A ciência que estuda a origem, a natureza e o destino dos espíritos. Assim descreveu Allan Kardec, o precursor da doutrina espírita, em 1859. Desde então, o número de fiéis cresce ano após ano. Na segunda-feira (28), essa filosofia se mostrou forte em Passo Fundo: milhares de pessoas (de acordo com a organização, foram quase cinco mil) lotaramo Centro de Eventos da Universidade de Passo Fundo (UPF) para ouvir um dos maiores médiuns e oradores espíritas da atualidade, Divaldo Franco. A mobilização não é recente na cidade: hoje existem cerca de 15 centros espíritas no município - seis inscritos junto da Federação Espírita Brasileira (FEB), a entidade organizadora de todos os centros do país. Conforme o Censo do IBGE de 2010, quase 345 mil gaúchos se identificam como espíritas.
Uma prova do volume de seguidores é a procura incessante de obras espíritas nas livrarias da cidade. “A sessão espírita é uma que tem um dos espaços mais privilegiados da loja. É a mesma proporção de grandes autores da literatura mundial”, diz o gerente de um estabelecimento do gênero, Elvis Picolotto. “É um público fiel, que compra livro todo mês e volta sempre para buscar mais”, relata. Não por acaso, hoje existem livrarias que investiram só neste segmento. “Se o Brasil é hoje um país com leitores, grande parte é por causa dos espíritas. A média é que cada um leia pelo menos um livro sobre o assunto por mês”, confirmou uma das líderes da doutrina, Maria Nair Almeida. É que, dentro da doutrina, existe muito incentivo para estudar e aprender sobre o assunto. “É mais que uma religião. Estudamos para que todos tenhamos a mesma visão do que o espiritismo realmente é. É um tripé: ciência, filosofia e religião”, completa ela. Há 40 anos, Maria Nair era católica. Um dia, acabou entrando sem querer em um centro. Desde então, participa das reuniões assiduamente e já chegou a ser presidente do CRE.
Ela esclarece que muitas pessoas procuram o espiritismo a partir de uma perda ou grande sofrimento - visão que, muitas vezes, é confundida como uma alternativa de conseguir respostas a partir da mediunidade. Esta visão, no entanto, não compreende a doutrina como um todo. “Não foi o espiritismo que criou o mediunismo. Desde que existe o ser humano na Terra, ele sempre é acompanhado e influenciado pelas interferências entre os dois planos. Nem todo espírita é médium, assim como nem todo médium é espírita”, explicou ela.
O que é ser médium?
Os espíritas entendem a pessoa médium como a ponte entre dois mundos. Em resumo, é aquela que tem o dom natural de se comunicar com os espíritos.
No que um espírita acredita
O movimento, que já completa 160 anos, segue a raiz do cristianismo tradicional, mas inclui vertentes da ciência e da filosofia em sua base de credo. “Interpretamos as leis divinas de uma forma talvez um pouco diferente das religiões tradicionais. Costumamos dizer que acreditamos, sim, em Jesus, mas de uma ótica diferente”, explica o presidente do Conselho Regional Espírita (CRE), Fernando Bicca. Esta ótica, em resumo, se baseia na sobrevivência do espírito após a morte a partir da reencarnação. “Existe uma confusão que muita gente faz quando pensa em espiritismo, que é achar que o aspecto principal é o mediunismo. Não é verdade. A nossa base é o cristianismo, o estudo, a verdade, a prática moral. A atividade mediúnica serviu para fundar as bases da doutrina espírita, mas não é essencial hoje”, completou ele. Além disso, como complementa, a atividade de quem é espírita não segue rituais: é de exercício interior e mudança de atitudes. “Muitas pessoas de outras religiões nos procuram por ter curiosidade em saber. Em muitos pontos, outros segmentos defendem o ‘mistério da fé’. Nós ousamos avançar: não acreditamos em mistérios, mas em incompreensões”, completou ele. Em termos de organização, a Federação possui uma campanha permanente que, conforme seus representantes, é de luta pela vida. De acordo com Maria Nair, o movimento vai contra questões como o aborto, a eutanásia, o suicídio e a pena de morte. Como complemento, defende a valorização da família.