As conhecidas 'paradas alternativas', em municípios menores, das viagens de ônibus interestaduais estão mais restritas. Isso por que a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) emitiu uma autorização às empresas de transporte coletivo concedendo operação exclusiva de serviços interestaduais e internacionais. Na prática, a decisão implica diretamente no bolso dos passageiros: quem precisar parar em um município pertencente ao estado de origem terá que pagar passagem até a cidade mais próxima do estado vizinho. É o caso da estudante Letícia Wieczynski, que mora em Passo Fundo há três anos e visita sua família na terra natal, Erval Grande, extremo norte do RS. A única linha direta até lá é a que faz o percurso Passo Fundo – Pato Branco. Se antes o preço da passagem variava entre os R$ 22, agora pode chegar a R$ 36: para parar em Erval Grande, só se pagar passagem até Chapecó. “Em mais de três anos utilizo o ônibus todos os finais de semana. Ou melhor, utilizava, por que agora o valor da passagem está um absurdo”, contou ela. O jeito é buscar caminhos alternativos para fazer o trajeto. “Agora só volto para casa se tiver carona ou uma vez por mês, quando tenho dinheiro suficiente para ir ver minha família”, completa.
A decisão também tem impacto na venda de passagens das empresas franqueadas que operam em Passo Fundo. No caso da Unesul, por exemplo, uma linha precisou ser revista e acabou desativada: os ônibus que faziam a travessa Passo Fundo – Chapecó passam agora a operar pela linha Passo Fundo – Nonoai. “Calculamos que [com a retirada da linha interestadual] o movimento vai cair em torno de 35%. Mesmo assim, ninguém ficou na mão: tiramos uma, mas abrimos outra [linha]”, esclareceu o encarregado da franquia na cidade, Sandro Furhmann. Já a linha Passo Fundo – Pato Branco segue a mesma, sem interrupções. A diferença é o preço da passagem. “A linha continua, mas o pessoal que desembarcaria em Barão e Cotegipe, São Valentim ou Erval Grande, por exemplo, não tem mais opção: ou paga até Chapecó ou vai até Erechim e lá pega um ônibus de linha intermunicipal para terminar o trajeto”, pontua.
De acordo com o Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem (DAER/RS), as tarifas praticadas pelas empresas que atuam no sistema intermunicipal são reajustadas anualmente, com revisão e homologação da Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul (Agergs). “O Daer não foi informado oficialmente sobre estas decisões da Agência. Além disso, nosso sistema conta com a remuneração das estações rodoviárias na tarifa (11% sobre o bilhete), no caso de linhas interestaduais que operem no RS”, destacou.
O que diz a ANTT
De acordo com o órgão público, ainda antes da Constituição Federal de 1988 era possível que, mesmo de linha interestadual, um veículo de transporte coletivo deixasse passageiros em seções municipais do mesmo estado. A questão – autorizada pela União – recebeu outorgas, que vigoraram até 30 de novembro do ano passado. Com o fim da vigência dessas outorgas, a ANTT autorizou as empresas que respeitassem as normas estabelecidas pela nova Constituição. Desta forma, a operação dos ônibus interestaduais seria exclusivamente essa: transportar passageiros para outros estados, basicamente. “De acordo com a nossa Constituição, não é competência da ANTT dar autorização para operação de transporte intermunicipal, nem definir tarifas para tal transporte”, definiu a instituição em nota. De acordo com ela, a competência para questões intermunicipais é de cada um dos estados da federação.
Neste contexto, a ANTT frisou que a forma de cobrança de suas tarifas é proporcional à extensão percorrida e, mais que isso, se limita exclusivamente ao transporte interestadual e internacional – que estão no âmbito das competências da agência. Por isso, caso algum passageiro queira utilizar o transporte interestadual para um deslocamento dentro de um mesmo estado, ele terá que pagar a tarifa correspondente a seção interestadual que englobe o transporte intermunicipal. “Vale destacar que a ANTT comunicou aos estados que os serviços intermunicipais não seriam mais regulados por ela e que seria possível operar esses serviços em linhas interestaduais desde que o estado, por meio do seu órgão regulador responsável pela outorga do serviço intermunicipal, delegasse à empresa a operação dessas seções e estabelecesse a tarifa para esses serviços”, termina a nota.
Linhas afetadas
As linhas mais afetadas são, de fato, as relacionadas à empresa Unesul. Pouco se manifestará sobre a empresa Reunidas. De acordo com o encarregado da agência em Passo Fundo, André Rugini, as passagens interestaduais da empresa sempre foram vendidas para localidades exteriores ao estado. As linhas Possadas – Florianópolis; Santa Rosa – Joinville e Santo Ângelo – Barreiras, portanto, não serão afetadas com a decisão. Também procurada, a reportagem não conseguiu contato com a empresa Pluma sobre a questão. No total, a Rodoviária de Passo Fundo conta com mais de 60 linhas exclusivamente intermunicipais.