A expectativa pela reabertura do Aeroporto Lauro Kortz é muito grande. O fechamento atinge diretamente aos passageiros das linhas aéreas, usuários da aviação executiva, táxi-aéreo e até de aviões-ambulância. Além de Passo Fundo, a interdição prejudica usuários de uma ampla região. A ansiedade afeta vários segmentos, pois o desenvolvimento econômico desembarca no aeroporto. A pista foi fechada para obras em11 de janeiro, portanto há quase um ano. Da previsão inicial de reabertura em maio até agora, já foram emitidas sete prorrogações do fechamento. Pista pronta, mas uma sequência de ajustes e trâmites junto aos órgãos federais mantém o Lauro Kortz fora de operações até 31 de janeiro de 2022. Após uma vistoria da ANAC – Agência Nacional de Aviação Civil, a boa notícia é que nas cartas RNAV (procedimentos de aproximação por GPS), já consta a nova numeração das cabeceiras. Então, agora falta uma vistoria do Cindacta II (Segundo Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle de Tráfego Aéreo) e a aferição de equipamentos em voo pelo GEIV - Grupo Especial de Inspeção de Voo. Após essas etapas, se cumpridos todos os requisitos, finalmente a pista estará homologada e reiniciam as operações no Aeroporto de Passo Fundo.
O piloto sumiu
Nos últimos 20 anos, havia um sentimento coletivo pela necessidade de obras, reformas ou ampliações. Para atender a ansiedade da comunidade, o imediatismo político decolou sem pilotos para “ampliar” o Aeroporto Lauro Kortz. Anúncios de verbas, verbas requentadas, promessas, comissões e muita vitrine antecederam um projeto que, em pouco ou quase nada, minimizará as dificuldades operacionais no Aeroporto de Passo Fundo. Enfim, começaram as obras focadas em um novo TPS (terminal de passageiros), imenso pátio de aeronaves e pequenas melhorias operacionais. Não houve ampliação da pista! A expectativa dos pilotos que operam no Lauro Kortz era pela ampliação na largura de 30 para 45 metros. Assim, aumentaria a segurança e evitaria a maioria dos cancelamentos nos voos regulares. Os estudos que definiram prioridades não contaram com o parecer dos aviadores que operam no aeródromo. Resultado: prosseguirão os cancelamentos de voos provocados pelas condições adversas do vento.
Alargamento da pista preterido e terminal de passageiros privilegiado
Se os problemas são velhos conhecidos, por que não foram solucionados ou minimizados no atual conjunto de melhorias? “As prioridades foram definidas em um anteprojeto elaborado em 2014. O projeto das obras foi elaborado de acordo com esse anteprojeto, onde não contempla o alargamento da pista”, explica o diretor-geral do DAP-RS – Departamento Aeroportuário do Estado, engenheiro Leandro Taborda. Na visão dos operadores com quem conversamos (pilotos) o projeto deveria privilegiar o alargamento da pista, que é o principal. E, depois, realizar obras do terminal e pátio que são acessórios.
Novo TPS
No momento, está em obras um novo TPS - terminal de passageiros. “Serão 2.160 m² da nova estação”, informa Taborda. Amplo e moderno, certamente propiciará mais conforto, especialmente quando houver cancelamentos de voos. Isso minimizará um pouco os problemas para os passageiros enquanto aguardarem o ônibus de traslado para Chapecó ou Porto Alegre.
Novo pátio
Em fase final de concretagem, seguem as obras de um amplo pátio de estacionamento. Taborda explica que a área tem “15.500 m² e comportará até quatro aeronaves do porte de um A-319 ou 195 E2 (novo jato da Azul), além de um ATR-72”. Isso representa um grande avanço, pois o atual pátio de aeronaves é muito acanhado, dificultando manobras simultâneas de dois jatos comerciais. A previsão é de que em fevereiro essas melhorias estejam totalmente concluídas.
Os voos cancelados em Passo Fundo
Mesmo sem números atualizados devido à pandemia, sabe-se que o cancelamento dos voos regulares no Lauro Kortz está na faixa de 10%. Isso ocorre por QGO – sigla internacional para aeroporto fechado por mau tempo ou, como no caso de Passo Fundo, em decorrência de nevoeiro. “É mais comum no inverno”, relata a administradora do aeroporto, Clarice Beffart. Já na primavera, verão e outono o vilão é o predominante vento de través, que sopra de 350º, praticamente perpendicular ao eixo da pista. Pelas limitações operacionais, responde pela maioria dos cancelamentos. Isso vale para pousos e também decolagens. “De acordo com o vento, a aeronave permanece em solo parada aguardando por melhores condições para poder decolar”, completa.
Empresas aéreas operam com restrições em Passo Fundo
Com novo PCN a Gol poderá utilizar o Boeing 737-800SFP e a Azul o Embraer E-2
Apesar das incertezas em relação à reabertura do Aeroporto, na Gol a expectativa é pelo reinício das operações em março ou abril com dois voos diários para São Paulo. Na Azul a data de retomada não deverá ficar longe disso. Mesmo com algumas melhorias, como o grooving (ranhuras para escoar a água da chuva), novos PAPIs, aumento do PCN e revestimento do leito, as empresas aéreas devem manter algumas restrições operacionais no Lauro Kortz. Isso começa no comando das aeronaves onde, habitualmente, ocorre um revezamento de comando entre os pilotos. A Azul e a Gol têm a mesma restrição, determinando que as operações de pouso e decolagem em Passo Fundo são exclusivas do comandante. Isso é em decorrência da pista estreita e das adversidades do vento de través. Há, ainda, alerta de “risco aviário” (presença de pássaros).
Vento
As duas empresas têm limitação de vento de través de 15kt (velocidade em nós) com pista seca. Essa restrição é de apenas 5kt com pista molhada. Para essa definição, é utilizado o FMS (flight management system), um gerenciador de voo programado para condições operacionais de cada aeródromo. Numa simulação do equipamento da Azul, na página de landing, foram inseridos dados de uma situação habitual no Lauro Kortz: ventos de 350º com 30kt. Imediatamente o sistema informa que não será possível pousar. Em outro teste, o resultado mostra que se a pista fosse de 45m de largura o limitante passaria a 25kt de través para operação seca e 15kt para molhada.
SFP
Com o PCN (resistência de impacto da pista) ampliado para 42, ainda não será possível a operação de aeronaves de grande porte, os conhecidos wide-body ou cargueiros. Porém, o piso já comportará um Airbus 319 (Latam) e o Embraer 195 E-2 (Azul). Agora, sabe-se que a Gol deve operar com o Boeing 737-800. Para isso, somente utilizará a versão SFP - Short Field Performance, desenvolvida para operação no Santos Dumont, nos voos da ponte aérea. Para isso, dentre outras, conta com mudanças no perfil das asas, através dos spoilers, slats e flaps, encurtando pousos e decolagens.
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Jatos comerciais têm maior dificuldade em pistas estreitas
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Inicialmente, as pessoas pensam que o vento de través afetaria menos um enorme Boeing do que um pequeno monomotor. Mas é exatamente ao contrário, segundo explica o Comandante Naerton Rorato, piloto comercial que por muito tempo operou no Lauro Kortz com média de 200 pousos/ano. “No jato, pelo enflechamento das asas (pontas para trás), a quilha (parte vertical da cauda) tem proporção maior em relação ao leme de direção e, em caso de vento cruzado, menor tolerância”. Isso significa maior dificuldade para manter o eixo da pista.
Altitude
Já sobre os fechamentos do aeroporto pelo nevoeiro, Rorato explica que “pelo ponto de orvalho (quando a água passa de vapor para gotículas) surge a limitação por visibilidade”. Explicou que em locais de menor altitude, como no Aeroclube, a pista fica em torno de 120 metros abaixo da mesma camada que, naquele mesmo instante, está ‘fechando’ o aeroporto. Isso permite concluir que muitos cancelamentos passam pela altitude do Lauro Kortz.
“O homem, o meio e a máquina”
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“Não há mais espaço para as aventuras daquela aviação romântica de antigamente”, afirma o Comandante Mauro Piazza de Freitas. Do alto de suas 30 mil horas de voo, ele carrega experiência nos cockpits da Varig e da Gol, comandando Boeing 727, 737 (cinco versões) e 767, além dos lendários DC-10 e MD-11. “O homem, o meio e a máquina. Nunca podemos fugir disso. E hoje temos a máquina em evolução com muita tecnologia embarcada. O meio com muita segurança, através de órgãos reguladores, e o homem em constante treinamento e aperfeiçoamento”. Assim, justifica as restrições operacionais que estão focadas na segurança. Mauro Piazza também é instrutor de simulador de voo, importante ferramenta na aviação. E um alto investimento, pois uma hora de simulador tem custo na faixa de US$ 800! E é esse aprendizado que será útil no momento de o homem agir. Isso é bom lembrar para não falar bobagens quando um comandante decide não pousar em Passo Fundo. “A decisão é do piloto em comando. Ele vai respeitar as restrições operacionais. Existem limitações técnicas que devem ser obedecidas e um momento para a atitude de decisão. O que estiver fora disso é violação e passível de punição”.