O trabalho para regulamentar o funcionamento de aplicativos de transporte privado e individual - como Uber, Cabify e Garupa, por exemplo - pode ser entendido como uma “experiência positiva” no município de Bento Gonçalves. A cidade foi a primeira a formular e aprovar uma regulamentação para este tipo de serviço na serra gaúcha - passos que tentam ser seguidos por Passo Fundo, que também pretende ter implantação do serviço. Na última quarta-feira (20), o projeto de lei que trata do assunto foi aprovado por unanimidade na Câmara de Vereadores. Ele, agora, vai para a Executivo, onde deverá ser avaliado para sanção ou veto do prefeito.
Em Bento Gonçalves, no entanto, este processo já tomou forma há pelo menos três meses. “Até sancionar a lei, fizemos um trabalho com os taxistas e com os motoristas que queriam operar pelas plataformas”, lembrou o secretário de desenvolvimento econômico da cidade, Silvio Pasin. Segundo ele, a lei municipal passa a valer no próximo dia 1º de janeiro de 2018. A partir daí, os motoristas de plataformas que forem flagrados dirigindo sem cartão de identificação de licença poderá ser multado e ter o carro guinchado. Em Bento Gonçalves, o poder público considerou necessário compreender o que as partes queriam antes de colocar a lei no papel. “Reunimos primeiro os taxistas, depois os motoristas das plataformas e os usuários destes aplicativos. A ideia era entender o que eles queriam e ver se estavam se podíamos chegar a um consenso”, explicou Pasin. O processo de formulação da lei também passou por audiências públicas até que chegasse na apreciação do plenário. Depois de sancionada, em setembro, a matéria ganhou três meses para regulamentação e adaptação entre os profissionais. “Demos 90 dias para que os motoristas se organizassem com o cadastro na Secretaria de Mobilidade Urbana. A partir de janeiro, todos deverão andar com a autorização. Quem não tiver, pode ter o veículo recolhido e vai pagar multa”, explicou o secretário.
Atualmente Bento Gonçalves conta com 86 motoristas cadastrados em serviços de transporte por aplicativos. Para operar na cidade, precisarão pagar uma taxa anual de 6 Unidades de Referência Municipal (URMs), que é igual a R$ 673,38; e o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), com valor fixo de cerca de R$ 50 mensais. “Mesmo com estes valores é muito mais barato do que ter uma placa de táxi. Além disso, você pode trabalhar em qualquer horário e está regularizado. Por lá, o condutor só não pode ficar nos pontos de táxi. Qualquer outro lugar é livre. “Temos aquela movimentação das pessoas mais idosas que estão com o mesmo taxista há 40 anos, e também as pessoas que chegam aqui para visitar, trabalhar ou estudar diariamente. Entendo que os taxistas encararam tudo isso tranquilamente porque fizemos uma conscientização antes do processo começar. Eles viram que alguns aspectos do serviço podia estar defasado e que o aplicativo seria uma alternativa para ampliar o negócio. Não perderam o faturamento: no fim, se reuniram e criaram um aplicativo para eles. Foi ótimo para a cidade, porque criou concorrência e melhorou muito o serviço”, avaliou Pasin.
Passo Fundo em avaliação
Em solo passo-fundense, o projeto do vereador Mateus Wesp (PSDB) também propõe pagamento de impostos para os motoristas que quiserem usufruir de aplicativos. A ideia é parecida com a da cidade da serra gaúcha: fazer com que os condutores também sejam enquadrados como prestadores de serviço e, por isso, devam pagar ISSQN. Além disso, a Taxa de Gerenciamento Operacional (TGO) propõe pagamento mensal de R$ 67 (ou 20 Unidades Fiscais Municipais – UFMs) por veículo cadastrado para atuar na cidade. Em um ano, o condutor com um único veículo cadastrado poderá pagar mais de R$ 800. O projeto propõe que o dinheiro recolhido vá para a Secretaria Municipal de Segurança Pública, que também será a responsável por vistoriar os veículos antes de saírem às ruas. Além disso, para estar legal com o município, o condutor terá que comprovar ter seguro que cubra acidentes de passageiros e danos a terceiros. Para os condutores, mais uma série de exigências: eles deverão possuir Carteira Nacional de Habilitação (CNH) correspondente a categoria do veículo cadastrado e com a observação de exercer atividade remunerada. Outras exigências englobam a apresentação de certidões negativas criminais e comprovação da aprovação em curso de formação que deverá ser definido pela Prefeitura. Além disso, o veículo poderá ser dirigido tanto pelo dono quando por motorista parceiro - inclusive os com registro e emplacamento na categoria aluguel. Também fica liberado o transporte remunerado em motocicletas, após emenda do vereador Roberto Toson (PSD).
E vai dar pé?
Existem outras questões que também impactam na chegada de aplicativos de transporte na cidade. Um exemplo é entender como a implantação de impostos pode afetar neste tipo de serviço online, que tem por costume ser mais barato justamente por estar aquém das tarifas. Questionados, os aplicativos Uber e Cabify preferiram não se pronunciar a respeito. A empresa Uber, no entanto, afirmou que pelo menos 50% dos mais de 500 mil motoristas brasileiros trabalham menos de 10h semanais com o aplicativo, o que mostra que a maioria possui outras atividades e o transporte individual não passa de uma renda extra. A empresa conta com aproximadamente 30 mil motoristas no RS e mais de 17 milhões de usuários. Já o aplicativo Garupa, que já opera na cidade há mais de dois meses, afirmou em nota que possui 1,5 mil usuários e 15 motoristas com veículos cadastrados.
Lei federal
O projeto de lei que tenta regulamentar o transporte remunerado privado individual de passageiros a nível federal (lei nº 12.587/2012) tramita agora na Câmara dos Deputados. O texto propõe que o serviço deverá receber efetiva cobrança de tributos municipais e ainda ressalta a exigência de contratação de seguros contra acidentes a passageiros e a inscrição do motorista como contribuinte do INSS; entre outros pontos. O texto já foi aprovado pelo Senado e seguiu no fim de novembro para avaliação do Congresso.