Como o calendário litúrgico está chegando ao seu final, a liturgia propõe aos fiéis textos bíblicos, orações, cânticos que refletem finitude, morte, julgamento, céu, purgatório e inferno. Estes temas são conhecidos como novíssimos que são refletidos e estudos na teologia numa área chamada de escatologia.
O dicionário teológico define assim a escatologia. “É a referência permanente a um futuro absoluto e transcendente, que é Deus e que emerge em toda reflexão antropológica-teológica ao tratar do sentido e da finalidade do homem, da história e do cosmo”. O ser humano tem consciência da sua finitude e convive com ela cotidianamente. Ao ver a morte dos outros sabe que um dia também chegará a sua hora, mesmo não a desejando e fazendo de tudo para distanciá-la o máximo possível. Diante deste destino certo surgem perguntas fundamentais sobre o destino e a finalidade da vida, da história e de toda criação.
Portanto, a dimensão escatológica coexiste e acompanha a própria condição humana. A pergunta sobre o futuro eterno após a morte está envolta em mistério, em incerteza e o homem, por si só, é incapaz de encontrar uma resposta sobre seu destino final. Na perspectiva cristã, estas perguntas são respondidas a partir da revelação de Deus em Jesus Cristo e na reflexão teológica. São temas que envolvem fé, como ensina a Carta aos Hebreus 11,1: “A fé é fundamento daquilo que ainda se espera e a prova de realidades que não se veem”. A escatologia trata das realidades últimas, do definitivo, do totalmente outro, da ressurreição final, do encontro definitivo ou não com Deus no seu reino.
O apóstolo São Paulo falando do Reino de Deus dá a estas realidades várias cores e atribuições: instaurar todas as coisas em Cristo; reconciliação de todos os homens e de todas as coisas em Cristo; nova criação e nova humanidade; libertação escatológica da criação da vaidade, da injustiça e da morte e ressurreição final dos mortos em Cristo. Para chegar a estas novas realidades estão envolvidas a morte, juízo, inferno e a glória.
A morte coloca cada pessoa diante da verdade. Nessa altura, nada mais pode ser alterado da sua trajetória, fecham-se as possibilidades de novas decisões, nada mais pode ser ocultado. É esta pessoa e nestas condições que ela termina a sua trajetória neste mundo e se apresenta para o juízo último e definitivo. A humanidade tem os seus critérios de julgamento das pessoas e quando entramos na seara da eternidade entram os critérios divinos. O místico São João da Cruz dizia que “no ocaso da nossa vida, seremos julgados quanto ao amor”.
Os textos bíblicos quando falam de céu, de glória eterna, ressaltam que não se trata de um espaço, mas de presença junto a Deus: “ver tal como Ele é”; “viver com Cristo”. Em 1 Coríntios 2,9 escreve: “O que os olhos não viram, nem ouvidos ouviram, nem entrou no coração do ser humano, é o que Deus preparou para os que o amam”. O purgatório, ensina a Igreja, é a purificação final, após sua morte, a fim de obter a santidade necessária para entrar na alegria do Céu. Neste contexto está a oração pelos falecidos.
O inferno consiste no afastamento definitivo de Deus. Dostoieski, escritor russo, escreveu: “Pergunto-me: o que significa o inferno? Afirmo: a incapacidade para amar”. Mas se Deus é amor como pode ter o inferno? Trata-se de liberdade humana. Ninguém está predestinado, mas são as escolhas livres e conscientes que dão rumo à vida, seja neste mundo, seja na eternidade. Ninguém pode ser conduzido a estar na presença de Deus se optou se afastar Dele livremente.