O mês de março se termina hoje (31) com um triste saldo: o mais trágico desde o início da pandemia em Passo Fundo. Até ontem (30), a Secretaria Municipal de Saúde contabilizava 104 mortes provocadas pela Covid-19. Para efeito de comparação, foram necessários quatro meses e nove dias para o município atingir as primeiras 100 mortes, fato ocorrido em 18 de agosto de 2020. No boletim de ontem, Passo Fundo somava 397 óbitos.
Perfil
Os homens são as maiores vítimas da Covid-19, representando 57% das mortes pela doença. No entanto, uma mudança de perfil que se apresenta em todo o estado se repete no município. Os mais jovens e pessoas sem comorbidades estão sendo mais atingidas pelo vírus.
Os números demonstram que as mortes de pessoas entre 40 e 49 anos cresceram 106% em 2021, em relação a 2020. No ano passado foram 15 vítimas. Somente nos três primeiros meses de 2021, já são 16 óbitos. Por outro lado, a menor elevação de óbitos ficou entre pessoas acima de 80 anos, com 55%, mesmo assim, eessa faixa etária segue sendo a mais afetada. O levantamento foi realizado a partir dos boletins semanais da Secretaria Municipal de Saúde de 31 de dezembro de 2020 e 25 de março de 2021.
“Até início de janeiro, a gente fazia um olhar da UTI vendo octogenários, pacientes bem idosos. Aos poucos foi mudando. Temos um alto número de pacientes jovens precisando de leitos de UTI”, relata o médico Gustavo Picolotto, coordenador médico das unidades Covid-19 do Hospital de Clínicas (HC). A nova variante pode ser uma das causadoras dessa mudança, no entanto, o médico também cogita outra hipótese. “Com alto índice de contaminação e o maior número de pessoas acometidas, vão acabar chegando pacientes mais jovens. É um somatório de fatores”, analisa.
A taxa de óbitos entre pacientes sem doenças pré-existentes, as chamadas comorbidades, também cresceu. Até o final de 2020, esse grupo representava apenas 4% das vítimas, agora a porcentagem subiu para 6%. Ainda assim, as pessoas com comorbidades seguem como as maiores vítimas da Covid-19. “O que a gente vê com maior risco de complicação é obesidade e diabete, mesmo em pessoas jovens. A gente não sabe se a variante P1 [identificada inicialmente em Manaus] é mais agressiva e muda muito rápido, ou se as pessoas estão aguardando demais para buscar atendimento e suporte médico”, explica.
Além disso, nas últimas semanas os pacientes estão chegando ao hospital com um quadro mais grave e urgente. “Geralmente começa com uma fadiga, uma sonolência excessiva, estar mais cansado fisicamente, uma dor no corpo. Quando aparece isso, a pessoa tem que marcar os dias. Se continuar, ao final do segundo, ou a partir do terceiro dia, é importante já testar”, aconselha o médico. Outras recomendações importantes são: manter o acompanhamento médico, manter o distanciamento e ter um oxímetro em casa para verificar a oxigenação do sangue.“Abaixo de 93 é importante buscar atendimento, às vezes, é o único sinal”, explica Gustavo.
Outros destaques
Março também bateu outros recordes relativos à pandemia na cidade. Foi o mês com mais testes realizados, acima de 12 mil até o dia 25. Passo Fundo registrou mais de 4,8 mil casos ao longo do mês, superando dezembro, quando o total chegou a 4 mil casos. Passo Fundo também teve em março a maior ocupação de UTIs e leitos clínicos por Covid-19, chegando a 108,3% e 99,4%, respectivamente (o boletim municipal não especifica a data do recorde de ocupação).
“Esse último mês foi nosso pior momento”
Dentro dos hospitais, o mês em que a cidade completou um ano do primeiro caso se mostrou como o mais exigente para os profissionais. “A gente teve um aumento exponencial dos casos a partir da primeira semana de março, desde então, sempre com a UTI lotada, sempre com a ocupação máxima, sempre com pacientes na emergência aguardando leito de UTI. A gente chegou ao nosso limite do número de pacientes”, explica o médico. Neste momento, as internações mostram uma desaceleração, com a queda das hospitalizações, especialmente nos leitos clínicos. Ainda assim, a situação segue crítica. “Mantém a lotação máxima e pacientes em lista de espera, pela alta demanda, temos pacientes intubados nos leitos clínicos, que a gente leva para leitos extras de CTI na emergência, onde temos oito leitos'', revela Picolotto. A expectativa é que em breve reduza também as solicitações de UTIs.
Dias intermináveis
A experiência de trabalhar nesse cenário é desgastante. “Tem sido diferente, tem sido cansativo, porque a gente está sempre com a corda esticada. Estamos tratando um paciente, vendo outro piorar e aguardando leito para o outro. Tem dias que são intermináveis”, declara Gustavo. Segundo ele, os últimos dias são considerados como um “respiro” depois da explosão de internações.