Nelson Baumgardt não perde um encontro semanal e ainda reclama quando é período de férias. Ele chega de ônibus no campus da UPF e sempre é recebido na parada por alunos bolsistas, que o acompanham até a sala na Faculdade de Artes e Comunicação (FAC). Ali, todas as sextas-feiras, durante uma hora, “Seu Nelson” (como prefere ser chamado) e outros amigos experienciam a arte através dos sentidos, com exceção da visão. Sr. Nelson e os demais integrantes do grupo são deficientes visuais e participam do projeto de extensão Oficina Modos de Ver: Práticas Pedagógicas em Artes Visuais para Deficientes Visuais. O projeto proporciona ao grupo o contato com obras de arte famosas, que podem ser conhecidas através das mãos, ferramentais expressivos e elementos plásticos.
Existente desde 2011, o projeto de extensão é coordenado pela professora Me. Margarida B. Pantaleão e é desenvolvido com o auxílio de dois bolsistas e de muitos voluntários dos cursos de Música, Design Gráfico, Design de Moda e Jornalismo. Os encontros semanais, às sextas-feiras, foram retomados no mês de abril. O espaço utilizado para a experiência fica na sala do curso de Artes e comporta no máximo 15 pessoas. O número de participantes varia de semana para semana e todos são encaminhados pela Associação Passo-Fundense de Cegos (Apace).
A proposta muda a forma de percebermos o mundo, segundo a professora Margarida. A transformação não ocorre somente no grupo de cegos, mas também nos alunos bolsistas, nos voluntários e na coordenação. “O aluno formado pela FAC e que passa pelo projeto de extensão tem outra qualificação no mercado de trabalho”, atesta a coordenadora. Os resultados são mais evidentes entre os deficientes visuais. “Já recebemos pessoas que eram introspectivas e que não se comunicavam, e hoje cantam e têm outra relação com o grupo”, exemplificou.
E como perceber uma obra de arte sem utilizar o sentido da visão? Para não causar expectativas nem frustrações, as obras trabalhadas durante os encontros são sempre surpresa para o grupo. Antes de iniciar o contato com elas, o grupo é provocado por outros sentidos, como a audição, e a imaginação é aguçada a partir da história da obra e da vida do artista e da relação com fatos do cotidiano. Por fim, cópias dessas obras ganham contornos em relevo para que os deficientes visuais possam observá-las por meio do tato. “Levamos obras de arte, esculturas, pinturas, gravuras e desenhos para que eles conheçam essas formas plásticas, e também convidamos artistas da comunidade local ou regional para que possam vir até o espaço da oficina interagir com o grupo”, relata a professora Margarida.
Experiência
O projeto de extensão assumiu a denominação “Oficina modos de ver: práticas pedagógicas em artes visuais para deficientes visuais” depois que a professora Margarida desenvolveu uma oficina com alunas de Artes durante um seminário internacional na Feevale. O resultado foi tão positivo que o projeto ganhou novo nome e passou a integrar também professores, uma vez que são eles que comumente desenvolvem os trabalhos com alunos com deficiência visual.
A primeira experiência de formação foi com um grupo de professores de Carazinho, possibilitada por uma parceria firmada entre a UPF e a Prefeitura. Os encontros foram realizados em 2016, a cada 15 dias, e envolveram profissionais de várias áreas do conhecimento.
Documentado
Os encontros semanais do grupo de deficientes visuais na Faculdade de Artes e Comunicação são registrados em memórias escritas e fotográficas. Ao final de cada ano, os participantes recebem um DVD com fotos e vídeos, produzido na FAC.
Quem pode participar
O público-alvo é um grupo de deficientes visuais vinculados à Associação Passo-Fundense de Cegos (Apace) e se estende a professores da educação básica pública. Os educadores encontram no projeto oportunidade de aprimoramento da discussão e das possibilidades metodológicas de trabalho acerca da inclusão e do acesso a inovações metodológicas desenvolvidas na Faculdade de Artes e Comunicação da UPF.