Chove nesta quinta de plantão de número 667 (desde julho de 2007), adoro chuva...que chova chuva sem parar. Depois de escaldantes dias o deus da chuva manda chover. Os deuses...ah, os deuses, aqueles que aquietam os espíritos indômitos dos humanos. Há deuses demais no mundo dos homens. Há deus do impedimento e do gol contra; há deus da união e da separação;há deus da lágrima e do sorriso; da abundância e do infortúnio. Quanto maior a nossa ignorância em relação ao universo maior é o número de deuses a habitar nossas limitações. Os deuses procriam a partir do desconhecimento sobre as razões de nossas existências. A pergunta é: o universo é para os homens incognoscível, inescrutável, incompreensível ou desconhecível? Ou tudo isso, junto e misturado?
Nossos cinco e limitados sentidos percebem as coisas como elas seriam em apenas 5% de suas grandiosidades. Em outras palavras, 95% do que existe foge à percepção humana. Ondas de luz dos raios solares atravessam nossos corpos e não percebemos; micro-ondas, ondas de rádio infravermelho e ultravioleta transportam informações que nossos olhos não percebem.Há sons que somos incapazes de ouvir. A ilha do conhecimento humano, embora formidável, é cercada por um vasto oceano do desconhecimento. Mas, ao contrário de prostrar, o homem quer saber e é o que o torna relevante: querer saber, querer conhecer. Por isso somos raros e é bem provável que sejamos únicos nesse universo ou multiverso. Isso nos afasta de Deus? Não, a ciência busca o desconhecido através daquilo que já é conhecido, caso contrário não seria ciência, seria especulação. Se seria tudo de explicação ligada à divindade, não sabemos. Aliás, nem sabemos em quem votamos na penúltima eleição.
O homem senta perto de Deus e pergunta: qual o propósito de tudo isso? E tudo precisa ter um propósito? Pergunta Deus; certamente, disse o homem. Então deixo que você pense em um para tudo isso, concluiu Deus. E, aí, estamos buscando propósitos, lentamente, até mais lentamente do que gostaríamos que fosse. Mas, assim é o homem e a ciência. E chega um momento de exaustão em que em nada acreditamos e viramos niilistas; pensamos a vida como suficientes em si mesma, sem segundo tempo. Aí sentamos com Sartre e Simone em um bar qualquer de Saint Germain ou Marais e convidamos Scott, Zelda, Gertrude e Ernest para encher a cara e fumar até a quarta de cinzas de 2026. Usei muitos argumentos de Marcelo Gleiser no livro A Ilha do Conhecimento, que carreguei ao plantão 667, enquanto curtia a chuva. Recomendo a leitura.
Que merda ser sessentão e pensar na vida; melhor seria somente aproveita-la mesmo sem cachaça. Mas, se assim fosse, não seria ligado à ciência como médico que sou, e não seria homem, porque ao homem deliberou-se fazer perguntas, talvez, deliberação dada pelo deus das grandes perguntas; talvez, pelos deuses do niilismo ou existencial. Vai saber.