A imprensa europeia voltou hoje (15) os olhos para o Brasil. O país está nas páginas dos principais jornais. No entanto, o olhar é de perplexidade.
"A onda de violência que sacode o Rio de Janeiro subiu mais um degrau". É assim que começa a matéria do periódico espanhol El País, que noticia a comoção no Brasil pela morte da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ), na noite de quarta-feira (14).
O jornal afirmou ainda que tanto os companheiros de Marielle quanto a polícia não duvidam de que o crime se trata de uma execução. "Inclusive em uma cidade tão acostumada com a violência, como o Rio, o crime provocou uma forte comoção, já que apresentou características inéditas até agora. Apesar de os mortos serem contados diariamente, são na maioria das vezes produto de enfrentamentos entre a polícia ou entre grupos de traficantes que disputam territórios, e que muitas vezes acabam com a vida de vizinhos como vítimas colaterais".
O El País citou ainda declarações como a da ex-presidente Dilma Roussef, que se disse impressionada, estremecida e indignada com a morte prematura de Marielle. Citou ainda a Anistia Internacional, que exigiu do governo investigação rigorosa.
Outro jornal espanhol, o El Mundo, também deu destaque ao crime. Marielle é citada como uma das vozes mais críticas contra a intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro, que ocorre desde meados de fevereiro. O El Mundo também fez referência ao twitter que Marielle publicou um dia antes de ser assassinada, e que soou como uma premonição. Na mensagem, ela pergunta "Quantos mais vão precisar morrer para que essa guerra acabe?"
O inglês The Guardian deu destaque aos protestos que estão sendo organizados em todo o Brasil. "Marielle Franco foi uma política inovadora, que se tornou uma voz para as pessoas desfavorecidas nas pequenas favelas, que são o lar de quase um quarto da população do Rio de Janeiro, onde a pobreza, a brutalidade policial e os tiroteios com traficantes de drogas são rotineiros", afirmou o periódico.
O The Guardian lembrou ainda que Marielle foi a quinta vereadora mais votada nas últimas eleições e afirmou que ela era uma especialista em violência policial. "Recentemente acusou oficiais [policiais] de serem excessivamente agressivos na busca de moradores de favelas controladas pelo tráfico. Membro de um partido esquerdista, Franco também era conhecida por seu trabalho social em favelas. Ela estava em seu primeiro mandato no cargo".
O francês Le Figaro afirmou que "o assassinato de uma vereadora de esquerda suscitou grande comoção no Brasil", onde estão sendo organizados protestos em várias cidades. O jornal ressaltou que Marielle "se opôs à decisão do presidente brasileiro Michel Temer de confiar a segurança do Rio ao Exército para tentar conter a escalada de violência que vem aumentando desde o final das Olimpíadas de 2016".
O jornal português Público informou como o caso do assassinato de Marielle Franco chegou ao Parlamento Europeu, pela voz do eurodeputado português Francisco Assis, do Partido Socialista.
Em nota enviada ao Público, Assis disse que questionou a alta representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros, Federica Mogherini, sobre "como pretende a União Europeia influenciar as autoridades brasileiras para que este chocante assassínio seja investigado até às últimas consequências", e "para que seja garantida a segurança das populações e dos ativistas que pugnam pelos direitos humanos das mesmas".
Em Portugal estão sendo organizados, pelo Facebook, ao menos três eventos em homenagem à Marielle Franco, dois em Lisboa e um no Porto.
O caso
A vereadora pelo Rio de Janeiro Marielle Franco, do PSOL, foi morta a tiros no bairro do Estácio, região central da capital carioca, na noite desta quarta-feira (14). Ela estava dentro de um carro acompanhada de um motorista, que também foi morto, e de uma assessora, quando teria sido abordada por outro veículo.
Marielle voltava de um evento chamado “Jovens negras movendo as estruturas”, na Lapa, quando, de acordo com testemunhas, teve o carro emparelhado por outro veículo, de onde partiram os tiros.
Em nota, a Executiva Nacional do PSOL manifestou pesar pelo assassinato da vereadora e destacou sua atuação política. “A atuação de Marielle como vereadora e ativista dos direitos humanos orgulha toda a militância do PSOL e será honrada na continuidade de sua luta”, diz um trecho. O partido também exigiu apuração “imediata e rigorosa” sobre as circunstâncias do crime.
Há duas semanas, Marielle havia assumido relatoria da Comissão da Câmara de Vereadores do Rio criada para acompanhar a intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro. Ela vinha se posicionando publicamente contra a medida.
A parlamentar também chegou a denunciar, em suas redes sociais, no fim de semana, uma ação de policiais militares na favela do Acari. “O 41º Batalhão da Polícia Militar do Rio de Janeiro está aterrorizando e violentando moradores de Acari. (…) Acontece desde sempre e com a intervenção ficou ainda pior”, escreveu.
A PMERJ confirmou a operação e argumentou que criminosos atiraram contra os policiais e houve confronto. Durante vasculhamento na comunidade, dois homens foram presos e houve apreensão de um fuzil calibre 7,62 mm e oito rádios comunicadores, segundo nota da corporação.