Os membros da Comissão de Direitos Humanos de Passo Fundo (CDHPF) estão sendo investigados pela Polícia Federal. O inquérito policial foi aberto após a CDHPF encaminhar, ao Ministério Público Federal (MPF) de Erechim, uma Notícia de Fato alertando para a possibilidade de conduta irregular dos policiais em um conflito entre indígenas e agricultores. O caso aconteceu em novembro do ano passado, em Sananduva, ocasião em que indígenas atearam fogo em uma lavoura de trigo.
Os militantes da organização foram chamados para prestar depoimento na sede da PF, na manhã desta terça-feira (29). O presidente da Comissão, Paulo César Carbonari, informou que o grupo evocou o direito constitucional de não fazer declaração em virtude de uma situação duvidosa. “O delegado não esclareceu aos nossos advogados qual é a situação: se somos investigados, se somos testemunhas. Para efeito de defesa essa é uma definição muito importante”, frisou Carbonari.
Para a Polícia Federal, a CDHPF não é tratada como investigada. O delegado Eduardo Brun informou que os defensores dos direitos humanos foram chamados para contribuir com o inquérito, assim como os policiais que participaram da operação foram ouvidos. De acordo com ele, o mesmo inquérito foi aberto para apurar possível conduta irregular dos policiais ou possível invenção de fato não verídico. “[A gente] olha no estoque de munição se foi gasto bala e se não foi gasto bala é porque não ouve tiro. Vê se teve bomba. Nada disso aconteceu. Nós apuramos e não encontramos sequer um vestígio de uma arma disparada. Ainda que nós tivéssemos lá bala de borracha e arma de fogo”, afirma, sobre a apuração da conduta policial.
Brun argumenta que o inquérito é apurado de maneira isenta. O delegado também alega que é necessário que os militantes informem a origem da informação que aponta conduta policial irregular para que se possa dar prosseguimento na investigação.
Carbonari se diz surpreso pelo rumo do inquérito e que o papel da organização é relatar, à autoridade responsável, sempre que uma irregularidade for encontrada. “O que nos surpreende é que pela primeira vez, em quase 40 anos de atuação, em vez de receber da autoridade um tratamento da alegação, no sentido de fazer a devida investigação e esclarecer, nós como organização de direitos humanos acabamos sendo investigados por termos reportado, à autoridade pública, uma alegação de irregularidade”, contesta o presidente.
Investigação do MPF
A instauração do inquérito, pela Polícia Federal, ocorreu no dia 15 de dezembro de 2016, de acordo com Carbonari. Cerca de meio mês após a Comissão de Direitos Humanos de Passo Fundo encaminhar, ao Ministério Público Federal (MPF) de Erechim, documentos que reportavam situações que se entendiam como ação inadequada por parte dos policiais. A organização solicitava que o MPF investigasse o caso.
O Ministério Público Federal instaurou um procedimento para apurar o caso. Por meio da assessoria de imprensa, o MPF informou que o caso foi arquivado, pois, no entendimento do procurador responsável, após ouvir as partes, não houve dados suficientes que indicassem a ocorrência de crime. O arquivamento foi realizado com ressalvas, ou seja, caso surja um fato novo que indique a ocorrência de crime, o expediente poderá ser reaberto para retomada da investigação.
Relembre o conflito
Policiais federais e militares prenderam oito índios e três agricultores, durante uma operação realizada na manhã do dia 23 de novembro de 2016, nos municípios de Sananduva e Cacique Doble. Na operação, foram cumpridos 11 mandados de prisão preventiva expedidos pela Justiça Estadual de Sananduva. O grupo era acusado de ameaça e extorsão, com a participação de alguns agricultores. Os policiais apreenderam foices, facas, flechas, um trator e uma plantadeira. Um dos índios acabou preso por porte ilegal de arma. Todos foram encaminhados para a Delegacia da Polícia Federal, em Passo Fundo, e posteriormente recolhidos ao Presídio Regional. A ação contou com a participação de 140 policiais e a utilização de um helicóptero.
O clima já estava tenso desde o dia 20 de novembro, quando um grupo de indígenas havia ateado fogo em cerca de mil hectares de lavouras de trigo, na localidade de Bom Conselho, em Sananduva. O ato teria sido uma resposta à prisão do cacique da tribo, Ireni Franco, ocorrido no dia 19. Ainda na noite de domingo (20), o vice-prefeito em exercício, de Sananduva, Leovir Fidêncio Antunes Benedetti, havia decretado estado de calamidade pública no município. O delegado Eduardo Brun garante que não houve conduta policial irregular durante a operação da manhã do dia 23.