Há dez dias, talvez mais tempo ainda
Há 10 dias acordei de uma “viagem” bem idiota para minha idade, nem tão avançada assim, é bem verdade. Dei-me conta que estava a bater boca ou bater teclas de notebook com pessoas que mal conheço, com quem não tenho a menor intimidade sobre política, sobre socialismo utópico ou capitalismo selvagem. Da festa, da grande festa que ocorre na política a maioria de nós, a patuleia (como define Elio Gaspari), não será convidada a participar, a não ser, é claro, na hora de pagar a conta. Na grande festa da exibição da genitália masculina, para não escrever termo mais chulo, a gente entra com as bundas, para não escrever outro termo vulgar. Então, decidi parar de rebater e apenas ler, às vezes nem isso, as opiniões contrárias, sem a manifestação contrária. Tem Grêmio e Inter, tem chimangos e maragatos...é isso aí, a grande diversidade e em cada cabeça, uma sentença.
Muitos de nossos valorosos companheiros estão sob efeito desse vírus que não encontra limites, somos pequenos demais. Muitos sobreviverão a seu ataque, outros quedarão. A gente fica meio anestesiado diante do que parece inexorável, o contágio. Leio que em São Paulo concluíram que a metade dos contagiados era absolutamente assintomático e isso é assustador. Por que o vírus me quis, por que não me quis? Diante desse panorama as discussões sobre política e futebol ganham papel secundário, irrelevante...
Tem pessoas que passam em nossas vidas e marcam. Temos nossos ídolos das músicas, cinema, teatro, futebol. Tem a gente que a gente queria ser tal qual. Lembro de Raul e seu túmulo no gramado do Jardim da Saudade em Salvador; ali, no chão, uma placa azul de letras brancas: Raul dos Santos Seixas e eu chorei; chorei porque éramos próximos, eu acho, ele dizia e cantava a crítica de uma sociedade que não era atenta à solidariedade. Pintava liberdade de costumes e uma sociedade alternativa, eu era jovem e queria um novo mundo, não utópico, mas um mundo possível; é provável que ele não venha, não nessa geração. Ali, sob a placa, entremeado ao pó, estava meu ídolo, o maluco beleza, o que havia assistido à sessão das dez, o que queria partir em um disco voador, como o Capitão Blood.
Lembrei subitamente de Luciana Vendramini, sei lá porquê. Era uma das musas de um passado recente, uma menina de São Paulo que viveu uns tempos com o roqueiro Paulo Ricardo. Veio-me Luli, esposa de Jaime Ughini, que como seu marido foi embora cedo demais. Nunca tivemos intimidade nos convívios, mas era a Luli...a Luli e lá vinha ela pela Moron, de braços dados com sua mãe. Ela tinha tudo a ver com a Moron...a mais bela rua da cidade não será a mesma sem Luli, pelo menos para os da nossa turma. Quando penso na Luli e em Jaime, amigos tão simpáticos e tão queridos, penso nas bobagens e mesquinharias que expomos nas redes sociais, espaço que poderia estar ocupado com o nosso melhor. Merda, não é mesmo? Estamos na torcida para Edu Wentz porque o Boka é quase nossa segunda casa, assim como o Natus. Ali, nesses bares, estão petrificados milhares de grandes momentos e essas pessoas queridas são parte de nossas carnes, são parte de nosso sangue. Estamos na vigília por Alexandre Fagundes, (em recuperação de acidente de trânsito) filho de nossos amigos e, portanto, nosso filho também. Merda...termo chulo, é verdade...merda, merda...a vida, às vezes, é uma merda. Mas, não se entreguemo.