O asfalto que foi colocado sobre os trilhos em alguns cruzamentos dos bairros Vera Cruz e Valinhos indicam que por ali não passam mais trens e reacendem a esperança de legalização das moradias para mais de 2,6 mil famílias que vivem nestas ocupações. Isso porque com a desativação do ramal ferroviário, abre-se a possibilidade do Município obter as áreas, via União, para regularização fundiária ou outro programa habitacional.
Porém, ainda que haja cobertura asfáltica em alguns pontos e os trilhos estejam tomados pela vegetação nestes bairros, a Secretaria de Habitação não recebeu nenhum posicionamento oficial do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), de acordo com o titular da pasta, Paulo Caletti. “Ainda em 2018 solicitamos ao DNIT e a Rumo (empresa que obtém a concessão do serviço) que verificassem se o ramal era utilizado”, relembra o secretário.
Na ocasião, a pasta solicitou que se tais linhas estivessem desativadas, que o departamento destinasse às áreas nos entornos para o Município. “Não recebemos nenhuma manifestação do DNIT”, informou. Recentemente, o vereador Rudimar dos Santos sinalizou, na imprensa, sobre a possibilidade de legalização das moradias. A partir da declaração, Caletti voltou a fazer contato com a empresa Rumo, que informou, ao secretário, não haver nenhuma desativação oficial.
Reunião com o DNIT
Rudimar dos Santos diz que vai se reunir, ainda em novembro, com técnicos do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (DNIT) em Brasília para negociar a transferência de tais terrenos da União ao Município. O vereador diz que já conversou, no início do ano, com representantes do DNIT e também já visitou a empresa que detém a concessão para realizar o serviço, a Rumo Malha Sul. Nestas ocasiões, obteve a informação da desativação de algumas linhas, como a Passo Fundo-Cruz Alta.
O que diz a Rumo
A reportagem procurou a empresa para questionar sobre a desativação. “Os trechos ferroviários entre Passo Fundo-Marcelino Ramos e Passo Fundo-Cruz Alta já estavam desativados antes da empresa assumir a concessão em 2015. Esclarece ainda que ainda não há desvinculação das áreas arrendadas junto ao DNIT. As ações de reintegração de posse são feitas em razão de sua obrigação legal e contratual de preservação da faixa de domínio da ferrovia e são discutidas no âmbito da justiça”, disse, em nota.
Esperança dos moradores
“Eu prefiro mil vezes que legalizem e que a gente pague IPTU, mas tenha uma escritura”, sintetiza Lisane Terezinha Guedes, que mora há 17 anos em residência muito próxima dos trilhos, no Valinhos. Ainda que o trem não passe mais pelo local já tem dois anos, ela não esquece o barulho e os estragos da passagem.
A esperança de Lisane, com a cobertura asfáltica, é pelas possibilidades que a legalização do terreno proporciona. Com escritura, os moradores podem não apenas conseguir financiamentos habitacionais e realizar obras de melhorias, como respirar aliviados sem o medo de serem despejados. “Essas pessoas sempre moraram ali. Criaram seus filhos. Há um apego emocional com o lugar”, pontua o vereador.
Processo judicial
Na 1ª Vara Federal de Passo Fundo tramita uma ação movida pelo Ministério Público Federal contra a União, o Município de Passo Fundo, a empresa Rumo Malha Sul S/A e ANTT, que discute o direito à moradia. Em janeiro deste ano, o juiz Rafael Castegnaro Trevisan determinou, em audiência realizada com as partes, que a empresa deveria apresentar, em um prazo de cinco meses, um levantamento de todas as residências e moradores da Beira-Trilho de Passo Fundo. Em caso de descumprimento, a multa diária prevista é de R$ 10 mil. A possibilidade de regularização fundiária e o reassentamento das famílias nas áreas desativadas da rede ferroviária já haviam sido levantados pelo MPF na audiência.
A empresa apresentou um levantamento no processo e ingressou com um recurso em segunda instância, que ainda não foi julgado, por discordar da decisão do magistrado. Recentemente, a Comissão de Direitos Humanos de Passo Fundo (CDHPF) se manifestou na ação oferecendo algumas possibilidades à empresa, como por exemplo, fazer acréscimos ao levantamento com a colaboração de entes públicos, comunidade Beira-Trilhos, organizações da sociedade civil e outras entidades locais como as universidades. A análise sobre o teor do levantamento apresentado pela empresa Rumo cabe agora ao juiz Rafael Castegnaro Trevisan.