É nas terras de Passo Fundo que nascem as águas que abastecem 61% dos municípios de todo o Estado e que são responsáveis diretas pelo desenvolvimento de 302 dos 497 municípios gaúchos. A localidade de Povinho Velho, no interior da cidade, é o berço de cinco das 25 bacias hidrográficas do Rio Grande do Sul: entre Passo Fundo e Mato Castelhano, existe uma área de pequenas nascentes que são formadoras das bacias dos Rios Passo Fundo, Alto Jacuí, Apuaê-Inhandava e Taquarí-Antas. Os pequenos banhados que se desmembram em quatro braços diferentes e seguem caminhos contrários, são reconhecidos como o Berço das Águas. Junto a ele, mais a frente, outra área de nascentes dá início à quinta bacia hidrográfica com berço na cidade: o Rio da Várzea. A área, rica por concentrar não só pequenas nascentes, mas as nascentes-mãe dos rios Passo Fundo e Alto Jacuí, distantes cerca de 900 metros uma da outra, é determinada, a partir do Plano de Bacia elaborado entre 2010 e 2011 no Comitê Rio Passo Fundo, como classe especial e existe a recomendação de criação de Unidades de Conservação de Proteção Integral nestes locais.
Não apenas no Dia Mundial da Água, comemorado nesta terça-feira, 22, mas de forma constante é preciso olhar para a questão dos recursos hídricos: apesar da importância natural da área, o Berço das Águas, segundo o presidente do Comitê Rio Passo Fundo, Claudir Luiz Alves, ainda não é tratado com devida relevância. “É preciso unir os quatro Comitês que compõe as nascentes do Berço das Águas e lutar de forma integrada pela preservação do local”, enfatiza e acrescenta, ainda, que a criação de uma Unidade de Conservação seria, de fato, o ideal para a conservação da área. “A solução é, sim, unir os comitês para trabalhar a região de forma integral. É preciso mostrar a importância daquele espaço para a questão hídrica e econômica do estado”, destaca.
Problemática: cidade que cresce
Ainda que a área seja, segundo o Plano Diretor da Cidade, Zona de Proteção de Manancial Hídrico, um dos problemas enfrentados é o crescimento da cidade em direção ao espaço: grupos ambientais, em especial o Grupo Ecológico Sentinela dos Pampas, já encabeçaram diferentes ações para a preservação do local e impedimento de empreendimentos como a cancha reta para corridas de cavalos na década de 1980, as pistas de Motocross e de jipeiros, o presídio regional, o autódromo internacional nos anos 2000, também uma pista para arrancadão e, mais recentemente, se posicionaram contrários às intervenções no Aeroporto Lauro Kortz que, no entendimento de ambientalistas, poderia levar à intensificação do desenvolvimento no local, prejudicando, assim, a flora e fauna e, ainda, colocando em risco a qualidade dos recursos hídricos da área.
Além das diferentes intervenções que a área sofre, o presidente, que coordena e acompanha o projeto Caminho das Águas, desenvolvido pelo Comitê em parceria com a Corsan e consiste em uma visita guiada pelo Berço das Águas e pelas Estações de Tratamento de Água e Esgoto, coloca, também, a necessidade de proteção da área, tendo em vista que, a cada nova visita, as nascentes se encontram mais desprotegidas. “Se não protegermos, o que pode acontecer? É preciso pensar porque o abastecimento do Rio Grande do Sul depende dessa área”, questiona. Ainda, para ele, é preciso pensar além de eventos comemorativos e, sim, de forma permanente e constante. “A preservação dos espaços como o Berço das Águas é de fundamental importância econômica, ambiental e social em virtude de ser fonte geradora de recursos hídricos que cumprem seus múltiplos usos para uma sociedade sustentável. É preciso agir para estimular a sensibilização e valorização do Berço das Águas não só pela população de Passo Fundo, mas de toda a região", conclui.
Para Fernando Meirelles, Diretor do Departamento de Recursos Hídricos da Secretaria Estadual do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, a questão vai além e passa, essencialmente, pela ação individual das pessoas. “A qualidade da água depende da ação das pessoas. Aqui na região, especificamente, temos problemas e não podemos tapar o sol com a peneira. Temos observado que os eventos hidrológicos estão cada vez mais intensos - enchentes cada vez mais fortes; secas cada vez mais fortes - e isso está diretamente relacionado com as nascentes. Há uma série de ações que podem ser desenvolvidas com os proprietários da área para que, de fato, haja um cuidado maior com esses espaços. É preciso se aproximar mais fortemente dessas pessoas”, orienta.
Comitês de Bacia
A criação dos Comitês de Gerenciamento de Bacia Hidrográfica, no Rio Grande do Sul, obedece a um processo aberto, democrático e participativo. De forma resumida, um comitê de gerenciamento de recursos hídricos é o parlamento das águas de uma região, onde a população e usuários, juntamente com os órgãos do governo, interagem para gerenciar a qualidade e a disponibilidade das águas em uma determinada bacia hidrográfica. É uma entidade deliberativa com atribuições legais baseadas na lei nº 9.433/97 do Governo Federal e pela Legislação Estadual dos Recursos Hídricos, Lei nº 10.350/94. Faz parte do Sistema Estadual de Recursos Hídricos, juntamente com o Conselho de Recursos Hídricos CRH, o Departamento de Recursos Hídricos DRH, a Fundação Estadual de Proteção Ambiental FEPAM e as Agências de Regiões Hidrográficas. A região do Berço das Águas, apesar de estar localizada em Passo Fundo, envolve quatro comitês diferentes: Passo Fundo, Alto Jacui, Taquari-Antas e Apuaê-Inhandava. Juntos, esses comitês representam 242 cidades e pouco mais de dois milhões de habitantes.
Sobre o Dia Mundial da Água
Celebrado mundialmente desde 22 de março de 1993, o Dia Mundial da Água foi recomendado pela ONU durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Eco-92). Desde então as celebrações ao redor do mundo acontecem a partir de um tema anual, definido pela própria Organização, com o intuito de abordar os problemas relacionados aos recursos hídricos. Neste ano, o tema escolhido para celebrar a data é “Água e Empregos: Investir em Água É Investir em Empregos”.