Da língua ao rabo
Ah, uma língua é sempre uma delícia. Tem uma textura inconfundível. É, simultaneamente, rija, flexível e aveludada. Mas língua não é para qualquer um, pois exige muita habilidade ao manuseio. O mais importante é saber utilizá-la numa sequência perfeita. Tudo ao seu tempo. Nem mais, nem menos. O primeiro passo é encontrar a língua certa. E foi desejando uma linguinha gostosa que parti em busca. Encontrei várias e, seguindo a dica de que as menores são as melhores, peguei um dos pacotinhos mais leves. Então, confesso, acho que até sonhei com a língua. Mas primeiro temos que quebrar o gelo. Um trâmite onde nada pode acontecer de forma abrupta ou avançar o sinal. Assim, enquanto o pacotinho descongelava submerso na água fria, preparei um caldo quente na panela. Folhas de louro, alho, pimenta em grão, cravo-da-índia, noz-moscada, molho inglês e uma lasquinha de canela. Ah, que aroma envolvente. Um banho de especiarias digno da mais encantadora de todas as línguas. Passar a mão também faz parte do ritual. Então, apalpando o pacotinho estranhei que havia uma parte cilíndrica e rígida. Foi uma resposta nada agradável vinda do nosso quinto sentido.
Mas seria apenas um susto já que, em outras circunstâncias, poderia ser bem mais embaraçoso. Então fui abrindo a embalagem e, surpreso, encontrei um rabo. E com etiqueta! Sim, eu peguei o pacote errado. Mas não há como refugar um rabinho. Aliás, rabo é uma iguaria da culinária gaúcha que combina com mandioca cozida. Mas eu desejava mesmo era uma língua. E estava ali na cozinha com um rabo na mão. E, entre essas duas pontas, não vamos nos perder pelo caminho. Então, retornando o pensamento à cauda, tive que aproveitar o caldo. Porém, língua e rabo são extremos que exigem muita paciência e técnica aprimorada. Isso significa que nessa hora temos que usar a cabeça com muita calma. O primeiro ato foi tirar o excesso de gordura e guardar o pote de manteiga na geladeira. Então, coloquei o rabo na pressão e transformei o sonho da língua à provençal numa suculenta rabada. Estava ótima, mas ficou aquela sensação de que o cardápio teve a intromissão do prefixo grego “en”. A vingança veio no dia seguinte quando, finalmente, me deliciei com uma verdadeira língua. Rabo ou língua? Pouco importa. Sempre nos deleitamos e acabamos lambuzados.
Barulheira
Pensei que a barulheira estava acabando nas ruas centrais de Passo Fundo. Em alguns estabelecimentos prevaleceu o bom senso e o respeito, pois acabaram com a palhaçada de colocar caixas de som nas portas. Porém, alguns ainda não se deram conta do incômodo que provocam. Além do volume excessivo, primam pelo péssimo gosto musical. Assim temos uma dupla agressão. Machucam os nossos ouvidos pela barulheira e, ainda, nos agridem com a porcaria sonora que pensam ser música. Isso é falta de civilidade. Sim, não sabem viver em comunidade. Imaginem se todos os estabelecimentos comerciais utilizassem alto-falantes nas portas? Ora, para alguns está difícil de a ficha cair. Será que nunca ouviram falar em harmonia e respeito recíproco? Com tanto barulho, já não escutam mais nada.
Iracélio
Enquanto o Acioly exerce um repouso compulsório, o Iracélio fica meio perdido sem o seu fiel parceiro de Bar Oásis. Extraviado, nosso querido Turcão resolveu bater ponto na Mesa Um. Fica em silêncio e às vezes anota algo numa carteirinha. Então perguntei o que ele estava escrevendo. A resposta veio com um sorriso maroto e um ar de superioridade. “Agora tô cheio das novidades. Quando o professor voltar eu vou contar um monte e ele vai ver como eu sou inteligente”. Iracélio não toma jeito. Continua tomando cerveja.
Trilha sonora
A convidada de hoje é Céline Dion - Encore Un Soir
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