Quem diariamente circula pela Praça Marechal Floriano, centro de Passo Fundo, começou a observar, desde a última quarta-feira (16), a retirada das pedras portuguesas que compõem toda a extensão da praça. Nos próximos dez meses se desenvolve um processo cuidadoso e completamente artesanal de restauração do piso. Uma empresa de Erechim especializada em restauração é responsável pelo projeto, com um profissional vindo de Cuiabá para realizar o restauro. A obra, que também contará com a qualificação dos bancos, monumentos, chafariz e banheiros, será realizada a partir de medidas compensatórias.
Conforme o secretário de Planejamento, Giezi Schneider, a busca por uma empresa especializada em restauração foi um dos processos mais importantes para a obra a fim de manter as características originais do piso. “Nos dedicamos, primeiramente, à busca de uma empresa qualificada em restauro do tipo peculiar de piso que ali encontramos. Assim, chegamos a um fornecedor especializado e que já realizou inúmeros trabalhos similares, inclusive, na capital gaúcha. Vencida essa etapa, trabalhamos na viabilização dos recursos e decidimos pela implementação da obra por meio de medidas compensatórias, sem impactar em custos para o Município”, enfatiza.
O piso português
A história do piso da Praça Marechal Floriano é marcada por um longo processo de execução, se concentrando principalmente no final da década de 30 e metade da década de 40. Desde o desenho da praça, dos caminhos, dos espaços verdes ao próprio desenho de mosaico das pedras portuguesas que compõem o piso, tudo remete ao período de sua solidificação na história de Passo Fundo.
Como explica a Arquiteta e Urbanista e professora do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Passo Fundo (UPF), Greice Rampanelli, não só Passo Fundo, mas muitos municípios do Brasil possuem pavimentos com pedras portuguesas, que são heranças da colonização portuguesa e fortemente presentes nas pavimentações de Portugal, sendo algo característico da cultura e tradição do país. “Uma praça muito importante dentro da cidade, então se opta por utilizar essa pavimentação e de fato, ela é muito especial”, destaca a arquiteta.
Por serem pedras de outro país e muito pouco utilizadas atualmente, existe uma dificuldade no processo de restauração até que a mão-de-obra qualificada e o material adequado sejam encontrados. “Quando fazemos um processo de restauro, o ideal é não substituir por um material que imite aquele original. O ideal é que se utilize exatamente o mesmo material, a mesma técnica construtiva, caso contrário, vamos estar criando um falso histórico e manipulando uma informação original”, explicou Greice, destacando que mesmo que aquele material seja esteticamente semelhante ao original, ele não estará sendo fiel a história da construção da praça, por exemplo.
Quando se trata da mão-de-obra, o responsável por esse trabalho se denomina calceteiro e a arquiteta Greice destaca a importância do trabalho ser realizado por alguém especializada para que seja mantida a verdadeira essência do objeto restaurado. “São muitos, milhares de pedacinhos de pedra, que são cortados e vão sendo encaixados. Então é um trabalho manual, muito detalhado, para se criar esse mosaico”, esclareceu. Isso justifica o período de aproximadamente dez meses estipulado pela Prefeitura de Passo Fundo para o término da restauração.
A preservação do patrimônio
A preservação dos patrimônios culturais materiais e imateriais mantém a memória e a identidade do município viva, o que torna a Praça Marechal Floriano mais do que um espaço de circulação da população e sim a história sendo representada de forma concreta, de modo a conectar as pessoas com o passado. “Nós estamos aqui no presente e o que nos conecta, da forma mais imediata com o passado, é o material, o concreto. São os edifícios, as ruas, as praças e a conexão entre todos esses elementos. Tudo isso que conforma uma paisagem urbana”, esclarece Greice.
Por mais que não seja percebido conscientemente, todos esses elementos promovem influência sobre o indivíduo. “É uma conexão física e subjetiva”, acrescenta. Isso acaba por manter viva a identidade de qualquer população, por isso a importância da preservação do patrimônio, de modo a promover a reflexão de por que a sua cidade é daquela forma e por que ele tem determinados costumes vivendo ali. “É para as pessoas saberem de onde vieram, por que estão nessa situação e conseguir prever e entender para onde querem ir”, destacou a arquiteta.
Praça Marechal Floriano
A Praça de Cuia e a Catedral fazem parte do imaginário do centro passo-fundense, no entanto, antes da chegada da ferrovia ao município, o centro se localizava nas proximidades do bairro Boqueirão, onde está a Praça da Mãe Preta. O crescimento da cidade se expandia sentido Boqueirão a Petrópolis, mas no final do século XIX e início do século XX, com a chegada da ferrovia, o crescimento urbano se deslocou e começou a se desenvolver no eixo onde hoje é a Rua General Neto.
É nesse contexto que a Praça Marechal Floriano se desenvolve nas duas primeiras décadas do século XX, em um longo processo de construção até a sua finalização, Enquanto isso, a Catedral também tomava forma no local onde havia a Igreja Matriz do município. “Primeiro se cria a praça em frente a antiga Igreja Matriz, e ali, com a construção da praça e a presença da ferrovia, começa a se movimentar o espaço urbano. Então o centro da cidade se desloca, justamente pros arredores da praça”, explica Greice Rampanelli. Nesse sentido, a linha férrea se torna muito importante para uma nova centralidade urbana e o surgimento da Praça da Cuia, representando esse momento de otimismo e crescimento urbano de Passo Fundo.