A psicóloga Fernanda Bassani lançou, quinta-feira, em Passo Fundo, o livro, Visita Íntima: sexo,crime e negócios nas prisões. A palestra, realizada no Instituto de Filosofia Padre Berthier, foi a primeira atividade promovida pelo Instituto Libertate. Criada no formato de OSCIP (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público), a entidade surgiu com o objetivo de manter e ampliar o projeto da Banda Liberdade, que trabalha com menores que cumprem ou já cumpriram medida socioeducativa.
Visita Íntima é consequência da dissertação de mestrado defendida pela autora em 2013, no curso de psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Por quase 10 anos, Fernanda pesquisou o sistema carcerário, onde atua como psicóloga. A ideia do trabalho, segundo ela, surgiu em 2007, a partir do momento em que passou a dividir o mesmo ônibus, de Porto Alegre até a Penitenciária Estadual de Jacuí, em Charqueadas, com as esposas e companheiras dos detentos, nos dias de visita.
Com o desafio de investigar como se dá 'a relação de amor atrás das grades', ela desconstruiu algumas imagens em relação aos detentos e descobriu a importância que estas mulheres exercem na vida dos presos, cumprindo, inclusive, o papel que deveria ser do Estado. “Uma das imagens é de que ele está isolado lá dentro. Muito pelo contrário, está completamente conectado” afirma.
No mesmo período em que iniciou o curso de mestrado, em 2011, a autora foi transferida e seguiu com a pesquisa no Presídio Central, considerado o maior da América Latina, com cerca de 4,6 mil presos.
Fernanda chama a atenção para o fato de que o Estado regulamentou a visita íntima em 1999, no entanto, não criou um espaço específico para estes encontros. “Os próprios presos assumiram esta função. São eles que fazem todo o controle, inclusive com distribuição de fichas. As visitas acontecem nas próprias galerias, atrás de cobertores utilizados como cortinas. O respeito ao momento íntimo é uma regra rígida que não pode ser quebrada em hipótese alguma” revela.
A pesquisa apurou que, a partir do sexo regulamentado e reconhecido pelo Estado, aumentou consideravelmente o número de visitas. Muitos destes relacionamentos tiveram início dentro do próprio presídio. “Houve muita relação a partir de indicação da familiares, colegas de cela e amigos. Fomentou o comércio do sexo”.
Conforme a autora, as mulheres são as verdadeiras 'cuidadoras' dos presos. “Todo o o sustento deles é provido por elas. Trazem cigarro, comida, material de higiene, dinheiro, colchão, informação, afeto, providenciam advogado. “Na verdade, a visita tornou-se a efetivação dos direitos dos presos. Se arriscam, se colocam em situação de vulnerabilidade para cumprirem este papel”, relata.
Não por acaso, diz a pesquisadora, o dia de visita é o momento mais aguardado para quem está atrás das grades. Na véspera, os presos realizam faxina geral nas galerias, produzem lanches e organizam exposições dos artesanatos. “Estas mulheres são responsáveis por colocar uma rede de comércio em funcionamento dentro dos presídios.
Sobre a entrada de drogas, celulares e outros objetos para dentro dos muros dos presídios, Fernanda afirma que as companheiras tornaram-se bode expiatório desta prática. Um levantamento, segundo ela, apurou que 50% da droga apreendida no Central vinha de arremessos do lado externo, 25% encontrada nas salas de visitas, e o restante em outras situações. Na opinião da autora, o preso deveria ser punido por receber o objeto da visita. “O ideal seria o detento receber a visita íntima em uma sala destinada para isso. Antes de retornar para a galeria, ele ser revistado, não a visita. A mulher, na maioria das vezes, está sendo chantageada e pressionada para cumprir este papel” argumenta.