OPINIÃO

O Canarinho de Harvard

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Foi durante caminhada pelas ruelas estreitas de Castelo de Vide, uma pequena vila portuguesa da região do Alentejo, em novembro de 2017, que cruzei com um homem que ostentava uma vasta cabeleira encaracolada e com tons esbranquiçados, cuja aparência soou familiar. Quase que automaticamente, não hesitei ao cumprimento, com um breve oi! Tive a impressão de ter sido correspondido com um “hi”. Logo adiante, minha mulher, Leila, com certo espanto, perguntou: - Tu conheces? E eu: - Claro, é o carteiro Canarinho, poeta, lá de Passo Fundo.


Alguns dias depois, andando pelas ruas da cidade do Porto, Leila deu um leve toque no meu ombro e apontou para um cartaz colado em um poste e disse: - Olha o carteiro Canarinho. Foi então que me dei por conta que o homem que eu encontrara em Castelo de Vide não era o poeta Paulo Volnei Palma, O Canarinho do Planalto, mas sim Steven Pinker, o renomado professor do departamento de psicologia da Universidade Harvard e um dos principais cientistas cognitivos do mundo, que estava no Porto para uma conferência de encerramento do Fórum do Futuro, que acontecia no Teatro Municipal Rivoli.


Lembrei-me desse episódio essa semana, quando, vasculhando na minha desordenada biblioteca de autores locais, me deparei com os livros O Canarinho do Planalto e Canto do Canarinho, de Paulo Volnei Palma, edições de 1992 e 1994; respectivamente. A propósito, você conhece O Canarinho do Planalto e sua obra? Não! Então, eis a oportunidade.


Paulo Volnei Palma, O Canarinho do Planalto, é natural de Mato Castelhano. Nasceu em 14 de fevereiro de 1954, no seio de uma família de agricultores, tendo como pais Hélio Palma e Angelina Santett Palma. Descobriu cedo a sua a sua vocação de poeta, fazendo versos rimados desde os seis anos de idade. Mas foi aos oito anos, quando cursava o segundo ano do primário na Escola Jorge Manfroi, ao usar versos para fazer os trabalhos escolares e escrever pequenos poemas para os colegas, que a professora Therezinha Becher vaticinou que estava surgindo um poeta na vila de Mato Castelhano. Nos anos 1970 migrou para a região da grande Porto Alegre, onde concluiu o 1º e o 2º graus de estudo. Em 1980, retornou para o Planalto Médio, após ingresso na Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Radicou-se em Passo Fundo, casou com a Eveli Terezinha Palma e é pai da Eveli de Lurdes Palma e da Patriane Aparecida Palma. E aqui escreveu poemas, ganhou prêmios em concursos literários, participou de antologias poéticas nacionais, publicou livros e ficou conhecido pela sua inconfundível cabeleira.


O Canarinho do Planalto é um poeta popular, que explora temas humorísticos ou intimistas, dependendo das circunstâncias, e dá preferência à rima em vez de usar aliterações para construir a sonoridade dos seus versos. São exemplos, “A visita da velha”, cujo conteúdo, hoje, se descontextualizado, poderia soar não politicamente correto: “Recebi uma visita/da velha que namorei/a coroa rejeitada/que em versos já cantei/chegou sorrindo e chorando/confesso que me assustei/me disse que tava grávida/e foi eu que a engravidei.” E segue o poema nesse mesmo tom por mais 48 versos. Ou, com temática social, em “O Doutor e o Esmoleiro”: “Numa família tem de tudo/quando são bastante irmãos/tem o padre e o doutor/o pobre e o tubarão/enfermeira e professor/e também tem o ladrão/tem boêmio e tem artista/entre outras profissão.” Ou, quando manifesta a tristeza de um filho pela morte da mãe, em “Mãe ausente”: “Minha mãe subiu ao céu/mas sei que subiu penando/por deixar aqui na terra/o seu filhinho chorando/mas eu sei que lá no céu/mamãe está me esperando.”


A poesia de Paulo Volnei Palma tem público específico. Se o Canarinho do Planalto é um grande poeta ou não, é uma questão que só diz respeito aos historiadores da literatura. O leitor desse tipo de poema, em geral, não está interessado nessa análise literária, apenas gosta ou não gosta. Quanto a confundir Steven Pinker com o Canarinho do Planalto, busca as imagens no Google e conclua você mesmo se eles não são muito parecidos.

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