Foi no século XIII que uma das mais antigas formas de caracterização do Natal surgiu. De origem cristã, o primeiro presépio foi feito por São Francisco de Assis, na Itália, quando ele e alguns pastores locais representaram a cena bíblica em uma gruta. Com o tempo, a tradição se espalhou, primeiro por igrejas, mosteiros e catedrais da Europa, durante a Idade Média, e em seguida, já no século XVIII, em casas populares. Aos poucos, decorar a casa com presépios se tornou um hábito que marcava a espera da noite de Natal e ao longo dos anos e com a facilidade de comunicação entre diferentes culturas, novos elementos foram sendo incorporados à decoração de Natal, entre eles árvores, estrelas e velas.
Apesar de tradição, no caminho muita coisa se perdeu. A correria e a vida atribulada de hoje fizeram com que o tempo para dar atenção a esses pequenos detalhes ficasse reduzido e não raramente, vemos pessoas optando pela praticidade de não enfeitar a casa nessa época.
Para a professora de Artes Visuais, Mariane Loch Sbeghen, quando falamos em Natal, falamos em preparação e é justamente essa preparação que deveria ser resgatada. Segundo ela, o Natal é realmente interessante quando se trabalha essa questão, quando, por exemplo, se permite que as crianças participem e construam junto com a família. “Uma árvore de Natal, por exemplo, é união. Ela tem todo um resgate de coisas, é construída a partir de uma história familiar - a bolinha que se comprou em tal ano, as coisas que as crianças fazem na escola. Muitos pais acabam até descartando e na verdade eles tinham que ir adicionando à árvore, conforme o tempo vai passando. É um saudosismo? Não, é uma construção da família”, explica Mariane. Ainda de acordo com a professora, Natal é sinônimo de família: “presépio é família. A gente janta junto para reunir a família, a própria troca de presentes é uma coisa de família, tem amigo secreto, mas é entre amigos, uma forma de família”. Para ela, é esse regate que o ato de enfeitar a casa permite. “Acho que é um momento em que daria para sensibilizar mais as pessoas. O Natal se presta para isso. Cada um tem um olhar, mas o importante é ter esse olhar. Ter a sensibilização que traz essa motivação de fazer, de unir, acho que só em querer reunir várias pessoas e fazer uma troca, até de presentes, já acho bom, porque isso humaniza”, destaca.
Natal comunitário
Quem ainda mantém a tradição de decorar a casa o faz porque aprendeu com os pais ou para agradar as crianças. No caso da aposentada Zilda de Jesus Pereira, quando ela fala em crianças quer dizer todas as que passam em frente à residência na Vila Annes. Há mais de 20 anos, dona Zilda decora a frente da casa e faz a alegria de quem passa por lá. Ela conta que no começo fez em função dos filhos, e como a casa tem um pátio grande, se dedicou a decorar o jardim todo. Primeiro veio o Papai Noel sentado na cadeira e a cada ano a decoração ganhava algo a mais. Hoje, dona Zilda tem um Papai e uma Mamãe Noel grandes que ela mesma fez, um presépio, centenas de luzinhas e a novidade do ano: um arco de madeira cercado de luzes de Natal que ela garante que deu trabalho, mas saiu. Para ela, a decoração chegou em um ponto em que ela se sente comprometida com as pessoas, afinal, o cuidado com que enfeita o jardim fez dele atração turística na Vila. “As pessoas, crianças, idosos passam e ficam olhando. Vem gente lá do centro pra ver. Quando chega o final do ano aqui é um tumulto”, comenta a aposentada.
Ela mesma garante que várias vezes pensou em não fazer, afinal, dá um serviço imenso montar e desmontar tudo, mas ela sempre acaba fazendo. “É uma data de alegria, todo mundo passa o ano atribulado, correndo, cheio de coisa, porque quem disser que não tem problema mente e chega no final do ano, poder celebrar o nascimento de Jesus, é uma época de alegria, tem que alegrar a casa também, os olhos, o espírito”, justifica. Para dona Zilda, apesar de dar trabalho, ainda vale a pena. “As pessoas passam, param, olham, tiram fotos, as crianças descem dos carros gritando, os adultos mesmo passam gritando, espantados. Teve até um senhor que dava oi para o Papai Noel porque achava que tinha gente ali”, comenta. Além de ser uma atração para quem passa, é uma terapia para dona Zilda se manter ocupada: “Eu já estou velha e aposentada, vou fazer o quê? Tem que achar uma coisa, assim a cabeça da gente continua funcionando”, brinca.
“Natal pede pinheirinho”
Ao contrário de dona Zilda, Soeli Ferrari não tem mais crianças em casa. Os filhos já cresceram, mas isso não impediu que dedicasse um pouco do seu tempo para decorar a casa. A secretária conta que, quando era criança, no Natal sempre tinha um pinheirinho natural ou, quando não tinha, uma árvore de eucalipto era enfeitada com aquelas bolinhas antigas de vidro que, segundo ela, sempre acabavam quebrando. “O algodão que era neve, as estrelinhas eram feitas com papel de bala, o sino feito com esfregão de aço, mas sempre teve decoração de Natal”, lembra. Soeli conta que gosta de decorar porque acha bonito e que Natal pede pinheirinho. “Quando meus filhos eram pequenos eles escreviam cartinha para o Papai Noel e deixavam um pratinho com pastinho para as renas, sempre achei isso bonito. Quando eu era pequena eu e meus irmãos também colocávamos na janela grãos de milho para os 'burrinhos' do Papai Noel”, comenta. Para ela, é bom ver como a casa fica no clima de Natal, além de considerar uma terapia tirar um tempo para montar o pinheiro e enfeitar a casa que todo ano acaba ganhando algo a mais. “De alguma forma ela mantém a lembrança do Natal e reacende alguns dos significados dele. E é sempre bom ter momentos para relembrar a importância da presença e da união da família que acaba por muitas vezes se perdendo no cotidiano”, ressalta.