O Ginásio Capinguí está despencando e parte do telhado caiu na terça-feira. Não foi uma tragédia, pois a área está interditada faz três anos. A grande vítima é a história de Passo Fundo e de todos que ali viveram momentos importantes em suas vidas. Desde o início de suas obras, nos anos 1960, o Ginásio Capinguí foi um superlativo da grandiosidade, representou o orgulho de ser passo-fundense no esporte e em grandes espetáculos. Agora, as arquibancadas não sustentam mais o aplauso do público e dão lugar às despedaçadas folhas de Brasilit. Parafraseando os versos de Adoniran Barbosa, cada folha caída é uma dor no coração de quem por ali passou. Tristeza maior ao saber que, de acordo com o presidente do Clube Náutico Capinguí, Clademir Poletto, o icônico local não será recuperado e logo a estrutura será demolida. E, assim, também desapareceria da ladeira da General Osório e sumiria da nossa paisagem.
Um fio de esperança
Se o enorme ginásio está por um fio, ainda há um fio de esperança pela sua recuperação e a preservação de um local icônico. Nas próximas horas haverá assembleias dos conselhos deliberativo e fiscal, quando a proposta de demolição do prédio será avaliada. A demolição e/ou venda da área, principal patrimônio do CNC, depende do crivo dos conselheiros do clube. Historicamente, o Capinguí forma uma grande família que convive na área junto à Barragem do Capinguí. São aqueles que se autodenominam ‘capinguistas’. Dentre esses, é forte a corrente pela recuperação do ginásio. Um capinguista, que prefere não ser citado, afirmou haver “um grupo que não concorda com a demolição e a venda da área, especialmente os sócios da cidade de Passo Fundo”. Completou dizendo que “existe a possibilidade de recuperar”, enfatizando a importância histórica do ginásio.
Quadra esportiva
Inaugurado em 1976, o Ginásio do Capinguí veio na sequência da grande conquista passo-fundense no futebol de salão, hoje futsal. Foi quando, em 1964, o time do CNC foi campeão estadual. O nome Capinguí ainda rebombava nas quadras gaúchas pela conquista quando, na inauguração, o seu ginásio recebeu a Seleção Brasileira, em 29 de outubro de 1976, que venceu o time da casa por 5 a 1. O Clube Náutico Capinguí deixou as quadras, mas cedeu a sua quadra para os representantes de Passo Fundo. Já pelo futsal, de 1996 a 2005 a UPF/AABB/Semeato teve época de ouro no piso do ginásio. Depois, em 2015, novo fôlego para a modalidade com o Passo Fundo Futsal, que atuou no piso do Capinguí até a interdição da praça. Além disso, é claro, atletas de todas as idades e em todas as épocas por ali correram, levantaram, chutaram ou cortaram uma bola de futsal ou vôlei. E todos têm lindas histórias sobre o Capinguí.
Raul Seixas e VW Passat
Um local amplo também tem amplitude no acolhimento da sociedade. Nessa condição, o ginásio foi palco para concursos de beleza e desfiles de moda. Além das misses, também foi passarela musical. O radialista Walter Filho, hoje em Florianópolis, lembra de alguns espetáculos. “Em 1974, a Rádio Planalto comemorou seus cinco anos com show de Benito di Paula. Eu promovi o show da Perla em agosto de 1978”. E não foi apenas isso, pois o ginásio abrigava os grandes acontecimentos de Passo Fundo na década de 1970. “Teve um show do Roberto Leal, português que fazia muito sucesso. Lembro que em 1974 estive no Capinguí para uma grande festa, que foi no lançamento de um carro, o Passat da Volkswagen”, completou Waltinho. Há até quem diga que foi no Capinguí, numa apresentação em 1977, que a mosca caiu na sopa de Raul Seixas.
Bandas e lutas
Se hoje o ginásio está quase a nocaute, já foi palco para muitos beijarem a lona. Além do modismo do telecatch, teve luta-livre ou boxe em ringues no meio da quadra para lutas de famosos. E, ainda, de alguns aventureiros que invariavelmente apanhavam. E foi pelas bandas da General Osório que muitas bandas conhecidas desfilaram. A lista é incompleta, mas rolou Roupa Nova, Paralamas, Titãs e Ultraje a Rigor. “O RPM, que na época estava no auge, foi um dos maiores públicos, com filas enormes de duas quadras”, lembra nosso editor, Gerson Lopes. E não foi só isso. O espetáculo prosseguiu com Zé Ramalho, Marina, Lobão...
Remando
Se o ginásio abrigou muitas modalidades, o foco inicial do Clube Náutico Capinguí é o esporte náutico, como está no próprio nome. A sede campestre, junto à Barragem do Capinguí, é utilizada em forma de comodato. Assim, o principal patrimônio do clube é o ginásio no centro da cidade. Mas, no coração dos capinguistas, o maior patrimônio é a história do clube que também passa pela história do icônico ginásio. E, obviamente, a sua importância na vida passo-fundense. Das lembranças à grandiosidade, o Ginásio do Capinguí é um pedaço especial de Passo Fundo que, nos últimos anos, vem remando contra a maré do abandono.