem interessados
A operação do transporte coletivo urbano está passando por um processo de readequação e muitas empresas no país estão com dificuldade para acompanhar a velocidade dessa transformação. As concessões públicas não são mais atrativas. Dois municípios gaúchos, por exemplo, Novo Hamburgo e Rio Grande, cidades do porte de Passo Fundo, tiveram seus certames desertos. Não houve interesse pela concessão de Novo Hamburgo em dois editais (um em abril e outro em junho). Rio Grande também fechou sem interessados. As empresas estão com prejuízo, porque o número de passageiros vem reduzindo. Como assim? Sim, reduzindo. Vou usar a mesma informação que dei há alguns dias. Passo Fundo tem mais de 130 mil veículos cadastrados para uma população de 200 mil. Isso é quase um carro por pessoa. Nos últimos dois ou três anos, o transporte alternativo ganhou espaço (Garupa, Uber), as ciclovias se espalharam e as bicicletas compartilhadas são de graça. A onda mais recente são os patinetes e já tem muita gente usando eles na cidade. O transporte alternativo retirou passageiros dos ônibus. Menos passageiros, mais cara a tarifa, porque o custo é o mesmo senão maior.
Captação de recursos
Na esteira da transformação, Passo Fundo tem um problema ainda maior chamado Codepas. Uma empresa de economia mista criada na década de 1980, pelo ex-prefeito Fernando Machado Carrion, com o propósito da captação de recursos. Sim, a Codepas – Companhia de Desenvolvimento de Passo Fundo, foi criada para elaborar projetos e captar recursos. Na primeira gestão do ex-prefeito Airton Dipp, a empresa absorveu o transporte coletivo. Qual era a intenção na época? Que a empresa balizasse o valor da tarifa, mas para baixo. Nas administrações seguintes, a Codepas assumiu outras responsabilidades: o recolhimento do lixo e o estacionamento rotativo. Final das contas, não faz absolutamente nada do que determina o documento de origem da empresa. Foi desvirtuada ao longo dos anos.
Déficit
Não bastasse isso, em que pese toda a boa intenção empregada pelos gestores, já que nenhum dos que administrou a empresa é especialista em transporte, a Codepas se transformou em uma acumuladora de déficits gigantescos. Tanto que, segundo apurou o Promotor de Justiça Cristiano Ledur, responsável pela ação civil pública que investiga a situação da empresa, o prejuízo nos últimos 12 anos é de R$ 16 milhões. Só no ano passado foram R$ 2,8 milhões. E aí vem a questão crucial: se queremos reduzir o tamanho da administração pública, cabe ao município continuar atuando nesse setor?
Tempo
O anuncio feito pelo Executivo de que a Codepas não vai participar da licitação do transporte público leva em consideração estes números e outros que ainda não foram revelados, como as ações trabalhistas. A decisão foi corajosa e segue um indicativo de dois órgãos públicos: o Ministério Público e o Tribunal de Contas do Estado. Como se trata de uma empresa de capital misto, a Codepas necessariamente vai passar por liquidação para ser extinta e esse é um processo que leva tempo. Até lá, o Executivo tem pra si a obrigação de encontrar uma alternativa para os trabalhadores. O Poder Público poderá optar, por exemplo, em manter o serviço de lixo e do controle do estacionamento rotativo.
Solução
Reitero que a extinção da Codepas, que é o melhor caminho a ser tomado pelo Poder Público porque a conta do déficit é paga por toda a sociedade, cria um problema aos trabalhadores que ficarão sem seus empregos. São celetistas que precisam ser realocados em outras funções e ou ter a garantia de outras atividades. Esse, talvez, seja o maior desafio da decisão.
Exercício
Para encerrar o assunto na coluna de hoje, vamos fazer um exercício: nos últimos seis reajustes de tarifas, a Codepas apresentou o maior valor em relação às outras duas empresas. Em 2017 a tarifa era de R$ 3,25. A vencedora da licitação do primeiro edital (Stardbus) ganhou o certame porque ofereceu a menor tarifa R$ 3,05. Se com R$ 3,25 a Codepas já indicava prejuízo, como seria operar por R$ 3,05?