O Dia Mundial da Água é celebrado em 22 de março, mas ainda é preciso avançar em muitos sentidos para que este possa ser um dia de comemoração. Os problemas com quantidade, qualidade e disponibilidade de água podem ser conferidos a todo momento nas redes sociais e meios de comunicação locais, regionais, nacionais e internacionais. Aqui, a situação não é diferente. Enquanto muitos se orgulham de dizer que Passo Fundo é o berço das águas, em função das nascentes de importantes bacias hidrográficas estarem localizadas aqui, ainda falta muito para concretizar um plano para proteger uma das principais delas, a do Rio Passo Fundo, o mesmo que dá nome à cidade.
Iniciado ainda em 2010, o Plano de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do Rio Passo Fundo teve duas, de três etapas, concluídas. A última, e talvez a principal delas, é a etapa que define as ações que garantirão o uso adequado deste recurso tanto para o consumo humano, quanto para a produção agropecuária e mesmo industrial. O plano de bacia é um dos recursos mais importantes no gerenciamento das bacias hidrográficas. É aprovado pelos Comitês, dando-lhes, dessa forma, caráter participativo na sua elaboração. Previstos na legislação nacional e estadual de Recursos Hídricos (Lei Nº 9.433/97 e Lei Nº 10.350/94) é a base do Sistema Nacional de Recursos Hídricos. Tem por finalidade projetar os objetivos da população e dos usuários da água ao longo do tempo, criando formas de preservação e manutenção dos recursos hídricos em quantidade e qualidade.
A realização desse Plano de Bacia segue a seguinte estruturação:
Fase Preparatória - levantamento de dados e formulação do Plano de Trabalho.
Etapa A - fase de diagnóstico, análise do cenário atual para identificar problemas e potencialidades.
Etapa B - fase de prognóstico e enquadramento, a partir do cenário atual são estabelecidos projeções futuras que visam a garantia na qualidade e quantidade dos recursos hídricos.
Etapa C - fase de metas, programas e ações. Consiste na elaboração de estudos que conduzam para a definição das ações necessárias para se atingir os objetivos e metas estabelecidas.
O Comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do Rio Passo Fundo (CBHPF) tem as fases A e B concluídas.
Situação regional
Conforme o presidente do CBHPF Claudir Luiz Alves, as audiências públicas para construção do Plano de Bacia ocorreram, na região, entre os anos de 2010 e 2012. A proposta visava a elaboração e aprovação do diagnóstico e prognóstico (etapas A e B) do Plano de Bacia do Rio Passo Fundo. “Na época, foi aprovado, inclusive, o enquadramento dos corpos hídricos da referida bacia hidrográfica, ou seja, foi definida qual a qualidade e uso das águas na região. O que ficou faltando é a etapa C - os planos de ações – que tem a finalidade de atender aquilo que foi definido nas etapas anteriores. Ou seja: para atender ao referido enquadramento é - ou será necessário - desenvolver ações, a fim de melhorar a qualidade e disponibilidade de água na Bacia Hidrográfica do Rio Passo Fundo”, contextualiza.
O plano existe e está em vigor, porém, ainda é necessário se investir em planos de ações a fim de atender aquilo que está indicado no seu enquadramento. “A grande dificuldade está baseada nas constantes crises, dificuldades e burocracias - impostas pela gestão pública”, pondera Alves. De acordo com ele, mesmo assim, ações que visam a melhoria da qualidade da água estão em desenvolvimento. “Na questão do esgotamento sanitário, por exemplo, houve uma melhora significativa no índice de cobertura, principalmente no município de Passo Fundo – e esta é uma indicação do Plano de Bacia. Mas a concretização do Plano, com a sua etapa C, depende do investimento e liberação de recursos por parte do Governo do Estado”, reitera.
Alves acrescenta que é necessário edital de contratação para elaboração da fase C, ou planos de ações, que definirá as prioridades e metas a serem atingidas. “Existe na peça orçamentária do ano de 2018 a destinação de R$ 800 mil para este fim, portanto em o Estado liberando este valor será possível a contratação da fase C. Caso contrário continuaremos no aguardo”, explica. A previsão era de que esta etapa fosse iniciada ainda no ano passado.
“Devemos buscar soluções plausíveis, aplicáveis na bacia hidrográfica. Para que o Plano saia do papel, existe um custo. A pergunta é: quem está disposto a pagar?”, presidente CBHPF
E o futuro
Para o futuro, a indicação é aumento de consumo na indústria e, também, o aumento da população urbana nos grandes centros - Passo Fundo e Erechim. Também existe uma indicação para o aumento no número de animais na pecuária. Assim, levando em consideração esses aumentos, os dados mostram uma indicação de falta de água em três das cinco unidades de gestão da Bacia Hidrográfica. O que os gráficos mostram é que a demanda hídrica é superior à disponibilidade de água. Hoje, a população de Passo Fundo é totalmente dependente da Bacia do Rio Passo Fundo. “E é válido lembrar que apenas 40% da população reside, de fato, na área de abrangência da Bacia Hidrográfica”, comenta.
O Plano de Bacia, com base no levantamento de números que indicam percentuais de aumento, estagnação ou decréscimo das condições da disponibilidade hídrica, agropecuária, indústria e população para a Bacia, vislumbra, até 2030, um aumento considerável na população de Passo Fundo. Em contrapartida, a vazão da água diminui, não só pela concentração populacional, mas porque os setores de agropecuária e indústria tendem a ter um crescimento elevado.
Os dados indicam a necessidade urgente de ações de gerenciamento do abastecimento de água e, ainda, de um esforço conjunto para a melhora da qualidade atual. Uma das ações previstas e indicadas no Plano de Bacia é o tratamento de efluentes, especialmente em Passo Fundo. O aumento populacional implica, além do aumento de efluentes, no aumento da atividade agropecuária, maior fonte poluidora da Bacia. Para o Comitê, ações de educação ambiental e ações de efeito são a principal ferramenta para melhorar a qualidade da água e o uso dela pela população.
Usos da água
De acordo com informações do CBHPF, em toda a sua extensão, o Rio Passo Fundo abriga e acolhe diferentes serviços que utilizam sua água para manter uma rotina. De acordo com o Plano de Bacia, o abastecimento humano é o setor que tem a maior demanda de água em toda a Bacia Hidrográfica do Rio Passo Fundo, chegando a quase 50%. Depois, a pecuária tem uma demanda de cerca de 24% enquanto a irrigação usufrui pouco mais de 18% da água e a indústria quase 9%. Além desses setores, duas usinas hidrelétricas responsáveis pela energia elétrica de 12% do Estado do Rio Grande do Sul estão localizadas no Rio Passo Fundo, além da unidade de Conservação Parque Municipal da Sagrisa, que fica no município de Pontão.
Poluição
Ainda segundo o CBHPF, na Bacia Hidrográfica, a qualidade dos recursos hídricos pode ser considerada, na maior parte da área, razoável. Alguns pontos, no entanto, necessitam de atenção, especialmente em trechos onde há concentrações urbanas e atividades agropecuárias. Segundo o Plano de Bacia, a principal fonte poluidora em toda a Bacia está relacionada à pecuária que gera, no ano, 97.529 toneladas de dejetos. Apesar das aves representarem o maior número de animais, os bovinos de corte e de leite são os maiores poluidores e a explicação é a grande concentração desses animais na região.