Já abordamos aqui na coluna, algumas vezes, o que denominamos como geopolítica da vacina, ou seja, a forma como os grandes produtores dos insumos administram a questão no tabuleiro das relações internacionais. Neste momento chegamos em um ponto de inflexão: como as vacinas podem influenciar a geopolítica ou até que ponto depender apenas (ou em grande maioria) de uma vacina que pode alterar as decisões geopolíticas. Há uma ampla discussão no contexto asiático (quem em breve chegará no Ocidente) sobre a eficácia das vacinas chinesas (Sinopharm e Sinovac), ainda mais com o surgimento da variante Delta. Um recente estudo da Universidade de Hong Kong demonstrou, por exemplo, que as pessoas que receberam a vacina da americana Pfizer (que leva o vírus ativado) tiveram uma resposta dez vezes melhor contra o vírus daqueles que optaram pela chinesa Sinovac. Mesmo que uma vacina, independentemente da origem, possa trazer algum nível de proteção, as decisões geopolíticas vão se alterando.
China
A China admite que uma terceira dose de vacina será essencial para sua população. O curioso é que a referida dose não será de suas próprias vacinas (que levam o vírus inativado) e sim de uma parceria com a alemã BioNTech, da qual a China poderia fabricar e distribuir por sua empresa, a Fosun Pharma. O nome comercial da vacina é Comirnaty, que em grande parte do mundo é uma produção conjunta com a Pfizer. A Comirnaty tem eficácia de 95% (após a segunda dose). O temor geopolítico, além da questionável eficácia das vacinas chinesas, é que elas não consigam controlar surtos da variante Delta. O ponto curioso é que o maior ceticismo com as vacinas chinesas vem de Beijing. A China não tem planos para afrouxar o controle em suas fronteiras, ao menos até 2022, o que demonstra de fato o ceticismo com as suas próprias vacinas e a reação em administrar mais doses de uma vacina com outra tecnologia.
Reações
A Malásia anunciou recentemente que não irá mais administrar as vacinas da chinesa Sinovac, devido à baixa eficácia contra a variante Delta. A Indonésia planeja uma dose de reforço (booster shot) aos profissionais da saúde que tomaram a Sinovac (e mesmo assim testaram positivo). A medida segue na esteira de outros países como a Turquia e os Emirados Árabes. A Tailândia irá oferecer dose de reforço da AstraZeneca aos que tomaram a vacina da Sinovac.
Em observação
Os recentes movimentos no sudeste asiático trazem um cenário importante: os países em desenvolvimento que optaram (ou dependem) das vacinas chinesas terão de adotar uma estratégia rápida para conter o avanço de novas variantes, com tecnologias diferentes, preparando-se para uma dose adicional. A geopolítica da vacina chinesa está perdendo o seu prestígio no sudeste asiático e logo o sinal também ficará vermelho para países dependentes dos insumos chineses. Enquanto isso, a China busca aprovar a nova tecnologia (com vírus ativado), que poderá ser a nova pedra fundamental na geopolítica chinesa da vacina.