A 12ª Vara Federal de Minas Gerais marcou para o dia 13 de setembro a primeira audiência de conciliação no processo onde o Ministério Público Federal (MPF) estima em R$155 bilhões os prejuízos causados pelo rompimento da barragem do Fundão, no município de Mariana, em novembro do ano passado. A audiência deverá ter participação de representantes da Samarco, de suas acionistas Vale e BHP Billiton, da União e do governo de Minas Gerais.
Por decisão da juíza Rosilene de Souza Ferreira, o governo do Espírito Santo foi excluído do polo passivo, sob a alegação de que o estado não tinha nenhum poder de fiscalização sobre a barragem, localizada em território mineiro.
Também foram excluídos do polo passivo diversos órgãos federais e estaduais indicados como responsáveis pelos promotores federais, entre eles a Agência Nacional de Águas (ANA), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e o Instituto Estadual do Meio Ambiente (Iema-MG). Segundo a juíza, deve haver "um mínimo de nexo causal entre a atividade ou omissão estatal e o dano, não havendo justificativa para a inclusão desta vasta lista de pessoas jurídicas de direito público, o que causará apenas atraso e tumulto no deslinde do feito, que já conta com mais de 11 mil páginas".
A ação do MPF foi ajuizada após os procuradores federais e estaduais se recusarem a participar do acordo firmado entre a Samarco, suas acionistas Vale e BHP Billiton, o governo federal e os governos de Minas Gerais e do Espírito Santo. As estimativas em torno do acordo apontavam para um gasto de R$ 20 bilhões ao longo de aproximadamente 15 anos. Para os procuradores federais, tais valores são bem inferiores à demanda real.
O acordo de R$20 bilhões chegou a ser homologado em maio pelo Tribunal Regional Federal de Brasília, em sessão presidida pela desembargadora Maria do Carmo Cardoso. No entanto, no início deste mês, a desembargadora Diva Malerbi, do Superior Tribunal de Justiça (STJ),suspendeu a homologação por considerá-la um desrespeito a uma decisão anterior do tribunal que definiu a competência da 12ª Vara Federal de Minas Gerais para analisar processos referentes à tragédia de Mariana. Diva também sugeriu a realização de debates mais amplos com cidadãos atingidos, representantes da sociedade civil organizada e membros da comunidade científica.
Responsável pela defesa da União, a Advocacia-Geral da União (AGU) é favorável a uma nova homologação do acordo de R$ 20 bilhões. Em manifestação entregue à juíza Rosilene de Souza Ferreira, a AGU considerou que a medida é a melhor solução para recuperar a bacia do Rio Doce. “A solução negociada, por ser global e holística, considera todas as comunidades, todos os municípios, dá tratamento privilegiado à população afetada e em especial àquelas comunidades onde houve perdas humanas e materiais”, destaca um trecho do texto.
O rompimento da barragem do Fundão deixou 19 pessoas mortas e é considerado a maior tragédia ambiental do país. Houve destruição de vegetação nativa e poluição das águas da bacia do Rio Doce desde Mariana até a foz, quando o rio deságua no mar em Linhares, no litoral norte do Espírito Santo.
Novo dique
Uma das principais divergências entre a Samarco e os promotores estaduais e federais envolve a eficácia das medidas de contenção dos rejeitos da barragem de Fundão. Cinco meses após a tragédia, o Ministério Público de Minas Gerais ajuizou uma ação com base em relatórios que atestavam ainda haver vazamento de lama para a bacia do Rio Doce, fato que a mineradora negava.
No mês passado, os escoamentos também provocaram uma cobrança do Comitê Interfederativo criado para supervisionar o cumprimento do acordo, que agora está suspenso. Para contornar a situação e evitar novos vazamentos, a Samarco pretende construir mais um dique, o S4. A mineradora considera urgente o início da obra para que possa concluí-la antes do período chuvoso. O Ministério Público é contra a medida.
Na opinião dos promotores estaduais, as políticas de segurança adotadas pela mineradora são paliativas e apenas emergenciais. Essa posição foi apresentada à comissão de deputados estaduais que monitora as consequências do desastre. A construção de um novo dique também enfrenta resistência do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), já que implicaria o alagamento de parte de um muro colonial, anexo a uma capela.
Na semana passada, o Ministério Público de Minas Gerais expediu também uma recomendação à Samarco para que submeta à aprovação dos órgãos ambientais estaduais competentes todas as medidas tomadas para controlar os danos à saúde e ao meio ambiente decorrentes do rompimento da barragem. O órgão também recomendou à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável que exerça poder de polícia ambiental e divulgue relatórios na internet semanalmente. Para os promotores responsáveis pela medida, a estratégia de controle de danos não pode ficar entregue à livre escolha ou definição da empresa que causou o desastre.
Projeto de Lei
Também na semana passada, representantes do Ministério Público estadual reuniram-se com o presidente da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), Adalclever Lopes (PMDB). Durante o encontro, promotores entregaram a Lopes um projeto de lei de iniciativa popular cujo objetivo é garantir a efetiva segurança das barragens do estado que concentram rejeitos de mineração.
Construído a partir da campanha "Mar de lama nunca mais", o projeto obteve mais de 50 mil apoiadores, número bem superior ao necessário. Para dar início à tramitação no Legislativo mineiro, eram necessárias 10 mil assinaturas.
Entre as medidas sugeridas na proposta estão a proibição de implantação de novas barragens em áreas de risco para vidas humanas, a obrigatoriedade de auditorias técnicas de segurança e a priorização de ações voltadas para a prevenção e fiscalização.
Agência Brasil