A representatividade política, a vontade geral e a democracia

Licemar Vieira Melo é Jornalista, Mestre em Ciências Sociais Aplicadas

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“Nunca antes na história desse país....”. A expressão peculiar nos discursos do ex-Presidente Lula, parecem apropriadas para se refletir o atual e conturbado cenário político brasileiro. Só para ilustrar temos, simultaneamente: uma Presidenta da República enfraquecida pela perda de apoio político no Congresso Nacional e ameaçada de sofrer um processo de impeachment, um ex-presidente que, por força de ações no judiciário, não consegue assumir o cargo de Ministro-chefe da Casa Civil, um Presidente da Câmara dos Deputados que se defende em um processo por quebra de decoro parlamentar, um Presidente do Senado que será investigado pela suspeita de receber propina em um negócio envolvendo a Petrobrás; e, para finalizar, a divulgação dos nomes de mais de uma centena de representantes políticos, de diversos partidos, como supostos participantes de esquemas de corrupção. Este confuso panorama retoma discussões da área da Ciência Política, entre elas as que se referem à representatividade política e à vontade geral; ambas implícitas no que chamamos de democracia. Em relação à representatividade política, há dois paradigmas. De um lado, o teórico político inglês Thomas Hobbes que, no séc. XVII, já defendera que um Estado é instituído a partir do momento em que uma multidão de homens concorda em se submeter ao poder de uma pessoa ou de uma assembleia, a partir da atribuição dada pela maioria. Nesse sentido, aquele que conquistou o poder de Estado, pelo critério da maioria, será o representante político e, portanto, o soberano. Em outra via, o filósofo suíço Jean Jacques Rousseau, no séc. XVIII, defendeu que o soberano não é o representante político, mas o povo, entendido como vontade geral, pessoa moral, coletiva, livre e corpo político de cidadãos. Nesses últimos dias, os dois paradigmas parecem ter se confrontado: enquanto em Brasília o discurso é o da legitimidade do poder representativo do Estado, conquistada pela maioria dos votos dos brasileiros, nas eleições de 2014, o que é uma verdade; nas ruas de muitas cidades o discurso parece ser o da soberania popular, com cidadãos querendo reivindicar o poder soberano. Há algo de errado nisso? Na prática, convenhamos, ambos os paradigmas tem lá suas fragilidades! Quanto ao pensamento de Hobbes é preciso avançar nas discussões em torno da representatividade política, pois a relação entre representantes e representados deve se manter estreita e não, simplesmente, romperem-se os laços logo após o emudecer das urnas eletrônicas. Já quanto à vontade geral, há outro dilema, pois a vontade geral, conforme o filósofo que a definiu, não se refere a vontade de todos, o que significaria a somatória das vontades individuais, mas a uma moral coletiva, que se sobrepõe às vontades individuais. Por essa via, é preciso considerar que a soberania do povo não pode se restringir a garantia do direito à livre manifestação do pensamento, nos espaços públicos, mas sim, a pressão por novas posturas do Estado – independente de quem o governe - frente as reivindicações expressas nas manifestações coletivas. Mais Hobbes ou mais Rousseau, o que nos aguardam os próximos dias? Simplesmente tudo, menos calmaria....

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