O agravamento da pandemia e os picos de internação, responsáveis por condicionar a região de Passo Fundo à bandeira preta, além da irresponsabilidade de centenas de passo-fundenses que são abordados pela Brigada Militar em junções clandestinas, acendem um alerta para o risco de colapso na rede hospitalar local e esgotamento de recursos materiais para o enfrentamento da doença.
Embora o Governo Federal tenha habilitado 23 novos leitos para o atendimento de pacientes com exame sorológico positivo para coronavírus na cidade, sendo 13 no Hospital de Clínicas (HC) e 10 no Hospital São Vicente de Paulo (HSVP), esse aprofundamento da crise sanitária se desenha nos gráficos da Secretaria Estadual de Saúde (SES). Com 121,9% de ocupação das camas nas enfermarias adaptadas para suporte aos infectados pela covid-19, registrado na terça-feira (23), a sobrecarga no sistema de saúde interno do HC indica que os profissionais de saúde enfrentam, agora, o pior momento desde os primeiros efeitos locais da pandemia, há 11 meses. “Não temos mais como ampliar leitos de UTI. Tudo já foi colocado à disposição”, atestou o administrador do Hospital de Clínicas de Passo Fundo e presidente da Federação das Santas Casas do Rio Grande do Sul, Luciney Bohrer.
Tal preocupação do gestor, aliás, pode ser descrita em números. Dos 32 leitos clínicos abertos no HC para internação de pacientes com suspeita ou confirmação de coronavírus, 39 estão ocupados. O aumento no fluxo de contágio demandou a disponibilização de sete camas hospitalares extras para atendimento pela rede pública. Essa pressão na estrutura hospitalar, contudo, não se distancia quando o olhar é direcionado à rede privada. Segundo o monitoramento da Secretaria de Saúde, 12 leitos particulares estão ocupados no Hospital de Clínicas quando a capacidade para suporte aos casos de covid-19 se limita a 7 internações. Isso representa um índice de 171,4% nas ocupações de camas reservadas aos internos com plano de saúde. “Os recursos são finitos e há muita dificuldade para manter os atendimentos. A comunidade precisa ter essa responsabilidade social”, lembrou Bohrer.
Mesmo que o pico de internações fora das Unidades de Terapia Intensiva (UTI), no HC, tenha sido registrado na semana seguinte ao Carnaval, em 21 de fevereiro com 131,2% da capacidade comprometida, a alta no preenchimento de leitos começou no dia 12 deste mês, como particulariza as projeções do governo gaúcho.
Mudança no perfil
Além de uma estrutura física capaz de suportar a demanda e os cuidados requeridos, a mudança no perfil dos pacientes se tornou mais uma preocupação aos profissionais que atuam na recuperação dos contagiados. Se no início da pandemia a apreensão era com as pessoas mais idosas com comorbidades associadas, os prontuários médicos apontam uma subida nas internações de pacientes mais jovens sem patologias tanto no Hospital de Clínicas quanto no Hospital São Vicente de Paulo (HSVP). “Se os jovens estão sendo contaminados é porque não estão fazendo aquilo que é necessário. Em nenhum momento da pandemia, até aqui, tivemos a iminência de colapso. Se não ocorrer uma diminuição nos contágios, vamos nos encaminhar para tal”, advertiu o médico e diretor do HSVP, Adroaldo Baseggio Mallmann.
A piora no quadro de contaminação, como ponderou Mallmann, vem sendo observada desde o último final de semana. “Vamos receber 13 respiradores por empréstimo. Até então, não tínhamos necessitado nenhum auxílio do Estado”, disse o médico ao falar sobre a abertura de 30 novos leitos no centro intensivo para pacientes com coronavírus. O aumento nos casos, aludido pelo diretor do HSVP, está provocando outra consequência interna para os hospitais. “Um número bastante elevado de médicos e profissionais assistenciais contaminados”, mencionou Mallmann. Com os agentes de saúde doentes e a dificuldade em contratar novos habilitados para ocupar os postos intensivistas, especialistas em outras áreas da Medicina estão sendo remanejados para auxiliar no combate à pandemia no município. “Perdemos o respeito conosco mesmo e com o outro. É uma responsabilidade coletiva”, destacou o médico ao reafirmar a necessidade do distanciamento social e uso adequado dos acessórios de proteção individual.