Hospitais da região deixarão de realizar partos pelo SUS

Devido à regionalização, somente sete hospitais localizados na região de abrangência da 6ª Coordenadoria de Saúde poderão receber pacientes para parto pelo Sistema ?snico de Saúde

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Aprovada no início deste mês, a proposta de regionalização do parto e do nascimento no Rio Grande do Sul deve diminuir significativamente o número de hospitais aptos a realizarem partos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Atualmente, nos 62 municípios de abrangência da 6ª Coordenadoria Regional de Saúde (6ª CRS), 18 hospitais podem realizar partos pelo sistema público. Com a nova medida, somente sete hospitais são considerados adequados para continuarem a oferecer o serviço. Destes, dois estão localizados em Passo Fundo: o Hospital da Cidade e o Hospital São Vicente de Paulo. Os outros cinco são: Hospital Cristo Redentor, em Marau; Hospital São Paulo, em Lagoa Vermelha; Hospital Frei Clemente, em Soledade; Hospital de Caridade, em Carazinho; e Hospital Santo Antônio, em Tapejara.

Aprovada em reunião da Comissão Intergestores Bipartite (CIB) e assinada pelo secretário estadual da Saúde, João Gabbardo dos Reis, a regionalização do parto tem como objetivo qualificar a atenção à saúde da gestante e do recém-nascido. Visa também resolver problemas ligados à falta de estrutura em hospitais localizados em cidades de pequeno porte, com condições inadequadas para parto e falta de médicos obstetras e pediatras plantonistas. O coordenador da 6ª CRS, Vanderlei Ramos do Amaral, explica os critérios previstos na portaria publicada no Diário Oficial da União: “Ela prevê que esses hospitais, que continuarão aptos a realizar partos, ofereçam um estrutura mínima, com equipe formada e presencial, com quatro profissionais disponíveis 24 horas por dia. Um médico obstetra, um médico pediatra, um anestesista e uma enfermeira. Sempre de plantão e não de sobreaviso, como acontece em alguns hospitais”.

Outra exigência para manutenção do serviço é que o hospital realize, no mínimo, 365 partos por ano. A decisão foi motivada pela análise de dados coletados pela Secretaria Estadual da Saúde (SES), que denotam índice elevado de mortes em decorrência de problemas na gravidez. Nos 100 municípios gaúchos que deixarão de realizar partos após a regionalização, foram registrados 6.808 nascimentos em 2016, com 122 óbitos. Esse número é duas vezes maior que o risco de óbitos registrados em hospitais que realizam, pelo menos, um parto por dia. Ainda de acordo com a SES, de 2004 a 2016, 72 municípios gaúchos deixaram de realizar partos em hospitais locais e, com isso, os óbitos infantis caíram de 116 para 35.

Amaral esclarece, ainda, que os hospitais podem optar por manter os partos de forma particular. A medida impede somente a realização de partos pelo SUS. “Pelo Estado, no SUS, as grávidas serão encaminhadas somente para os hospitais referenciais”. Segundo a SES, anualmente, são realizados 140 mil partos no Estado. Sete mil destes partos são realizados em hospitais de pequeno porte e 50% deles por convênio. Assim, estima-se que cerca de 3,5 mil partos do Sistema Único de Saúde (SUS) sejam transferidos para instituições regionais, o que equivale a nove partos por dia. “Nós ainda iremos avaliar outros hospitais que queiram manter os partos pelo sistema público, para verificar se eles têm as condições exigidas, e aí consideraremos se podemos referenciar mais hospitais além destes sete”. A portaria que estabelece a regionalização dos partos abre a possibilidade de referenciar, também, hospitais em cidades de difícil acesso, desde que tenham, no mínimo, 200 partos registrados em 2016.

Para o assessor técnico da área de Saúde da Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs), Paulo Azeredo Filho, a principal preocupação da instituição diz respeito à ambulancioterapia. “Hoje transportamos mais de 900 mil pacientes por ano para grandes centros para cirurgias e atendimentos especializados. Temos fila de pacientes com espera de até dois anos para atendimento e a demanda nunca é resolvida. Se os hospitais já estão lotados, como você vai colocar uma gestante no risco de deslocamento? Onde está a humanização do atendimento?”. De acordo com ele, a Prefeitura vai ter que desembolsar ainda mais dinheiro para o fornecimento de ambulâncias, além de submeter as grávidas aos riscos encontrados em estradas com falta de estrutura. “As prefeituras aportam, mensalmente, R$ 70 milhões para os hospitais. O Estado não consegue chegar a R$ 60 milhões. Estamos pagando mais do que o Estado e estamos sendo privados”.

Absorção da demanda nos hospitais de Passo Fundo

Para a coordenadora da Maternidade do Hospital da Cidade (HC), Dra. Cely Zimmermann, a superlotação não seria um problema, pois o hospital tem capacidade para absorver o aumento de demanda. No entanto, uma das situações que pode se complicar é a demanda de leitos na UTI Neonatal, que já enfrenta problemas com a Central de Leitos do Estado. Hoje, cerca de 30% dos partos realizados na maternidade são de mulheres vindas de municípios do interior. Com isso, surge outra preocupação, a do deslocamento destas mulheres em trabalho de parto. “Prevemos que possa acontecer das pacientes chegarem aqui com o bebê no colo, e aí, quem as acompanhou? Veio um médico junto? Uma enfermeira obstetra?”, questiona. A tendência é de que as pacientes também comecem a solicitar a realização de cesáreas, ao invés de parto natural, para não correrem os riscos do deslocamento durante o trabalho de parto.

O vice-diretor médico do Hospital São Vicente de Paulo (HSVP), Julio César Stobbe, também acredita na capacidade dos hospitais passo-fundenses em absorver a demanda. “Na verdade, esperamos que o número de encaminhamentos não varie tanto. A ideia é que o Estado fortaleça as microrregionais e que se reserve aos hospitais de alta complexidade, como os referenciais de Passo Fundo, só os casos graves, que já vinham em outros momentos”, explana. Ainda de acordo com o médico, a taxa de natalidade dos nascimentos tem diminuído, consequentemente, há redução no número de atendimentos em maternidades. “Então ocorre que nesses municípios pequenos a quantidade de nascimentos acaba sendo muito reduzida. Fica complicado manter lá um pediatra, um obstetra e um anestesiologista, para ter somente dois ou três nascimentos por mês. A gente entende isso e achamos que, em uma época de escassez de recursos, é uma maneira aceitável de otimizar os recursos existentes, fortalecendo as microrregionais”.

Na Maternidade do HSVP, são realizados, em média, 10 nascimentos por dia. São mais de três mil nascimentos por ano. Em 2016, desde o dia 1 de janeiro até o dia 24 de maio, o HSVP realizou 1.410 nascimentos, sendo 901 de Passo Fundo e 509 de outros municípios. Neste mesmo período, em 2017, foram registrados 1.374 nascimentos. Destes, 919 eram de Passo Fundo e 455 de outros municípios. Os dados se referem a atendimentos tanto por convênios, quanto pelo SUS. “Então a gente percebe uma redução de atendimentos. Isso mostra que, realmente, a taxa de natalidade tem reduzido e uma demanda muito alta, mesmo com a regionalização, não deve ser registrada”, finaliza Stobbe.

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