Não compre um produto, compre uma história!

Campanha incentiva consumidores a comprar, neste final de ano, produtos feitos com todo amor e carinho por artesãs de Passo Fundo

Por
· 8 min de leitura
Campanha pretende mostrar que por trás de um produto, há sempre um ser humano carregado de históriaCampanha pretende mostrar que por trás de um produto, há sempre um ser humano carregado de história
Campanha pretende mostrar que por trás de um produto, há sempre um ser humano carregado de história
Você prefere ouvir essa matéria?
A- A+

Uma campanha que está sendo divulgada nas redes sociais chama a atenção do consumidor para uma outra forma de relação econômica, fora dos padrões da sociedade capitalista, e que tem tudo a ver com a época de Natal. O slogan da campanha é: “Nas festividades de final de ano: Não compre um produto, compre uma história!”. A frase foi criada para incentivar a economia solidária, que é um consumo baseado na democracia e na cooperação, sem chefe ou empregados, onde todos os integrantes do empreendimento são os proprietários e trabalhadores do negócio. Os protagonistas desta campanha são mulheres artesãs, que confeccionam os produtos com suas próprias mãos. A ação inovadora pretende mostrar que por trás de um produto, há sempre um ser humano carregado de história.

O projeto “Extensão universitária e trabalho decente: assessoria em economia solidária no município de Passo Fundo”, ligado à Vice-Reitoria de Extensão e Assuntos Comunitários da Universidade de Passo Fundo (VREAC/UPF), é o grande responsável por criar esta campanha, juntamente com outros projetos de extensão na área de marketing e comunicação social, que elaboraram o slogan. O projeto de extensão assessora empreendimentos de economia solidária a se desenvolverem e a formarem uma cooperativa.

A primeira experiência de incubação do projeto iniciou em 2015, com a Associação Gaúcha de Artesãos e Artistas Plásticos de Passo Fundo, composta por nove integrantes. E a partir desta iniciativa surgiu a campanha que incentiva a compra de produtos da economia solidária. “A campanha iniciou em dezembro e abrange algumas peças publicitárias nas redes sociais com slogan, fotos das artesãs e dos produtos, e a história dessas artesãs. Por trás da fabricação do produto, tem um ser humano com uma história. Para essas artesãs, esta relação econômica não é apenas de vender o produto, elas enxergam neste item, a sua própria história. Queremos que o consumidor perceba isso”, revelou o coordenador do projeto de extensão, professor Ivan Dourado, que é professor de Sociologia da UPF.

A campanha aumentou a visibilidade destas artesãs e, consequentemente, a demanda de trabalho. Além disso, a ação e a parceria com o projeto de extensão da Universidade valoriza a atividade proporcionando autonomia profissional e financeira para estas mulheres. “O sucesso desta campanha mostra que é possível sonhar com a construção autônoma e solidária do próprio negócio. Esta experiência que as artesãs estão vivendo por meio do projeto de extensão mostra que é possível viver do artesanato de forma profissional. São mulheres que estão gerindo seu próprio espaço de trabalho e conseguindo viver disso”, ressaltou Dourado.

“Preparar e classificar as sementes, as folhas, os galhos de poda e os grãos, e ver nascer sempre uma nova ideia, não tem preço”
Claudette Lourdes Stugiski de Mattos, que lida com artesanato há dez anos, encontrou na natureza a matéria-prima para a confecção dos seus produtos de artesanato. Além das sementes, a artesã utiliza grãos, folhas, conchas, galhos de poda, abóbora, diferentes tipos de feijão, grão-de-bico, olho de cabra, café, canela, anis estrelado, entre outros materiais. “Os produtos que eu confecciono são topiarias (árvores e bolas para decoração), imã de geladeira, mandalas, potes da fartura e fortuna, guirlandas da fartura e prosperidade através das energias da natureza”, revelou a artesã.

O desejo da artesã é que as pessoas se apaixonem pelas peças. “Preparar e classificar as sementes, as folhas, os galhos de poda e os grãos, e ver nascer sempre uma nova ideia, não tem preço. Colar grão por grão, dar o acabamento, e imaginar quem vai se apaixonar perante aquela Topiaria. Tudo isso está inserido dentro da campanha ‘Não compre um produto, compre uma história’”, destacou.

A profissão de artesã exige muita dedicação. “O artesanato é minha profissão e um complemento da renda familiar. O período em que não há muitos eventos, trabalho, em média, quatro horas diárias, mas na época de feiras e exposições, trabalho de oito à dez horas diárias”, salientou.
A campanha realizada pelo projeto de extensão em economia solidária impulsionou as vendas neste período de festas de final de ano. “Não imaginávamos o sucesso que seria esta campanha. Nossas vendas estão sendo muito boas para a época, mesmo que estejamos em uma recessão no país”, observou Claudette.

As pessoas podem entrar em contato com a artesã pelos números (54) 3045-2261 ou (54) 9153-2518, pelo e-mail [email protected] ou ainda pelo Facebook.

“A necessidade foi a primeira justificativa para começar a fazer artesanato. Entrei em contato com grupos de apoio e percebi que o artesanato gerava renda e que poderia viver dele”
A artesã Sandra dos Santos Gonçalves aprendeu a transformar lixo em peças de artesanato. O envolvimento com o artesanato começou há cerca de dez anos, mas nos últimos cinco essa atividade ganhou força. “A necessidade financeira foi a primeira justificativa para começar a fazer artesanato. Entrei em contato com grupos de apoio e percebi que o artesanato gerava renda e que poderia viver dele, principalmente por ser sustentável. Nos tornamos microempreendedores dentro da economia solidária. Como grupo, trabalhamos juntos, arrecadamos materiais juntos”, revelou a artesã.

Sandra faz decoupagem em MDF através da técnica da arte francesa, que sobrepõe camadas de gravuras, e a arte 3D. Todo o trabalho é baseado na prática da economia solidária, respeitando a natureza e o ser humano. O valor das peças é a partir de R$ 15,00. “A economia solidária visa trabalhar e comercializar o produto, mas sem prejudicar a natureza. É ter renda, mas respeitar o outro o ser humano e o meio ambiente”, explicou.

Materiais recicláveis tornaram-se matéria-prima para o artesanato de Sandra. “A garrafa pet e bonecas velhas, que as pessoas jogam na natureza, utilizo para fazer bonecas novas. Outro material que utilizo é o MDF. Os retalhos desse material, que sobram nas empresas e marcenarias que fazem móveis sob medida, reaproveito para fazer quadros, porta-panelas, entre outros produtos de decoração”, salientou Sandra.

O artesanato sustentável, além de ser um aprendizado e fonte de renda, é um exemplo para preservar o meio ambiente. “Esse trabalho faz com que meus filhos percebam a importância da natureza, o desenvolvimento sustentável e o respeito com o ser humano”, declarou.

Os interessados em conhecer o trabalho da artesã devem entrar em contato pelos números (54) 9965-0321, (54) 9176-2546 ou (54) 9947-3996. As peças também podem ser levadas na casa dos clientes sem compromisso.

“Quando confeccionamos uma peça de artesanato, colocamos, além da mão de obra, um tempo da nossa vida. Fazemos tudo isso com muito amor”
O artesanato mudou a vida de Delanir Lourenço, que é uma das artesãs que protagoniza a campanha. O trabalho manual com retalhos, também conhecida como patchwork, começou apenas como forma de presentear os amigos e conhecidos. “Era mãe de família e quando tentei voltar a trabalhar fora, percebi que minha idade já não dava mais. Na época fazia artesanato para dar como presente, mas percebi que ele também poderia complementar a renda familiar”, lembrou a artesã.

Nos últimos 15 anos, o artesanato tornou-se a principal fonte de renda de Delanir. “O artesanato é uma realização pessoal. Eu não tinha renda e dependia da renda do meu marido. Hoje tenho independência financeira e ajudo nas despesas da casa. Para as artesãs da associação, o artesanato não é uma forma de ocupar o tempo, é uma profissão”, destacou Delanir.

As peças produzidas pela artesã além de serem formadas em geral por tecido, costura e cola, recebem também um toque de carinho. “Quando confeccionamos uma peça de artesanato, colocamos, além da mão de obra, um tempo da nossa vida. Fazemos tudo isso com muito amor. Quando você vende o produto, é como se fosse um 'filho' que você está entregando para o cliente. É uma grande satisfação”, declarou a artesã.
A artesã confecciona jogos para banheiro e cozinha, capas para garrafas térmicas e bombonas de água, puxa-saco, pesos para portas, lixeiras para carro, e, ainda, reaproveita os filtros de café para revestir garrafas, capas de cadernos e agendas, e fazer objetos decorativos. Os interessados em adquirir os produtos de Delanir podem entrar em contato através dos números (54) 8408-5220 ou (54) 3315-6617.

Economia solidária
A economia solidária é um movimento que luta por um desenvolvimento a partir dos valores da solidariedade, da democracia, da cooperação, da preservação ambiental e dos direitos humanos. “A lógica da economia capitalista é a competição, a meritocracia, a individualidade, a estrutura de poder. Já uma economia baseada na solidariedade atua dentro de valores. Não existe chefe, existe um coletivo de trabalhadores. Não existe salário, existe ganhos econômicos compartilhados pela quantidade de trabalho realizado. Não existe disputa, existe fortalecimento em rede”, explicou o coordenador do projeto de extensão e professor de Sociologia da UPF.

Este tipo de economia propicia uma nova maneira de consumir. “Não podemos esquecer que a economia solidária não vive numa bolha, ela vive numa sociedade capitalista. E como toda tentativa de modificar a lógica atual, ela vive contradições. É importante frisar que esta associação de artesãos que protagoniza a campanha está lutando para construção de uma identidade solidária, coletiva e democrática. Não significa que ela tem esta identidade, mas que ela tem disposição para isso”, observou o professor.

Na economia solidária não existe patrão nem empregados, pois todos os integrantes do empreendimento (associação, cooperativa ou grupo) são ao mesmo tempo trabalhadores e donos do negócio. Para a artesã Claudette, a economia solidária pode ser definida como um jeito diferente de produzir, vender, comprar e trocar produtos. “Nesta economia ninguém pretende levar vantagem sobre os outros e muito menos gerar riquezas através de destruição da natureza. A base da economia solidária é formada pelas relações de cooperação, pelo fortalecimento do grupo e das comunidades, sem patrão nem empregado, e todos pensando no bem de todos e no seu próprio bem”, ressaltou a artesã.

O projeto de extensão
O projeto “Extensão universitária e trabalho decente: assessoria em economia solidária no município de Passo Fundo” da UPF, que visa auxiliar empreendimentos de economia solidária, realizou em 2013 e 2014 o mapeamento de 40 empreendimentos de economia solidária vinculados a instituições de apoio e fomento, principalmente ao Fórum Regional de Economia Solidária e a Cáritas Arquidiocesana. A partir deste mapeamento, os integrantes do projeto perceberam que estes empreendimentos necessitavam de uma assessoria para se desenvolverem. O projeto de extensão passou a ser um processo de incubação destas cooperativas. Em 2015, foi aberto um edital para recrutar e formar alunos e professores.

A Associação integra o Fórum
A associação é um empreendimento que faz parte do Fórum Regional de Economia Solidária, com Certificação de Empreendimento da Economia Solidária pelo Conselho Estadual de Economia Solidária. O grupo é composto por nove integrantes, no entanto, neste momento, três encontram-se em licença. “É muito importante termos esse assessoramento do projeto de extensão através de uma incubadora. A incubadora da economia solidária funciona como um conjunto de mecanismos (assessoria, suporte técnico, gerencial e formação) que ajudam os pequenos empreendimentos a se organizarem e se fortalecerem para entrar no mercado onde podemos contar com o apoio de professores e estudantes de diversas áreas: economia, administração, ciências sociais, psicologia, direitos, entre outros”, afirmou a artesã Claudette.

Gostou? Compartilhe